Sabem aquelas conversas que se evitam só para não estragar o ambiente? Ou quando preferimos usar mentiras piedosas para fugir às verdades evidentes? É mais ou menos isso que o mundo anda a fazer desde que os talibãs recuperaram o poder no Afeganistão, em agosto do ano passado: a tentar sempre mudar de assunto, a procurar não ser confrontado com as atrocidades que se cometem diariamente no país, a evitar indignar-se com mais um degrau que é transposto na escada interminável da indignidade, a que já não pensávamos ser possível assistir neste século XXI (invasão russa da Ucrânia, incluída).
Por mais que nos custe admitir, a verdade é que, hoje, todos os temas são mais importantes no espaço mediático e mesmo na consciência de milhões de pessoas do que o Afeganistão. Por uma única e exclusiva razão: o Afeganistão representa uma das nossas maiores vergonhas coletivas, como Humanidade, das últimas décadas. E a prova de que a nossa vergonha é tão grande ficou ainda mais evidente, há poucos dias, quando ninguém se sobressaltou mais do que cinco minutos perante uma nova indignidade anunciada pelos senhores de Cabul: a ordem de que as mulheres afegãs não podem voltar a sair à rua com o rosto destapado, e de que voltaram a ficar obrigadas a aceitar a “recomendação” de que têm de passar a usar a “tradicional” burka, sempre que atravessarem a porta das suas casas, e fazerem-se acompanhar de um guardião masculino – que também será castigado caso ela não cumpra as novas diretivas emitidas pelo Ministério da Promoção da Virtude e da Prevenção do Vício (um título que, só por si, representa um tratado de humilhação à liberdade e aos direitos humanos).