É rápido, é barato e poupa milhões, assim poderia ser o lema da construção modular. Mas ao contrário do Totoloto aqui o investimento tem sempre retorno, basta quebrar os preconceitos que existem ainda em Portugal associados a um sistema que põe de pé uma casa em semanas ou poucos meses comparativamente aos anos que se leva a construir de raíz.
Quem o diz é Samuel Gonçalves, arquiteto fundador do ateliê Summary que apostou tudo para desbravar um caminho ainda pouco percorrido por cá – a da construção modular em betão para primeira habitação ou para usos comerciais.
Se a construção modular em madeira – que em Portugal continua a estar mais associada a casas de segunda habitação ou estruturas mais efémeras – foi ganhando alguma quota de mercado, já a construção por módulos em betão ainda está a dar os primeiros passos. Neste conceito, a casa sai literalmente construída da fábrica e é montada quase em sistema de Lego no local reduzindo drasticamente o tempo de edificação. Consoante a escala, este poderá decorrer entre semanas ou alguns meses.
“No nosso país ainda há quem tenha preconceito em relação ao sistema modular por considerar que é uma construção de segunda por não ser construída de raíz no local. No entanto, estamos a falar de edifícios feitos integralmente em betão armado. Não há uma parede de pladur ou de tijolo. E não são edifícios provisórios. Aliás, o processo de licenciamento é exatamente igual aos outros”, explica Samuel Gonçalves, que desenvolveu em 2015 o sistema ‘Gomos Building System’ assente na edificação em ‘fatias’, os gomos (já com isolamento térmico incorporado) que se ajustam a qualquer configuração e que podem levar qualquer acabamento de acordo com as exigências do cliente, um processo que conta com a parceria da empresa Farcimar que produz os módulos.
Este sistema valeu-lhe o reconhecimento internacional tendo-se tornado o mais jovem arquiteto a ser convidado para a Bienal de Veneza em 2016 e dois anos depois considerado “um dos jovens arquitetos mais promissores da Europa”, no concurso internacional “Europe 40 Under 40”.
Já com mais de uma dezena de projetos concluídos ou em curso, entre os quais a sede da Associação Empresarial de Cambra e Arouca (um dos primeiros que ficou terminado), um equipamento desportivo em Aveiro, uma residência universitária no Porto ou um complexo turístico na aldeia da Paradinha, junto aos Passadiços do Paiva, o ateliê Summary está direcionado para projetos já com alguma escala.
Lá fora, este mercado tem-se expandido e, segundo o “Prefabricated Building Market Report” vale, a nível mundial, mais de 106 mil milhões de dólares (98 mil milhões de euros), estimando-se que em 2026 ascenda a cerca de 150 mil milhões, previsão feita ainda antes da pandemia.
“O crescimento deste mercado assenta muito na explosão demográfica e na necessidade de construção rápida nas grandes cidades para fazer face à procura. Mas para além da rapidez e da questão ecológica (uma vez que é tudo produzido localmente), coloca-se agora também uma outra variável no processo – a construção é feita com um número mínimo de trabalhadores, o que é uma vantagem em tempos de pandemia”, diz o arquiteto.
A outra são os custos. Com um valor médio de referência por metro quadrado na ordem dos 1.000 euros, estas casas têm registado grande procura no mercado de habitação acessível nos países onde a construção modular está mais desenvolvida.
Um dos exemplos recentes vem do Canadá. Em Toronto, no início deste mês, a câmara municipal aprovou a construção de 250 casas de habitação social que deverão estar prontas em setembro. A urgência imposta pela Covid-19 que tal como cá já está a ter impacto no rendimento das famílias e na necessidade de oferta habitacional mais acessível, foi decisiva para esta escolha.
Samuel Gonçalves espera que a tendência se replique em Portugal e lembra a Lei de Bases da Habitação, aprovada no ano passado e onde se prevê a promoção de casas assegurada pelos municípios – “a construção modular pode ser a solução para a habitação de baixo custo”, defende.
Mas para já, são os privados que o procuram para este tipo de habitação. O seu mais recente projeto é um edifício de uso misto com cerca de 1.000 m2 em Vale de Cambra, distribuído por dois espaços comerciais (um deles já ocupado por uma cafetaria) e seis apartamentos com cerca de 50 m2, cada um. O proprietário vai colocá-los no mercado de arrendamento de baixo custo.
Um projeto que tal como os outros com a assinatura do ateliê Summary também já está a dar nas vistas no meio da arquitetura – a obra foi uma das selecionadas no prémio internacional AZ Awards na categoria “Residential Multi-Unit Architecture” e está entre os 68 finalistas escolhidos entre 1241 propostas, de 47 países diferentes.