Por estes dias, assinalam-se duas datas de grande importância para a saúde alimentar dos portugueses. A 2 de maio, o setor alimentar e a Direção-Geral da Saúde assinaram um acordo histórico para a reformulação nutricional de 11 categorias de produtos. O acordo envolve a redução progressiva dos teores de açúcar, sal e gorduras trans em mais de 2000 produtos alimentares à venda em Portugal. Pela primeira vez este protocolo está integrado numa política alimentar nacional e interministerial conduzida pela Saúde (PNPAS/DGS). Este protocolo identifica os alimentos que representam efetivamente cada categoria do setor e a monitorização do cumprimento de cada meta será verificado por uma empresa externa e independente, tendo sido definidas metas claras e um período temporal para as atingir. Algo que poucos países europeus e a nível mundial têm com esta abrangência e modelo funcional. No geral, o teor de açúcar será reduzido em 10% para a grande maioria das categorias de alimentos consideradas. Para o teor de sal, foi possível manter as metas inicialmente propostas pela DGS para as categorias de alimentos que mais contribuem para a ingestão de sal na população portuguesa (pão e sopa) e foi ainda possível incluir neste acordo as refeições prontas a consumir que correspondem ao top 5 das vendas (lasanhas, massa à bolonhesa, bacalhau com natas, bacalhau à brás e pizas). Para as batatas fritas e outros snacks também foi também possível consensualizar uma percentagem de redução de sal de 12% até 2022. Significa isto que estes produtos à venda já podem ser consumidos sem limitações? Não. Infelizmente e enquanto o sal, o açúcar e a gordura mais perigosa continuarem na composição destes alimentos, o risco para a saúde persiste. Mas é importante que quando se vai às compras o perigo não espreite tão insistentemente sobre os nossos ombros. E que esta luta seja assumida não apenas pelos consumidores e pelo Ministério da Saúde, mas também por quem tem responsabilidades de apresentar e vender alimentos que não coloquem a nossa saúde em perigo. Por isso, estão todos de parabéns.
A segunda boa notícia tem a ver com a aprovação da Lei n.º 30/2019 de 23 de abril que estava no Parlamento desde 2016 e que introduz restrições à publicidade dirigida a menores de 16 anos de géneros alimentícios e bebidas que contenham elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e trans, procedendo à 14.ª alteração ao Código da Publicidade. Como escrevi anteriormente aqui na VISÃO: “A ciência tem vindo a demonstrar que o marketing promotor de alimentos de má qualidade nutricional destinado a crianças consegue criar sentimentos positivos em torno de alimentos pouco saudáveis, reduzir a capacidade dos pais dizerem não, aumentar o consumo de produtos ricos em sal e açúcar e contribuir para a obesidade infantil”. A publicidade destinada a influenciar os consumos dos menores a favor de alimentos hipercalóricos é, provavelmente e nos dias que correm, um dos grandes detonadores da obesidade infantil que depois se transforma na obesidade dos adultos. Estima-se que a Europa e seus sistemas de saúde gastem cerca de 59 mil milhões de euros por ano com todos os custos associados à obesidade que representa cerca de 8% do orçamento total de saúde na Europa. Um número impressionante para não falar do sofrimento a muitas centenas de milhares de portugueses e suas famílias. Como não atuar nesta área? Com esta legislação espera-se que as empresas que mais investem em publicidade, e que em muitos casos são multinacionais, coloquem no topo da sua agenda de responsabilidade social não comunicar ou até deixar de produzir estes produtos de menor qualidade nutricional. Uma vitória para a saúde de tantas crianças, em particular as mais pobres. E para a proteção dos seus direitos, nomeadamente o direito a não serem induzidas a consumir alimentos que podem colocar a sua saúde em risco.