Dirijo uma escola artística há mais de 35 anos e acontece que essa escola também está integrada no sistema nacional de Escolas Profissionais (com cursos de nível 4 – equivalentes ao Ensino Secundário). Finalmente começo a sentir-me legitimada… Eu sabia que este modelo havia de emergir e de se expandir.
Estou então há 35 anos a remar contra as marés – porque, sendo a EPAOE (Chapitô) por excelência uma escola inclusiva, quase diria hiper-inclusiva, desde o início praticamos a autonomia, a flexibilidade, a transdisciplinaridade e as aplicações e cruzamentos com a realidade. Os nossos ambientes de aprendizagem sempre foram e continuam a ser laboratoriais, criativos e produtivos. Temos muitas vezes 2, 3 e mais professores no mesmo espaço de ação e usamos toda a espécie de reciclagem de espaços, dentro e fora. Em algumas ocasiões quase nos temos sentido clandestinos. Afinal parece que estamos no “padrão jesuíta”.
Sabemos bem o que é a tensão entre as obrigatoriedades dos programas e as exigências e coerências das aprendizagens ativas, progressivas e comprometidas. O facto de sermos uma Escola de Artes e de ter sido a escola pioneira nas artes e animação circense explica esse imperativo da transdisciplinaridade e dos projetos aplicados ao mundo envolvente. E a nossa persistência, também pioneira, nos ofícios cénicos continua a obrigar-nos a explorarmos todas as charneiras entre artes e ofícios, portanto continuaremos destinados a procurar e a experimentar os fios condutores das nossas transdisciplinaridades.
Esta dimensão foi a parte do vosso artigo que mais me interessou. Identifiquei-me. Senti a legitimação de uma contra-corrente com décadas. Foi uma das vanguardas. Verifico que sou um “study case” e estou à disposição. Mas o vosso artigo tem outra dimensão transversal, que é a da aprendizagem digital. Aí tenho mais dificuldades em pronunciar-me. Admito que a minha/nossa escola não seja um exemplo de vanguarda de ensino/aprendizagem digitalizados. Diria que temos o essencial básico, ou seja, temos as nossas TIC’s no plano curricular e nos múltiplos cruzamentos das transdisciplinaridades que praticamos. E evidentemente que tentamos aprender a manobrar o manancial de pesquisas que temos à nossa disposição na internet. Mas esse imperativo do digital nas aprendizagens contemporâneas, que também transparece no vosso artigo, interrogou-me. Será que há escolas para serem mais “digitais” e outras escolas para serem mais “corporais”? Escolas em que o digital é o dispositivo propiciador e outras escolas centradas no “corpo a corpo”, na relação direta e intensa, na ação comunicacional interpessoal e intergrupal. A presença totalitária do “big brother digital” não pode perturbar as aprendizagens dos sentidos e das intuições e dos talentos? Parece-me que ainda temos muito que experimentar e debater acerca dessa combinatória entre transdisciplinaridade e “digitalidade” – para continuarmos à procura de como se faz uma escola melhor.