No contexto social atual, a realização no plano amoroso tornou-se um aspecto central na vida das pessoas. O amor tornou-se mais importante e difícil do que nunca. Um dos factores responsáveis é o processo de individualização em resultado da dissolução dos vínculos tradicionais. Este processo levou a novas exigências de uma vida própria e de auto-realização. É o primado do indivíduo sobre o casal, o primado do “eu” sobre o “nós”. Assistimos a um processo de individualização em que o curriculum de vida assume grande relevância. Ou seja, é preciso realizarmo-nos em várias esferas. Queremos a realização a nível profissional, claro, e antes de mais, mas também queremos realizar-nos a nível pessoal, social, cultural, familiar, amoroso e até sexual. E neste contexto atual que também é imediatista e consumista, o amor parece-me cada vez mais frágil.
Entre tantos canais de comunicação e redes sociais que permitem pontos de contacto e interações que de outra forma nunca poderiam existir, entre tanto flirt, encontros e desencontros, cheira-me às vezes a desamor. Dispara-se em várias direções, fazem-se vários espaços para várias pessoas ao mesmo tempo e veremos qual encaixa melhor, avança-se e recua-se, experimenta-se. Neste reino da liberdade onde as possibilidades são infinitas, cheira-me a desamor.
Se por um lado somos mais livres do que nunca para nos escolhermos uns aos outros e vivermos a relação como quisermos, no grau de compromisso que nos apetecer (idealmente, de modo consensual), por outro lado, o amor parece ser agora mais difícil do que nunca. Alguns sociólogos apontam várias razões para ser assim. O dito processo de individualização é uma delas. Essa experiência de individualismo orienta a nossa procura de parceiro, no sentido de encontrar alguém que encaixe em mim, que tenha os mesmos interesses, que goste do que eu gosto. E se não encaixa, não serve e troca-se. Nesta atmosfera consumista e imediatista, cheira-me a falta de intimidade, conversa íntima, revelar-me ao outro e descobrir-me nele e a ele, sem medo, e sentir-me aceite e validada.
O desamor é uma falta, um espaço vazio, pode ser quando o amor acaba ou quando não chega. Aqui não há nada de novo, o desamor sempre existiu. O que é novo é a forma de encarar as relações amorosas, que existem numa diversidade de formatos e graus de compromisso.
Que tipo de amor queremos nós?
Queremos o flirt, ou queremos o fast love, de consumo rápido uns atrás dos outros, ou queremos um amor para sempre, ou intermitente, queremos o quê? Não há nada de errado nos amores rápidos mas um um slow love abre outra dimensão. Um slow love é construído e investido, pela partilha, pela aceitação do outro como ele é, pelo trabalho que custa e pelo resultado que dá. Um amor comprometido dentro de cada um, um amor inteiro, que apetece e que fica, que se entranha e nos faz melhores pessoas. Um amor que junta intimidade e bom sexo (já agora!). Será pedir muito? Depende só daquilo que formos capazes de dar, é essa a conta e medida.