Cada vez mais pessoas têm medo de ter uma relação de entrega e compromisso. Especialmente depois dos trinta e cinco, quarenta anos, muitos já desistiram, outros duvidam, poucos acreditam e vão de coração aberto!
Mas a vida, quando menos esperamos, faz-nos parar nas mais variadas encruzilhadas, testa as nossas convicções (ou serão defesas?) e parece gritar-nos: Agora tens de escolher!
Esta é a história de alguém que quase no fim desta “passagem”, nos ensina que entre o Amor e o Medo, a decisão de atravessar muitas estradas de mãos dadas, pode fazer-nos cair de quando em vez, mas traz-nos a certeza que nos vamos levantar e continuar a escolher o Amor!
Estava em Madrid e tinha terminado mais um dia de Congresso.
Um dos Congressos que mais gostava pois reunia especialistas em terapia de casal de todo o mundo.
Saí para a rua e, enquanto caminhava lentamente pelo passeio, percebi que alguém mesmo à minha frente estava parado no meio da rua. Ao passar, ouvi: “Por favor ajuda-me a atravessar a rua?”
Era uma senhora de cerca de oitenta e muitos anos quem me pedia ajuda. Tinha uma estatura baixinha, o cabelo todo branco, e um sorriso cativante. Contou-me que sentia muito medo, pois queria atravessar a rua para o outro lado, mas não conseguia andar suficientemente depressa para o conseguir fazer enquanto o semáforo estava vermelho para os carros.
Revelou-me que já tinha apanhado vários sustos e pediu-me para atravessar com ela.
Começamos então a caminhar lado a lado até ao local de passagem. Pediu para me dar o braço pois receava cair ao andar mais depressa. Dei-lhe o braço!
Enquanto aguardávamos que o sinal permitisse a passagem, olhou para mim e disse:
“Não é de Madrid, pois não? De onde vem?”.
Expliquei-lhe que era Portuguesa, mas que também tinha sangue espanhol.
Olhou para mim, com os olhos muito abertos, fez um prolongado silêncio e sorriu.
Entretanto, o sinal fechou e começamos a caminhar lentamente pela estrada.
Foi então que me perguntou: “Como se chama?” Eu respondi: “Margarida”.
Ela continuou: “Sabe, Margarida, há muitos anos atrás apaixonei-me por um homem português. Ele dizia que me amava muito e que eu era a sua princesa. Queria namorar comigo, viver comigo, casar comigo… queria tudo comigo. Era louco por mim…”
E fez de novo um silêncio.
Nesse momento, a minha curiosidade de autora e apaixonada por histórias de vida, explodiu e perguntei: “E …?”
E ela respondeu: “Nada!” E eu repeti: “Nada?!”
E ela continuou: “Era um bonito homem, alto, com um sorriso maravilhoso, meigo, atencioso, educado… e amava-me de verdade!”
A minha curiosidade estava ao rubro e não resisti a perguntar-lhe: “E o que aconteceu?” imaginando o dito galã a espera dela em casa. Mas, entretanto, chegámos ao outro lado da estrada, com algumas buzinadelas pelo meio… Ela retirou o seu braço do meu, olhou para mim longamente e disse:
“Muito Obrigada! Foi muito bom atravessar consigo. Não senti medo!”
Disse-lhe que tinha sido um prazer! Mas, o meu pensamento estava focado naquela história… na sua história e na história daquele Amor.
Não sei porquê fez-me lembrar um filme que vira anos atrás com o título “Cartas para Julieta”.
Repentinamente pensei: Não posso deixá-la partir! Eu preciso saber o que aconteceu! Porque é que ele não está aqui com ela? Talvez não pudesse, talvez estivesse com os amigos, em casa a dormir…ou partido!
Creio que ela sentiu o turbilhão de pensamentos que iam na minha mente, e viu passar cada um deles nos meus olhos, enquanto olhava para mim… ali especada, colada ao chão, sem arredar pé!
E foi talvez por isso, porque estas coisas se sentem, porque transpirava curiosidade, porque tinha uma alergia que não eram borbulhas mas pontos de interrogação, e porque o nosso coração fala com o coração do outro… que ela, pacientemente, voltou a sorrir e disse:
“Por medo perdi o homem que amava e que me amava! Agora tenho medo de atravessar a estrada e cada vez que a atravesso lembro-me dele… e que poderia ter atravessado muitas estradas com ele…Ainda hoje, talvez fosse possível fazê-lo de mãos dadas com ele… apoiando-nos um no outro! Se não tivesse tido medo!”
Fiquei sem palavras. Sem saber o que dizer ou fazer! Apeteceu-me abraçá-la! Que aprendizagem!
Por fim, ela disse: “Não tenha medo! A vida é e já não é!”
Despediu-se de mim, e muito devagarinho, com passinhos pequeninos, um atrás do outro, via-a desaparecer na escuridão da noite! Até hoje recordo-me das suas palavras sempre que sinto medo do que quer que seja!
O medo serve para nos defender e proteger, mas quando se trata de Amor, pode atrapalhar e muito… ao ponto de o fazer acreditar que é melhor estar sozinho.
E o medo, não nos ama, não é companheiro, não cuida, não partilha, não conversa, não dá colo, não sorri connosco… Aparece e desaparece, enquanto que um verdadeiro companheiro está lá quando mais precisamos e também quando não precisamos.
Porque um companheiro de verdade pode ajudar-nos também a combater os nossos medos e receios e a sentirmo-nos mais fortalecidos, mais resilientes, mais tranquilos, mais em paz. Porque o Amor é o melhor antídoto contra o medo!
Quando sentir medo de Amar, lembre-se: O medo não o vai deixar viver a emoção de atravessar as ruas de mãos dadas! E acredite, não há nada que se compare! Mande passear o medo, Ame e deixe-se Amar!
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