No discurso de encerramento da Convenção do Bloco de Esquerda, Catarina Martins entreabriu a porta a um regresso ao regaço da Geringonça. Mas o piscar de olho não foi acompanhado de qualquer evolução do Bloco, relativamente às linhas vermelhas que ditaram a sua retirada da “maioria de esquerda” formada em 2015 e o chumbo do Orçamento para 2021. À frente de todas, a questão da legislação laboral. No resto, o Bloco promete, também, manter a pressão: influência nas políticas relativamente ao setor financeiro – leia-se, a suspensão ou denúncia do contrato que vincula o Estado a injeções de dinheiro público no Fundo de Resolução, com destino ao Novo Banco, e melhores serviços públicos – leia-se, (ainda) mais investimento no SNS e mais contratações para o setor público. Ou seja, enquanto o PS contar com os votos do PCP e do PAN para a viabilização de orçamentos, é muito pouco provável que, depois desta convenção, alguma coisa tenha mudado – e que as negociações para o próximo orçamento acomodem este caderno de encargos.
A convenção aparentou ser uma espécie de tiro ao PS – mas o que efetivamente esteve subjacente foi o elenco de autojustificações, por parte da direção do Bloco, para explicar o rompimento com a Geringonça. Todo o ónus da culpa foi endossado aos socialistas: Catarina Martins, Mariana Mortágua, Pedro Filipe Soares – todos recriminaram António Costa e a sua “viragem à direita”. Mas, no final, Catarina encostou o PSD à extrema-direita – um partido “fantasma que só vibra quando ouve gritar ‘morte ao socialismo’” – para concluir que o PS, em termos de parceria, não tem escolha: “É com o Bloco que se trava a extrema-direita” – Ou seja, não é com acordos e acordozinhos de Bloco Central… Não obstante a circunstancial pulsão oposicionista do BE, o pater familiae Francisco Louçã abençoa, definitivamente, a entrada no Arco do Governo, recusando a antiga (do seu tempo…) vocação de partido de protesto: ele próprio é conselheiro de Estado, o que significa que o regime integrou a possibilidade do projeto bloquista ou, pelo menos, o reconhece como institucional. Da sua boca saiu a previsão de uma futura “Mariana Mortágua ministra das Finanças”.
Ora, mais do que ninguém, Louçã percebeu que, depois do protagonismo com a comissão de inquérito do Novo Banco, Mariana é o ativo eleitoral mais forte do BE. E não é de admirar que se lhe peçam esforços políticos suplementares, na senda do que, até aqui, tinha sido pedido a Marisa Matias…