Neste ano comemoram-se os 65 anos da fundação oficial da Força Aérea Portuguesa (FAP), que ocorreu em 1 de julho de 1952. A tragédia dos incêndios florestais deste Verão, marcada pela perda de 65 vidas, fez muitas pessoas interrogarem-se sobre as razões que terão levado a FAP a deixar de contribuir para o combate a este tipo de ameaças à vida e segurança das populações e do território. A pergunta não deve ser dirigida à instituição militar, mas aos governantes que no final da década de 1990 deram ordem à FAP para descontinuar o combate aos incêndios florestais, que era efetuado essencialmente através dos aviões C-130, equipados com kits contendo dez mil litros de líquidos retardantes. Portugal privatizou o combate aos incêndios, criando um cancro económico e moral (neste momento estão a ser julgados em Espanha empresas que alugam meios aéreos a Portugal a preços que triplicam o valor de mercado).
As maiores hecatombes incendiárias ocorreram em 2003 e 2005, sendo 2017 o terceiro pior ano. Não é preciso ser muito arguto para perceber que um país que deixa arder 220 mil hectares de matos e florestas em quatro meses, batendo todos os recordes europeus de área ardida, é um país que desaprendeu o exercício de soberania sobre o seu próprio solo. Pior ainda, um país que acha normal pedir sistematicamente ajuda à Unidade Militar de Emergências de Espanha – uma força militar de elite de cinco mil homens totalmente dedicada a combater catástrofes naturais e tecnológicas – para conter os seus piores incêndios, é um país que perdeu a vergonha.
Quanto possível Indiferente aos dislates políticos, e de um modo contínuo e discreto, a FAP desempenha também, independentemente do contexto geopolítico internacional, um inestimável serviço de apoio à sociedade civil, o mesmo é dizer à população portuguesa em geral e, potencialmente, a cada cidadão em particular. No ano passado, fazendo um balanço de 38 anos de atividade, a Esquadra 701 (“Pumas”), equipada com os helicópteros EH-101 Merlin, contabilizava em 3 455 vidas salvas, o resultado de 56 900 horas de voo operacional de busca e salvamento. Num espírito de flexibilidade e multiusos no desenho e desempenho de missões, a FAP tem outras Esquadras (como a 501, “Bisontes”; 502, “Elefantes”, 552, “Zangões” e 601, “Lobos”) que para além de tarefas de âmbito mais estritamente militar realizam importantes missões de apoio humanitário, tanto no país como no exterior, onde se inclui o transporte de doentes e feridos, ou o rápido e seguro transporte de órgãos para transplantes.
Esse trabalho é ou foi levado a cabo tanto no clássico triângulo estratégico do Continente/ Açores/ Madeira (onde se inclui a vigilância ambiental da nossa vasta Zona Económica Exclusiva), como em missões em Estados da CPLP, como São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau ou Timor-Leste, em missões nacionais, europeias (como as que se prendem com a salvaguarda da vida de refugiados em situação de perigo de vida iminente), e ao serviço das Nações Unidas (como ocorreu com o trabalho da Esquadra 552 em Timor-Leste, entre fevereiro de 2000 e julho de 2002).
Estou seguro de que muitos leitores estão surpreendidos pela informação acima transmitida. Portugal está mergulhado numa cegueira profunda em relação à realidade e ao potencial das suas instituições. Quem manda, por alguma razão que ainda não consegui apreender, prefere sempre o outsourcing, ou as “soluções de mercado”.JL
Ecologia: Força aérea, sociedade civil e ambiente
JORNAL DE LETRAS Viriato Soromenho Marques comenta os 65 anos da fundação oficial da Força Aérea Portuguesa (FAP)
Mais na Visão
Parceria TIN/Público
A Trust in News e o Público estabeleceram uma parceria para partilha de conteúdos informativos nos respetivos sites