Dois anos depois da última edição, a Mostra Espanha regressa a Portugal com pintura, música, debate, exposições, teatro, dança e cinema. Até janeiro, são mais de 100 iniciativas em 13 cidades portuguesas, que querem mostrar como “Espanha e Portugal formam uma Ibéria com gente dentro, gente que entre si fala, comunica e se entende.” A mostra bianual arrancou com uma exposição de obras de El Greco, patente até 10 de janeiro no Museu Nacional de Arte Antiga. “Apesar de ter nascido na Grécia, é um pintor fundamental para entender a pintura espanhola do século de ouro” explica ao JL, Javier Rioyo, diretor do Instituto Cervantes de Lisboa. O Cinefiesta – Mostra de Cinema Espanhol arranca amanhã, 1, na capital. “Também vamos ter flamenco em Lisboa e em Évora, e jazz no Porto.” A programação é vasta e quer quebrar barreiras. “Já que estamos perto fisicamente, que estejamos também espiritual e vitalmente.”
JL: Quais as novidades da Mostra Espanha 2015?
Javier Royo: Temos uma homenagem a Ángel Crespo, um dos homens fundamentais da cultura portuguesa/espanhola e o primeiro tradutor do Livro do Desassossego. É um nome muito importante para nós, porque foi o primeiro que ensinou poesia contemporânea portuguesa. Também estamos no Fólio – Festival Literário Internacional de Óbidos, o primeiro festival que se faz para escritores de outros países, que vai contar com Javier Cercas, Almudena Grandes, e encerra com Nuno Júdice e Luis García Montero. E faremos uma homenagem a Ramon Gómez de la Serna, muito amigo de Almada Negreiros. Era um vanguardista espanhol que viveu no Estoril, onde escreveu algumas obras, e é um dos nomes fundamentais da vanguarda espanhola.
Qual é a importância da literatura luso-espanhola na aproximação cultural dos dois países?
Foi fundamental em épocas distintas. Almada Negreiros e o grupo do Orfeu, com escritores espanhóis como Ramón Gómez de la Serna, tinham o espírito de renovação e de mudança, de vanguarda. Depois, a descoberta de Pessoa por Ángel Crespo, que também traduziu Eugénio de Andrade. A literatura foi sempre um vínculo entre as culturas ibéricas. Estamos muito próximos mas às vezes não somos bem conhecidos. E estes nomes foram fundamentais em épocas distintas, Gómez de la Serna nos anos 20/30 e Ángel Crespo nos anos 60/70/80.
Como caracteriza as relações culturais entre Portugal e Espanha?
Acredito que estão melhores, mas não acredito que esteja tudo terminado. Ainda temos muito por trabalhar. Uma das razões do Instituto Cervantes estar em Lisboa é mesclar as duas culturas. Tem uma intenção ‘ibérica’. Somos muito próximos, mas às vezes conhecemos mais outras culturas do que as da Península Ibérica. Isso já o sentia Miguel Torga há muito tempo, e há pouco Lobo Antunes também dizia o mesmo, que se sentia profundamente português mas também muito ibérico. E é isso que queremos, que Espanha sinta, como Portugal, a sua cultura peninsular.
Que importância assume o entendimento das duas línguas no futuro dos dois países?
Camões também escrevia em castelhano – são uns sonetos maravilhosos -, e lia também em espanhol, e Cervantes lia Camões, naturalmente, em português. Hoje, a Galiza e Portugal têm um idioma em comum, o galaico-português. E creio que agora, na Extremadura, cada vez mais gente estuda português. Acho que este esforço tem de ser mais impulsionado. Às vezes tentamo-nos entender numa terceira língua, e acho que isso é injusto.