O estudo que revela que é mais difícil arrendar casa em Lisboa do que em Barcelona e Berlim é uma excelente notícia. Como sempre, o derrotismo nacional registou apenas, com indignação, que a taxa de esforço para pagar o arrendamento de uma casa em Lisboa é superior à de outras cidades europeias. Mas foi incapaz de fazer o que recomendam todos os livros de auto-ajuda e “encarar o problema como uma oportunidade”. A oportunidade é esta: em primeiro lugar, somos mais ricos do que pensávamos. Isso tem de valer alguma coisa. Quanto mais não seja, significa o fim do nosso complexo de inferioridade relativamente aos países ricos da Europa. Se nos cruzarmos com um alemão, ergamos a cabeça. Em princípio, a nossa casa é mais cara do que a dele. Mesmo que seja um T2 num prédio sem elevador – o mais provável é que seja mais cara. E é isso que determina o valor das coisas e o prestígio de quem as consome. Se o atum Bom Petisco for vendido mais caro do que o caviar beluga, garanto que vai passar a ser mais chique comer atum, e esquerda-caviar será a partir desse momento uma expressão que serve para designar um pelintra progressista, por oposição à esquerda-atum, a que passam a pertencer os esquerdistas burgueses.
Em segundo lugar, sigam este raciocínio cristalino: se é mais fácil arrendar casa em Barcelona, arrendemos casas em Barcelona – e continuemos a trabalhar em Lisboa. Este é o meu plano: vamos morar para Barcelona e todos os dias compramos um bilhete numa low cost de ida e volta para Lisboa. Chegamos de manhã à Portela, provavelmente gastando menos tempo e menos dinheiro em transportes, vamos para o trabalho, e à tarde voltamos para nossa casa, na Catalunha. Concretizamos o velho sonho de ir passar um fim-de-semana a Barcelona, até porque passamos todos os fins-de-semana lá. Temos uma casa no estrangeiro, o que confere um certo sainete. Fazemos as compras nos supermercados espanhóis, nos quais os produtos não têm o IVA a 23%. E, sobretudo, sentimo-nos em casa, até porque é bastante mais fácil encontrar portugueses no centro de Barcelona do que no centro de Lisboa.
(Opinião publicada na VISÃO 1406 de 13 de fevereiro)