O ataque feroz da agência americana Moody’s ao euro, por via de Portugal, constituiu, realmente, um murro no estômago. Sobretudo sentiram-no os partidários do neoliberalismo, dado pensarem que o importante é emagrecer os Estados, até à exaustão. Uma vez que o que conta, para eles, são os mercados especulativos, sem regras nem ética, por criarem rapidamente lucros fáceis e mais riqueza, concentrando-a, sem qualquer sentido de justiça social, nas mãos de cada vez menos pessoas. As desigualdades sociais, a precariedade do trabalho e a miséria são as marcas da ideologia dominante.
No entanto, o ataque da Moody’s era previsível para quem estivesse atento à evolução política dos tempos difíceis que estamos a viver. Note-se que hoje assistimos a uma “guerra” das moedas, para destruir o euro, que faz sombra ao dólar, o que os neoliberais republicanos e mesmo alguns democratas não suportam. Ora o desaparecimento do euro conduz, necessariamente, ao fim do projeto europeu e, concomitantemente, ao regresso dos nacionalismos egoístas – que afloram já em alguns Estados europeus – pondo em risco a solidariedade e porventura a paz. A análise do século passado – com a tragédia de duas grandes guerras mundiais – pode-nos trazer algumas luzes, sobre o risco que representará a destruição ou mesmo a simples decadência da União Europeia (UE)…
A China, que tem a sua própria agência de rating – como a UE devia ter mas não tem -, e o Governo dos Estados Unidos, que se fosse avaliado pela Mood’ys, com o mesmo critério, talvez estivesse pior do que Portugal, alertaram, há poucos dias, para a necessidade imperiosa de salvar o euro, sob pena de uma catástrofe mundial. Será suficiente para que a Europa acorde?
Em Portugal, o ataque criminoso – é a palavra – que nos foi feito pela Moody’s, foi muito sentido pela maioria dos portugueses, independentemente das suas posições políticas e ideológicas. É verdade que atingiu não só o Estado central, como as autarquias, as regiões autónomas e mesmo, diretamente, grandes empresas privadas e até os bancos.
Foi, aliás, confrangedor ver e ouvir, em televisões e rádios, alguns dos economistas e comentadores habituais a expressar a sua indignação. Ainda bem que o fizeram e, finalmente, talvez tenham compreendido. Mas lembremo-nos que há poucas semanas diziam que a responsabilidade da crise era, essencialmente, do Governo de Sócrates e não da incapacidade política dos dirigentes europeus…
Isso, contudo, pertence ao passado. Estamos agora perante outro dilema grave: a austeridade imposta pela “troika” não vai chegar, porque vai, necessariamente, fabricar cada vez mais desemprego, desigualdades e miséria. O Governo já pressentiu, julgo, a recessão inicial. Para quê, então, apertar mais o cinto aos portugueses? Cumpramos o que a “troika” nos impôs e não mais do que isso. A saída só pode vir, como sabemos, da UE. Se os seus dirigentes, tiveram a coragem de mudar de paradigma – como se impõe – e forem capazes de “salvar o euro-, investindo, criando mais emprego e mais desenvolvimento nos Estados-membros, a par da austeridade financeira estritamente necessária.
É, aparentemente, fácil que a UE o possa conseguir. Acabem com os “paraísos fiscais” e a chamada economia virtual; controlem os mercados especulativos; punam a corrupção; aceitem criar os Eurobonds; e, já agora, terminem com as agências de rating privadas. O que nos levou à crise de 2008 – de que ainda não saímos – foi o negocismo sem freio. Os responsáveis, com raríssimas exceções, não foram punidos. Pior: alguns são talvez os mesmos que arrastam agora a UE para o caos.
Se queremos subsistir, temos que mudar de paradigma, como propôs o Presidente Obama em relação aos Estados Unidos. Mas é necessário que os verdadeiros europeístas, de todos os Estados-membros, se unam nesse combate cívico e político essencial, pressionando os eurocratas de Bruxelas. Senão, não!