Um dia no Parlamento, o beato Guterres decidiu afivelar aquele ar de sacrifício que o acompanha sempre e disparou a parábola da ovelha perdida: “Há sempre mais alegria nos céus por um pecador que se redime do que por cem justos que continuam o caminho do bem.”
A mim, também me ocorre muito o Evangelho de São Lucas, mas é mais pela ironia de ver tanto cristão novo acordar para os limites do crescimento agora que os chineses deixaram de precisar de queimar o plástico que o Ocidente dizia que reciclava.
Vinte anos passados aí o temos nós, o homem que fugiu do pântano, com os pés na água, a chapinhar mundo fora com a menina Greta. Outra beata como ele. E que bom, não é? Sermos todos pelo ambiente. Agora já não temos só os “fundamentalistas” que acreditavam na evidência científica da asneira que por aí vinha. Agora nem precisamos de Ciência, já que somos todos pelo bem, digamos assim para simplificar.
Agora temos a Netflix para ver documentários, o Facebook para fazer a revolução e o Instagram para influenciar comportamentos… Enfim, consciência e voz, instrumentos da razão que nos ajudam a combater as cenas que fazem bué mal. Todo um coro de novos beatos.
Aqui, o Dr. Sousa Homem que há em mim ainda fica triste, mas nada surpreendido, a espreitar os ecopontos de praia. Esta gente recicla durante o ano todo, odeia o plástico e as embalagens mistas, mas com o sol na moleirinha nunca acerta na cor do contentor. Adiante. Presumo que, derivado do vosso entusiasmo, os partidos estão a ajudar.
O PAN – que nem é bem um partido, são só coisas boas – acaba de nos salvar justamente… das beatas. Não é? Os outros devem achar que sim, se aprovaram aquela maravilha. Deus os proteja que eu li o diplomazito que tanto jornalista, ativista e internauta louvaminhou.
E não devo ter lido a mesma coisa. Li uma ridícula exposição de motivos de um projeto-lei que, ao invés do termo genérico em linguagem escrita corrente “aves”, se refere a “pássaros”!
Mas tudo fosse isso. Li também legislação tonta e redundante. Em relação aos indivíduos, a lei replica o regime do abandono de resíduos já existente e com previsão de punição. Mas, como o duplica, cria distinções inúteis e prejudiciais na aplicação da lei. Em relação às pessoas coletivas, a redação é tão confusa que a aplicação será impossível e violadora, quer do princípio da culpa quer na enumeração dos estabelecimentos abrangidos, violadora do princípio da igualdade.
Os legisladores ignorantes são sempre os mais atrevidos. Como diria o Brel de outras beatas: Si j’etais Dieu en les voyant prier je crois que perdrais la foi…
Já o PS é um partido a sério. Voltando a Brel, de bénitier en bénitier, elles processionnent à petit pas e não brincam com o ambiente. O magnífico programa eleitoral explica que as centrais a carvão de Sines e do Pêgo, esses inimigos da transição energética que pioram tanto o nosso balanço ambiental, vão encerrar até 2030. Achava eu que uma já não tinha licença e que a outra estava em vigor até… 2021. Pelos vistos não. Mas quem e quando deu este brinde aos queimadores do carvão e o vendeu aos otários como medida pró ambiente? Não sabemos, nem a oposição se interessou nem estes partidos todos que têm o ambiente como prioridade perguntaram.
Não interessa nada, pois não? No verão é comer gelados. Muitos, de preferência com a testa, enquanto salvamos o mundo todo a eito. Pobre mundo.