Um cão enorme, muito preto, atravessando a estrada. Essa é a última imagem de que Hipólito se recorda. Quando despertou, na cama de um hospital, em Lisboa, estava escuro. A noite pesava-lhe sobre o corpo. Doía-lhe a cabeça toda: atrás, à frente, por dentro e por fora. O cheiro forte a lixívia e a éter despertou-lhe memórias muito antigas, quando fora ferido em Nambuangongo e passara dois meses hospitalizado, em Luanda. Ouvia vozes abafadas, alguém gemendo, um aparelho apitando sobre a sua cabeça. Tentou levar a mão direita ao rosto, mas estava presa. Ergueu a esquerda e com os dedos trémulos tateou os olhos. Estavam cobertos por uma gaze. Escutou a voz de uma mulher:
– Acordou? Não se esforce…