“Prima Dona”, a ópera de Rufus Wainwright, passou pelo grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, numa versão híbrida, entre o filme/instalação de Francesco Vezzoli, com Cindy Sherman, e a Orquestra Gulbenkian, sob a direção da maestrina Joana Carneiro.
Em disco e no palco, a ópera do criador de “Cigarettes and chocolate milk” conta um dia na vida de uma antiga “diva” do canto lírico – Régine Saint-Laurent, personagem que o autor diz ser inspirada em Maria Callas –, que prepara o regresso aos palcos, no 14 de julho de 1970, em Paris, na vã expectativa de retomar a glória, quando tudo é esquecimento e se combina para o insucesso.
Rufus Wainwright compôs a música e escreveu o libreto, em francês, com Bernadette Colomine. O projeto teve origem num desafio lançado pela Metropolitan Opera de Nova Iorque, há quase uma década, e a estreia ocorreu em Manchester, no Reino Unido, em 2009, depois de a instituição norte-americana afastar “Prima Donna” do seu repertório.
Desde a estreia, “Prima Donna” surgiu em palco em Londres, Toronto e Nova Iorque (mas em Brooklyn, com a New York City Opera), depois de revista a encenação inicial. Este ano, ganhou o filme/instalação de Vezzoli (que a Gulbenkian também patrocinou).
Através dos materiais que acompanham a edição em disco, percebe-se que não é apenas nas fotografias que o músico apela à “indumentária” de Verdi e de Puccini. Também o faz no drama. “Prima Dona” ora sugere o compositor de “Aida”, ora o de “Turandot”, ora os palcos franceses da viragem do século XIX para o seguinte, em particular uma certa “cor” de Massenet, sem outra preocupação.
O que “Prima dona” deixa claro, é mesmo a raiz do gosto de Wainwright, o conjunto das suas preferências, seja para compor uma ópera, seja as suas canções, mesmo que mais simples e imediatas, com mais ou menos cigarros e leite com chocolate.
O programa que promete para Lisboa, aliás, é mesmo esse: “Prima Donna”, recriações orquestrais de algumas das suas canções, clássicos da Broadway e escolhas do reportório operático. Ouvindo “Prima donna”, percebe-se que a mistura é possível, neste “mundo sempre pop”.
A gravação em disco, realizada no início deste ano, conta com as sopranos Janis Kelly (que já fora Régine, na estreia, em 2009) e Kathryn Guthrie (Marie, a criada, na apresentação em Nova Iorque, em 2012), o tenor Antonio Figueiroa (André, o jornalista), o barítono Richard Morrison, a Sinfónica da BBC e o maestro Jayce Ogren.