Os vistos Gold estão na mira do Governo que pretende eliminá-los de vez, uma medida prevista no polémico programa ‘Mais Habitação’ atualmente em discussão pública. Mas, e se este título de residência pudesse ser atribuído não só a quem gasta meio milhão de euros para comprar uma casa de luxo fora das zonas de elevada densidade (as atuais regras) mas também incluísse uma variante especificamente dirigida à aquisição e construção para arrendamento acessível de habitações?
Esta é uma das propostas apresentadas pela Associação Portuguesa de Turismo Residencial e Resorts (APR) que pede ainda um “período de reflexão e de estudo sobre o impacto das últimas alterações ao programa Autorizações de Residência para atividades de Investimento (ARI)”, mais conhecido por vistos Gold e a eventual revisão do montante de investimento mínimo para a transferência de capitais para atribuição de uma ARI.
Tudo menos acabar com o programa, de forma liminar, sem análise e com decisões “em cima do joelho” que não acautelam o impacto negativo dessa medida, pede o diretor-executivo da APR, Pedro Fontaínhas.
Segundo o responsável, a extinção dos vistos Gold levaria à suspensão imediata de investimentos de mais de 600 milhões de euros e, consequentemente, da criação de mais de 1.000 postos de trabalho, que alguns dos associados da APR tinham previstos para os próximos 2 anos.
Além disso, sublinha ainda, cada investimento Visto Gold, segundo um estudo encomendado pela APR à consultora PriceWaterhouseCoopers (PWC) tem um impacto na economia, ao fim de 5 anos, de cerca de 6 vezes o valor do seu investimento inicial.
O diretor-executivo da APR refere que só em 2022, “ano em que já era impossível investir em ARI para habitação nos centros urbanos, foram captados 534 milhões de euros de investimento, ou seja, um potencial de mais de 3 mil milhões de euros a cinco anos. Um valor que representa “1,3% do PIB nacional e 18% do PRR (16,6 mil milhões de euros)”.
“Confesso que quando o programa ‘Mais Habitação’ foi anunciado, ficámos absolutamente boquiabertos com esta decisão tanto mais que há três ou quatro meses o Parlamento chumbou esta iniciativa sem apelo nem agravo. Mas de repente, eis que da cabeça desta comissão criada para este programa, volta a sair este coelho da cartola sem contexto algum. Simplesmente não faz sentido”, lamenta Pedro Fontaínhas à Visão, acrescentando que vários associados da APR já estão a receber cancelamentos de negócios que estavam em curso.
Ideologia chega ao imobiliário
Lembrando que a última revisão aos ARI foi feita a apenas 14 meses e que desde essa data, janeiro de 2022, os vistos Gold para o mercado residencial já não eram contemplados para aquisições em zonas urbanas do litoral do país, Pedro Fontaínhas sublinha que é incompreensível a extinção de um programa que capta investimento, cria emprego e pouco pesa no total do número de casas vendidas em todo o país.
“Temos consciência que existe uma crise de habitação mas também sabemos que essa crise não é em todo o país – está localizada em Lisboa e no Porto. Porque se castiga então, usando a mesma bitola, regiões como a Madeira, Açores, Algarve, Litoral Alentejano, Costa Oeste, tão dependentes do turismo?”, questiona o responsável, acrescentando que “as famílias portuguesas não compram casas em resort para viver o seu quotidiano, mas sim arrendam-nas para passar férias”.
Para quem defende que os vistos Gold geram especulação, Governo incluído, Pedro Fontaínhas pede provas. “Todo o raciocínio que seja baseado em ideologia raramente é comprovado. A ideologia, por definição, é um conjunto de crenças que não se quer debater, são apenas dogmas. Mas nós vivemos no mundo real, não vivemos nos sonhos. Como pode haver especulação quando estamos a falar de números ínfimos – desde o início do programa, os ARI representam 0,8% da venda total de transações no país e de 1,7% nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Daí o nosso pedido para que o Governo estipule um período de reflexão para se perceber o que está realmente aqui em causa”.
E a questão, também sempre referenciada, sobre o uso dos vistos Gold como meio de branqueamento de capitais? “Este tipo de investimento é o mais controlado em Portugal”, afiança Pedro Fontaínhas. “Existe um sistema muito apertado de fiscalização feito pelo Banco de Portugal e pelos bancos onde essas contas estão tituladas. Basta dizer que um residente nacional abre uma conta em qualquer banco, de um momento para o outro e um estrangeiro leva cerca de 8 semanas a conseguir abrir uma conta. Isto porque tem de responder apáginas e páginas de formulários e tem de fazer prova de tudo aquilo que escreve. Tudo é devidamente escrutinado”.
A pressão da UE para a extinção dos ARI é também uma falsa questão, realça Pedro Fontaínhas, que lembra que a União Europeia desaconselha os chamados “passaportes dourados ou seja a atribuição de cidadania por conta de investimento no país”, o que é totalmente diferente das autorizações de residência em vigor em Portugal. “A UE também desaconselha vivamente a atribuição de vistos a cidadãos russos e bielorrussos e quanto à atribuição de licença de residência de autorização de residência por investimento, que é o que estamos a falar em Portugal, apenas refere que é uma competência de cada estado-membro e do seu sistema legal, aconselhando a uma due diligence adequada, séria e apertada aos investidores”, sublinha o responsável da APR, realçando que “só no continente europeu, incluindo a Turquia, que é meio europeu meio asiático, existem 99 programas de autorização de residência por investimento, uma vez que existem países que possuem quatro, cinco, seis programas deste genéro”.