Cerca de 40% dos proprietários de imóveis têm rendas em atraso e destes, mais de um terço (36,5%) acumulam perdas de três a seis meses de rendas. Uma parcela de 18,3% dos inquiridos tem mesmo mais de meio ano (6 meses) de rendas em atraso. Estas são as principais conclusões do Barómetro “Confiança dos Proprietários”, uma iniciativa da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP) – a mais antiga e representativa estrutura associativa de representação dos proprietários urbanos, que apesar do nome, agrega senhorios de todo o país.
Perante os resultados, a maioria dos inquiridos desta III edição do Barómetro da ALP, mais precisamente dois terços (64,4%) dos proprietários afirma “não ter confiança na evolução do mercado imobiliário português no segundo semestre de 2021. O incumprimento dos inquilinos deixou de ser o maior receio dos proprietários de imóveis, ultrapassado pela possibilidade de o Governo aumentar a carga fiscal sobre o património”, realça comunicado da ALP hoje divulgado.
“Os proprietários sentem-se reduzidos a contribuintes que são forçados a manter os cofres cheios com receitas milionárias, acima dos mil milhões de euros, respetivamente, em sede de IMI e IMT, mesmo em contexto de pandemia e com níveis de incumprimento dos inquilinos muito graves. É por isso que o receio de um aumento de impostos emerge como a maior preocupação dos proprietários auscultados no estudo da ALP”, critica Iolanda Gávea, vice-presidente da ALP, acrescentando que “o arrendamento não pode ser uma atividade com tanto risco associado, quase como uma roleta”.
A responsável lembra que “este clima de impunidade não acontece, por exemplo, nos incumprimentos que envolvem a banca, num crédito à habitação”. E questiona: “Algum banco emprestaria dinheiro se quatro em cada dez dos seus clientes incumprisse?Porque é que é então aceitável a situação no arrendamento? Até quando?”
Arrendamento acessível chumbado
Abraçado por várias autarquias do país, o programa de arrendamento acessível coloca imóveis a custos controlados no mercado através da parceria com proprietários particulares que em troca recebem mais benefícios fiscais e comprometem-se a ceder os seus imóveis para gestão do município.
Mas olhando para os resultados do barómetro, os proprietários não parecem estar muito convencidos: “91,7% dos proprietários não confiam nestes programas do governo/ municipais e apenas 2,3% dispõem de imóveis colocados neste mercado”.
Questionados sobre a razão pela qual não confiam, três quartos (75,1%) referem que não poder escolher pessoalmente os inquilinos é o maior motivo de desconfiança. E praticamente 70% dos respondentes apontam ter receio de que os benefícios fiscais destes programas e outros termos contratuais sejam alterados unilateralmente pelo Estado. Os valores de renda praticados nestes programas são pouco atrativos para 40,5% dos proprietários, e a burocracia inerente aos programas é também apontada por 38% como um dos motivos que afasta proprietários.
“Muito relevante também para a discussão do falhanço do arrendamento acessível é o facto de mais de metade (51,4%) dos proprietários inquiridos afirmarem suportar ainda contratos de arrendamento antigos, com rendas congeladas (anteriores a 1990)”, diz a associação. Recorda a ALP que estes contratos, ao contrário daqueles que estão ao abrigo do arrendamento acessível, não têm quaisquer isenções fiscais, apesar de praticarem valores de renda muito abaixo dos de mercado e destes programas de estímulo ao arrendamento.
“Os proprietários de imóveis, que detêm 98 por cento da oferta de habitação do país, não foram, lamentável e inexplicavelmente, auscultados em nenhuma das medidas que Governo e autarquias implementaram em matéria de política de Habitação. Os resultados estão à vista – os proprietários não confiam no Estado, e por arrasto nos programas de arrendamento acessível, que são um fracasso também a nível municipal, nomeadamente em Lisboa, apesar de ambos acenarem com um pacote de isenções fiscais que à partida devia ser irrecusável e levar a uma explosão de imóveis colocados neste segmento”, afirma Iolanda Gávea, vice-presidente da ALP.
Rendas não baixam
Em relação ao impacto da pandemia nos preços no arrendamento, os respondentes dividem-se: 36,4% consideram que os preços vão estabilizar e 35,5% consideram que irão diminuir. Sem surpresa, quando questionados sobre que preços vão praticar em novos contratos a celebrar no segundo semestre de 2021, três quartos (76,5%) dos proprietários inquiridos respondem que vão manter os preços inalterados. Mas a percentagem de proprietários que pretendem aumentar os preços (12,6%) é maior do que a percentagem daqueles que indicam que vão diminuir os valores praticados (10,9%).
E apesar do elevado incumprimento das rendas , praticamente três quartos da amostra (74,4%) não vai instruir na Justiça um processo de despejo. Diz a ALP que a maioria (59,7%) alega “solidariedade com as dificuldades que a pandemia trouxe aos inquilinos”. Porém, 22% gostaria de despejar os inquilinos em falta mas não recorrem aos tribunais devido à morosidade dos processos, “uma situação agravada pela pandemia e pelas moratórias de suspensão de denúncias e despejos até ao passado dia 1 de Julho”, sublinha-se no comunicado.
Já no que diz respeito à compra e venda de imóveis na segunda metade do ano, 44,9% dos proprietários inquiridos são da opinião de que se vão vender menos imóveis, mas os preços se irão manter em níveis pré-pandemia. Um terço (33,6%) acredita que os investidores estrangeiros vão ser os principais compradores de imóveis em Portugal durante o segundo semestre, com outro terço (33,2%) a considerar que os preços vão cair sobretudo no segmento não-habitacional (escritórios/comércio). Apenas 6,1% dos inquiridos estão convencidos de que a “bolha do imobiliário” no segmento de compra e venda vai “rebentar”.
Quem quer reabilitar a casa?
Um terço da amostra inquirida pretende fazer operações de reabilitação urbana na segunda metade do ano e a eficiência energética é um tema que assume importância para quase três quartos dos respondentes (73,5%), com um quarto dos proprietários a afirmar que irá utilizar verbas do Fundo Ambiental (2ª fase do Programa de Edifícios Mais Sustentáveis) para substituir caixilharias de janelas (82,4%), reforçar o isolamento térmico das habitações (49,3%) e um quarto a avaliar a instalação de soluções de produção de energia sustentável/renovável.
Perfil dos proprietários
O Barómetro ALP foi realizado entre 1 de maio e 7 de junho de 2021, através de uma plataforma online. A amostra reuniu mais de duas centenas de proprietários – dos quais quase três quartos Associados da ALP (75,5%). A nível etário, 61,4% dos inquiridos tem idade compreendida entre os 55 e os 75 anos, demonstrando a senioridade dos proprietários nacionais.
A esmagadora maioria dos inquiridos (93,2%) são proprietários de imóveis colocados no mercado de arrendamento tradicional.
O inquérito da ALP tem expressão nacional, mas mais de metade (48,6%) dos inquiridos detêm imóveis na região da Área Metropolitana de Lisboa. Uma maioria de 58,6% dos respondentes são proprietários de um a cinco imóveis. Uma percentagem de 51,4% aufere um rendimento bruto dos seus imóveis colocados no mercado de arrendamento até três salários mínimos nacionais (SMN). Mas mais de 20% da amostra retira destes imóveis um rendimento bruto inferior a um salário mínimo nacional.
Quase metade dos inquiridos (40,9%) afirmam que os rendimentos prediais representam mais de metade do seu rendimento mensal. Para cerca de 19,5%, as rendas recebidas são todo o seu orçamento familiar.