JL/Educação: O que o motivou a escrever uma biografia de Veiga Simão?
Pedro Vieira: Na sequência da biografia do general Vasco Rocha Vieira (Todos os Portos a que Cheguei), que fiz, a convite do jornalista Dinis de Abreu, o Guilherme Valente, da Gradiva, contactou-me para escrever a de Veiga Simão. Tive muitas conversas com ele e foi um livro que exigiu também uma investigação profunda porque, ao contrário do outro, trata uma época de que tinha poucas referências. Nomeadamente, em relação à Universidade de Lourenço Marques e aos Estudos Gerais Universitários de Moçambique (EGUM), uma das partes essenciais deste primeiro volume.
Que ‘retrato’ faz do ex-ministro da Educação?
Veiga Simão nasce numa família com poucos meios mas que quer que os filhos estudem e tenham outras perspetivas de vida. O pai era cabo da GNR e a mãe era analfabeta – é impressionante que o responsável por aquela que foi provavelmente a maior reforma educativa em Portugal seja filho de uma mulher que apenas sabia escrever o nome. Foi sempre bom aluno, amigo do seu amigo. Focado na ideia de libertar os pais de encargos, vai primeiro para Preparatórias Militares, embora não gostasse da carreira militar. Muda para Engenharia e finalmente para o curso de Ciências Físico-Químicas, em que se licencia, na Faculdade de Ciências de Coimbra. É professor assistente durante dois anos, seguindo depois para Cambridge, onde se doutora em Física Nuclear. Esta estadia é fundamental porque se Veiga Simão já tinha um espírito aberto – o pai era republicano e ele bebeu muito dessas ideias -, essa experiência alarga ainda mais os seus horizontes.
Em que sentido?
Dá-lhe mais mundo. Torna-o observador direto de uma Inglaterra que sai da Guerra e promove o ensino, a investigação, a formação profissional, um serviço nacional de saúde. Toma contacto também com a grande política mundial. Mais tarde, quando volta, faz um segundo doutoramento na Univ. de Coimbra e, aos 32, é professor catedrático. É nessa altura que é convidado para criar os EGUM.
O que o conduz à fundação da Univ. de Lourenço Marques, que o próprio considerou a ‘obra da sua vida’…
Precisamente. No início, queria ir por pouco tempo, apenas dois anos, porque tinha um convite para o MIT, nos Estados Unidos. Acaba por ficar sete, pois vê naquela oportunidade um grande desafio: os EGUM estavam a meio caminho entre o liceu e a universidade, e Veiga Simão quer transformar esse ‘super-liceu’ numa universidade de corpo inteiro, que concede graus académicos, etc. Aquilo que classificava muitas vezes de Universidade-piloto. Sempre com a ideia que essa era uma questão-chave não só para Moçambique, mas para todo o país (que nessa altura incluía as colónias). De tal modo que podemos dizer que toda a sua vida foi uma preparação para ser ministro da Educação: a consciência muito aguda da importância da educação para o desenvolvimento, crescimento e para a afirmação de Portugal é algo que o domina desde muito cedo. Não um discurso político que surge à pressa quando aceitou ser ministro.