É com um forte amargo de boca que a maioria de todos nós, naturais e residentes numa região fortemente emigratória, como o é a dos Açores, assiste a esta guerra sem cartel de Donald Trump à imigração envolvendo portugueses originários dos Açores, que são quase um milhão, mas também os do continente e de outras nacionalidades, que deixaram para trás os países de origem, famílias e haveres para desse outro lado do mundo ajudarem a erigir a portentosa América dos nossos dias. Presentemente, nos Estados Unidos da América, há estabelecimentos comerciais a encerrar a atividade por não disporem de mão-de-obra suficiente, tal é a perseguição dia-a-dia do governo Trump aos imigrantes ilegais, no caso, aos desprovidos do cartão “Social security card”, embora envolvidos, que muitos estão, em insistentes, morosos mas frequentemente frustrados processos de legalização. Todos hoje estão à mercê da intemperança e da insensibilidade deste presidente, que, do ponto de vista humanitário, posicionou-se de modo próprio muito abaixo dos presidentes antecessores, os quais, por seu turno, inteligentemente, sobrevalorizaram e se aproveitaram do imigrante considerando-o o braço forte da América.
“We are going to make America great again!”, prometeu. Como, questionamos, se foram os imigrantes a torná-la “great”, incluindo a mãe ilegal de Trump, a escocesa Mary Anne MacLeod que esteve 12 anos ilegal nos Estados Unidos da América, e a eslovena Melania, sua mulher, primeira-dama, e se só com a força do trabalho deles a América do Norte permanecerá grande. Falamos de um contrassenso à mistura com a teimosia que todos lhe conhecemos e uma impreparação deplorável para o exercício da política e da governação de quem, embora empresário de sucesso (também porque herdou bens significativos do seu pai, um construtor de garagens filho de um imigrante alemão) nunca foi e pelos vistos nunca será um governante e um político consensual e respeitado. Mas é este senhor, quer queiramos ou não, quem superintende aos interesses da Casa Branca e aos destinos do mundo.
Falava há dias com um amigo açoriano emigrado, também ilegal mas com o processo de legalização em curso, que certamente terá resposta negativa, que me dizia que entre os açorianos ilegais do Massachussets e de Rhode Island se vive hoje um ambiente de verdadeiro terror, havendo muitos que já nem de casa saem com medo de serem deportados por utilizarem cartas de condução portuguesas, válidas nos Estados Unidos da América apenas por um período de seis meses, que caducaram, e a State Police, a quem foi conferido poder para deportar, estar a mandar parar carros seguidos nas autoestradas numa obsessiva caça ao homem. Estar no sítio errado à hora errada poderá custar uma estada forçada no estabelecimento prisional de Darthmoth, seguida, 15 dias depois, de deportação para o país de origem. Acrescenta ainda este açoriano ilegalmente imigrado, pessoa bem informada, que esta perseguição aos ilegais atinge por simpatia entidades empregadoras, que atravessam grandes dificuldades. É que antes não eram incomodadas ao empregar trabalhadores sem “Social security card”, mas apenas detentores do cartão “Tax id”. Hoje, esse operariado, face a sucessivas fiscalizações às empresas onde laborava, amedrontado, deixou de se apresentar ao serviço. Dos anúncios de quase todos os dias, “Jobs for you”, quatrocentas vagas anunciadas recentemente em New Bedford não obtiveram resposta. O medo fala mais alto.
Uma das maiores cadeias de supermercados da Nova Inglaterra que lida com uma preocupante falta de mão-de-obra estará a pensar furar o esquema contra tudo e contra todos e voltar a admitir trabalhadores imigrantes ilegais exibindo apenas o cartão “tax id”, sob pena de pôr em risco a sua saúde económica.
Mais a sul, há empresas californianas de “ride share”, como a “Uber” e a “Lyft”, que empregavam mão-de-obra imigrante munida apenas do cartão “Tax id”, que, atemorizadas, deixaram de empregar. Resultado: esta fatia de trabalhadores imigrantes, que chegaram a fazer 170 horas semanais levando para casa chorudas remunerações, movimentando assim fortemente a economia local, deixou de laborar e, assustados, muitos regressam aos países de origem. Daí resulta que nessas zonas de forte imigração ilegal, que sempre existiu, a economia definha com o hoje braço fraco imigrante a ganhar menos e em dificuldades, consumindo o estritamente necessário e desenvolvendo pouco.
Adianta-me, a finalizar, este açoriano que presentemente as famílias imigrantes partilham divisões da mesma casa vivendo às vezes cinco e seis pessoas no mesmo quarto (situação desumana e confrangedora!) por a árvore familiar já não ter mais capacidade para arrendar senão uma moradia.
“We are going to make America great again!” … “You are wrong, Mr. Trump!”