O primeiro encontro de Martha Argerich e Claudio Abbado, em disco, aconteceu em 1967, com a gravação do Concerto em Sol maior, para piano e orquestra, de Ravel, e o 3.º, de Sergei Prokofiev. Era um encontro de jovens “gigantes”, a que se juntava a Filarmónica de Berlim, um encontro tão determinante, que o seu testemunho – o álbum – jamais abandonaria a primeira linha do catálogo da editora.
Nos quase 50 anos seguintes, pianista e regente gravaram mais quatro discos, igualmente determinantes: os primeiros concertos para piano e orquestra, de Chopin e Liszt, em Mi menor, op. 11, e Mi bemol maior, respetivamente, em 1968, com a Sinfónica de Londres; em 1994, o 1.º de Tchaikovsky, com a Filarmónica de Berlim; em 2004, dois concertos de Beethoven – n.º 2 em Dó menor e n.º 3, em Si bemol maior -, com a Orquestra de Câmara Mahler; e, por fim, em 2013, no Festival de Lucerna, naquele que seria o último encontro dos dois músicos em palco e uma das derradeiras apresentações públicas do regente, dois concertos de Mozart, raramente interpretados em público por Argerich: o Concerto n.º 20, em Ré menor, um dos mais notáveis do compositor, e o n.º 25, em Dó maior, concluído imediatamente antes da Sinfonia n.º 38, “Praga”.
Estes testemunhos de cinco décadas de cumplicidade são agora editados numa só caixa, em cinco CD que retomam as capas originais, cruzando rostos dos intérpretes, tempo e memórias. Formam um percurso notável pela grande música de tradição europeia e constituem uma bela homenagem a Abbado, um ano após a sua morte (a 20 de janeiro de 2014). São cinco discos de uma grandeza rara.
Prokofiev surge com toda a ferocidade, sob os chamados “dedos de aço” de Argerich, e Ravel com o seu “swing” e todos os contrastes, da luminosidade dos allegros, à delicadeza e profundidade do Adágio. O concerto do compositor francês foi retomado pelos dois músicos, na década de 1980, numa abordagem que o segundo disco da série recupera, no fecho de uma fascinante sequência Chopin/Liszt, gravada no final da década de 1960. O concerto de Tchaikovsky é uma demonstração de virtuosismo. Os dois últimos discos, com Beethoven e Mozart, retêm concertos ao vivo, gravados no calor do momento, na verdade desse instante.
O padrão é sempre de excelência, pela presença forte, segura e eletrizante da pianista e pelo saber generoso do maestro. E também é sempre mais, pelo testemunho do encontro dos dois grandes músicos.