As mexidas frequentes nas regras que norteiam o mercado imobiliário seja o habitacional, seja o de rendimento, fazem parte das queixas de quem opera no setor e a mais recente notícia de que o Governo vai mesmo acabar com os vistos Gold até ao final do ano, não é exceção. Na apresentação do já tradicional Marketbeat de outono da Cushman&Wakefield (CW), Eric van Leuven, diretor-geral da consultora, não poupou críticas à eventual decisão do Governo em alterar as regras dos vistos Gold, tornando-os inacessíveis nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e nas Comunidades Intermunicipais do Litoral, uma decisão a entrar em vigor até ao final do ano, segundo notícia recente do Jornal de Negócios.
Eric van Leuven, diretor-geral da Cushman & Wakefield
“É uma estupidez acabar com os vistos Gold num momento em que Portugal precisa muito de capital. Os vistos Gold desempenharam um papel importante na crise anterior e poderiam também ser essenciais na crise que agora se avizinha”, sublinhou o responsável da CW (que preside também à Associação das Empresas de Consultoria e Avaliação Imobiliária (ACAI).
Andreia Almeida, responsável pelo departamento de Consultoria da CW e também presente na video-conferência reforçou, lembrando que essa alteração legislativa poderá afetar a procura residencial por parte de mercados que já eram bastante dinâmicos por cá, como o americano e o brasileiro, e que devido à má gestão da crise sanitária provocada pelo surto de Covid-19 nos países de origem, procuram alternativas. “Para quem vive nestes países onde o efeito da pandemia tem sido devastador, Portugal surge como um país mais seguro para investir e aí o visto Gold funciona como mais um bónus”, reforçou Andreia Almeida.
Mas não se trata só de atrair capital estrangeiro para o mercado habitacional mas de afugentar também aquele que é canalizado para outros segmentos do setor imobiliário por má reputação do país quanto ao respeito pela regras vigentes no mercado, defenderam os responsáveis da CW lembrando que o peso dos vistos Gold no volume global das transações imobiliários nem sequer é muito significativo.
Dados do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) para o ano passado, por exemplo, mostram que os vistos Gold representaram cerca de 660 milhões de euros, um montante que corresponde a apenas 2,6% do volume global de transações imobiliárias realizadas no mercado que totalizaram cerca de 25 mil milhões de euros.
“O tema Vistos Gold não se limita aos preços do imobiliário de luxo. Em termos de peso material no volume global de negócios é mínimo mas dada a sua visibilidade internacional tem um efeito bastante significativo na reputação e na confiança institucional do país ”, sublinhou, por seu turno, Paulo Sarmento, diretor do departamento da CW, acrescentando que a notícia tem causado “estupefação junto dos investidores do imobiliário comercial, que questionam se é seguro investir num país onde o quadro legal está em constantes alterações, alterações essas que não favorecem o investimento imobiliário”.
Segundo o Markerbeat da Cushman, os investidores estrangeiros representaram uma significativa fatia de 80% no capital investido em imobiliário de rendimento nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto (edifícios de escritórios, retalho, hotelaria, logística) durante os primeiros nove meses deste ano permitindo atingir um novo máximo histórico de €2.330 milhões. Um valor que equivale a um crescimento de 36% face ao período homólogo.
Apesar de representar 20% do bolo total de investimento, o capital nacional ainda assim duplicou o volume investido (€485 milhões) no período em análise, refere-se no documento.
Foi também neste período que se concretizou a maior transação desde que há registo, a aquisição de 50% da joint-venture Sierra Prime pela Allianz Real Estate e Elo à Sonae Sierra e APG, por cerca de €800 milhões. Uma operação que contribuiu para que o setor de retalho tenha pesado 46% do total de investimento imobiliário comercial nestes nove meses, com €1.058 milhões. Seguiu-se o setor de escritórios, com 35% do volume total (cerca de €810 milhões). Neste setor, destaque para a venda pela Kildare Partners, após dois anos de detenção, do Lagoas Park à Henderson Park Capital Partners por €421 milhões e do portfolio PREOF pela Finsolutia à Cerberus por um valor estimado em €150-170 milhões. O setor hoteleiro captou 13% do capital investido, na ordem dos €310 milhões.