Há poucas semanas, cheguei a Portugal para férias da Páscoa com a minha família no auge da greve dos motoristas de matérias perigosas. Pelas estradas que passávamos repetia-se o cenário de filas intermináveis de automóveis parados em cada bomba de gasolina. Nas notícias não se falava de outra coisa – minto, havia outra coisa de que se falava, e era o acidente com um autocarro de turistas na Madeira, e antes de continuar com a história da gasolina, deixem-me aqui falar sobre isto que também é importante. Eu por norma não vejo televisão, não temos uma sequer, mas estando de férias a almoçar num restaurante em Portugal a televisão é difícil de ignorar. Pois, como é possível que durante mais de uma hora e meia em que estivemos sentados no restaurante, com os miúdos, a televisão só mostrava continuamente as mesmas imagens do autocarro a rolar pela ribanceira? Só interrompidas pelas imagens a mostrar algumas pessoas a vaguear pelas ruas à espera da chegada iminente do PR… No restaurante não dava para ouvir, mas eu pergunto-me o que há para dizer sobre um acidente, por mais grave que seja, que dá para estar a falar mais de uma hora? Será que os espectadores têm de facto algum prazer mórbido em ver essas imagens ad nauseum? Há algo fundamentamente errado quando a televisão se reduz a um espectáculo em torno da morte… ou estou eu errado e há aqui algo que não percebi?
Onde ia?
Ah, a gasolina!
Então, se bem percebi o que realmente aconteceu: anuncia-se o início de uma greve, passa-se um dia em que ninguém sabe muito bem o que isso significa, depois faz-se um alarido nos media e correm todos que nem doidos para as bombas, que ficam logo vazias. Termina combustível nos aeroportos pondo em risco todo o tráfego aéreo de passageiros e mercadorias. Os veículos de socorro entram em risco de não poderem estar operacionais. Aumenta o risco dos bens de primeira necessidade não estarem disponíveis nas lojas. A economia pára e evaporam-se milhões porque as pessoas estão nas bombas de gasolina em vez de estarem a trabalhar. Em geral quase se instala o caos, e isto tudo em cerca de 3 a 4 dias…
Talvez seja defeito profissional, mas é apenas impressão minha ou este sistema é pouco ou nada resiliente? Faz-se um teste de stress ao sistema e ele falha… que conclusões há a tirar?
E se em vez de serem os motoristas a fazer greve, são os países exportadores de petróleo que reduzem capacidade de fornecimento?
Temos uma economia que depende em grande parte do elo mais fraco, que é o petróleo.
Não é só a fragilidade do sistema que está em causa, é o futuro dos nossos filhos que está em jogo pelo dano causado por este sistema altamente poluidor. É a desertificação a avançar, serão os incêndios florestais a aumentar, as tempestades e inundações a serem mais severas e destrutivas, a biodiversidade a desaparecer e a ameaçar a produção alimentar e a ameaçar a propagação de doenças, o degelo dos glaciares e calotes polares que leva ao aumento do nível do mar que leva à erosão da nossa costa, e que leva também à alteração das correntes que temperam o nosso clima e trazem cardumes, serão as migrações em massa a chegar às nossas costas também, serão guerras e tensões em torno de recursos escassos… é o colapso total dos ecosistemas que nos suportam e é a nossa existência como sociedade próspera e pacífica que está em causa.
Quão difícil é perceber que é urgente assumir a missão estratégica de reduzir a dependência do petróleo (e carvão) e ao mesmo tempo apontar a atingir as metas de emissões de CO2 a que o país se comprometeu? É urgente estabelecer e implementar um plano para melhorar e electrificar as redes de transporte público e apoiar a transição para veículos de transporte privado electrificados com uma infrastructura de recarregamento que cubra uma grande parte do território (recordo que cobriu-se o país inteiro de antenas de telemóveis com 3 redes diferentes num par de anos). É urgente apoiar a investigação e desenvolvimento de soluções de produção energética renováveis e de distribuição mais eficientes e apoiar as pessoas privadas a se tornarem independentes da rede onde faz sentido. Um país com tanto sol, vento e mar, não precisa de ser dependente do petróleo. Um país que quer uma economia dinâmica e empreendedora, com empregos qualificados, e não vê essa missão como uma oportunidade só pode ser doido.
É tão ridículo ver tantos adultos importantes dizerem às crianças – como a Greta Thunberg que fazem greve pelo futuro do ambiente – que se envergonham pelo estado das coisas e depois não fazerem absolutamente nada. Bora lá juntar os tostões todos no próximo orçamento e planear o nosso futuro! Senhores Ministros e Senhores Deputados, nós também podemos estabelecer um Green New Deal (O John Oliver explica o que é isso aqui)! JÁ! MESMO!