Feito inédito do cinema português. Pela primeira vez, estrear-se-á em sala um conjunto de curtas-metragens portuguesas de animação, fruto da consistência e do esforço da Praça Filmes, produtora de José Miguel Ribeiro, que faz de Montemor-o-Novo, em pleno Alentejo, um dos mais importantes núcleos da animação portuguesa (juntamente com a Lousada, onde fica A Casa de Vilar, de Abi Feijó, e o Porto, onde está a Casa da Animação). Estreia-se a média Papel de Natal e a curta Dodu – Balão Lua, ambas de José Miguel Ribeiro; e também O Gigante, de Júlio Vanzeler. O facto de nunca antes se ter estreado uma sessão só com animação portuguesa não se deve necessariamente a um preconceito com o género, mas antes a uma dificuldade com o formato de curta-metragem. Existe apenas uma longa-metragem de animação em Portugal, e de qualidade aquém do mínimo expetável. De resto, a animação portuguesa conquistou alguns dos mais prestigiosos prémios internacionais, com realizadores de qualidade mundialmente reconhecida, como Abi Feijó, Pedro Serrazina, Regina Pessoa, Zepe ou, mais recentemente, a dupla Vasco Sá / David Doutel.
José Miguel Ribeiro é sem dúvida um dos nomes maiores, tratando-se do único realizador português a alcançar um Carton d’Or, com A Suspeita, o mais importante prémio de animação europeu. Aqui José Miguel Ribeiro regressa à animação de volumes, mas em estilo manifestamente diferente, dedicando-se a um público infantil. A curta Dodu – Balão-Lua serve de aperitivo para Papel de Natal, em que, pela primeira vez, mistura (sem ser nos mesmos planos), animação com imagem real. É uma parábola com claríssima mensagem ecológica que pode servir pais e filhos, mas na sua essência é dedicada aos segundos. Tudo é contado com uma certa ingenuidade e simplicidade, sem grandes camadas de leitura, com o propósito de servir os mais pequenos – isto quer na imagem real, quer na animação, não havendo grandes rasgos ou arrebatamentos. Não encontramos aqui José Miguel Ribeiro ao nível de A Suspeita, Passeio de Domingo, As Coisas lá de Casa ou Viagem a Cabo Verde. Prevalece uma intenção funcional e a sua arte na animação de volumes.
O Gigante, de Júlio Venzeler, uma animação digital, pouco deslumbrante tecnicamente, ganhou já importantes prémios a nível internacional. A narrativa é fortemente poética, contando a história de um homem que tem literalmente uma menina no coração. Acaba por refletir sobre o amor fraternal e o seu principal contra-senso: amar é incentivar a autonomia que provoca o afastamento do ser amado.
Em conjunto, a estreia destas três obras dedicadas aos mais novos é motivo de júbilo, para um género que resiste às maiores adversidades provocadas pela crise económica e falta de apoios. Este é o pretexto ideal para ir com a família ao cinema pelo Natal, celebrando a animação portuguesa.