A peça de arte chamada Comedian, que consiste numa banana colada à parede com fita adesiva, merece uma profunda reflexão. Infelizmente, eu não sou capaz de a fazer. O que a minha capacidade intelectual me permite levar a cabo é um pequeno historial das atitudes para com a arte das pessoas que não percebem nada de arte. Creio que as pessoas que não percebem nada de arte começaram por olhar para a arte com bastante admiração. “Que bonito, o artista olhou para um rosto e desenhou um rosto que é sem tirar nem pôr.” Estava tudo bem e ninguém se irritava. Mesmo os aborrecidos quadros de naturezas-mortas eram apreciados porque a fruta pintada parecia mesmo fruta verdadeira. Depois assistimos a uma fase em que as pessoas que não percebem nada de arte olhavam para a arte com desdém. “Isto também o meu filho que tem cinco anos faz na escola” era um comentário frequente. Objectos artísticos como a peça Comedian inauguram, a meu ver, uma nova era. “Se o meu filho que tem cinco anos fizer isto na escola leva uma lambada” será, parece-me, o próximo estribilho a soar em museus e galerias. As pessoas que não percebem nada de arte estarão simultaneamente certas e erradas. Se, na escola, os seus filhos de cinco anos colarem bananas na parede, em princípio, serão mais repreendidos pelo desperdício de comida do que louvados pela criatividade artística. Mas, se bem me lembro, quando uma criança pequena acaba de comer não é raro haver banana na parede. Juntamente com papa, talvez, que é provavelmente o factor que distingue a arte da falta de educação. Sucede que, depois de o artista Maurizio Cattelan ter afixado a banana à parede, o artista David Datuna dirigiu-se à obra e comeu a banana. Produzindo, também ele, arte. Se, na escola, um pequeno artista comer a obra de outro pequeno artista também será, quase de certeza, castigado. Depois de regressar do hospital.
Em entrevista à CNN, Datuna disse que não tinha comido uma banana, tinha comido um conceito – o que levanta mais questões complexas, quer do ponto de vista artístico, quer do ponto de vista digestivo. O artista que come o conceito apropria-se dele? Quanto tempo depois de comer um conceito se pode tomar banho? São problemas fascinantes.
Entretanto, este debate sobre arte deu-me fome. Vou comer uma banana. Daquelas antigas, sem conceito, para que não me caia mal.
(Opinião publicada na VISÃO 1397 de 12 de dezembro)