É uma mulher num mundo de homens. A guitarrista Marta Pereira da Costa lança o seu primeiro álbum a solo. E não se fica só pelo fado. Aborda o instrumento como um meio para chegar a diferentes universos musicais, com várias colaborações surpreendentes.Viaja pela música popular, pelo jazz, por músicas de etnias distantes e, claro, pelo fado. Interpreta Fado Laranjeira, um fado tradicional, com a voz de Camané. O fadista é a primeira referência de Marta e foi através da sua voz que pela primeira vez se emocionou a ouvir fado. Menos esperada é a participação de Rui Veloso, que compõe e canta Casa Encantada, uma das músicas do álbum. A ligação vem de longe. Marta confessa que as primeiras canções que aprendeu à guitarra e ao piano eram da autoria do músico do Porto. Já a participação de Dulce Pontes foi uma surpresa para a guitarrista, que é fã da cantora desde pequena. O convite foi feito e a música É ele que me canta a mim reforça a marca portuguesa do disco.
Por outro lado, as participações de Richard Bona e Tara Tiba revelam o lado mais ousado: a mistura da guitarra portuguesa com o jazz e as músicas do mundo. A participação de Tara Tiba cria uma ligação especial entre duas mulheres que quebram tradições. A cantora iraniana foi obrigada a sair do seu país para poder fazer o que gosta, pois no Irão as mulheres não podem cantar a solo.
Marta Pereira da Costa rompe também a tradição, em Portugal – é a única mulher guitarrista a acompanhar fado – mas nunca se sentiu mal recebida neste mundo de homens. E não é a primeira vez que desafia convenções sociais: jogou futebol na adolescência, e antes de ser guitarrista, foi engenheira civil.
Foi apenas aos 18 anos que a guitarra portuguesa lhe foi apresentada pelo pai, a quem agradece todos os dias pela insistência, já que na altura nem ouvia fado. Apaixonou-se pelo seu som, e a partir dai o instrumento tornou-se uma obsessão. O seu primeiro professor foi o Carlos Gonçalves, que acompanhara Amália Rodrigues nos últimos anos de carreira. Passou a frequentar casas de fado, com a sua guitarra e a seguir os passos do guitarrista residente. Achavam piada à sua desenvoltura e por isso teve vários “mestres”, entre eles Mário Pacheco, que lhe chamava “copy-paste”. Isto porque Marta tinha, já na altura, o ouvido treinado devido à sua formação musical, e conseguia ouvir e logo depois, sem partituras, imitar na perfeição.
Abandonou a investigação em engenharia, onde não era completamente feliz, para criar os acompanhamentos do álbum Fados de Amor (2011), de Rodrigo Costa Félix, então seu marido. Pela mesma altura nasceu a vontade de ter um álbum a solo, em nome próprio. Em 2015 começaram os ensaios. E agora, no dia 13 de maio, chega finalmente às lojas. Uma visão contemporânea da guitarra portuguesa, que vai desafiar os apreciadores do instrumento.