Assumi a presidência da APEMIP (Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal) há dez anos e, nessa altura, defini aquelas que seriam as minhas bandeiras enquanto dirigente associativo. A dinamização do mercado de arrendamento urbano foi uma delas e, provavelmente, aquela pela qual mais me tenho batido. Hoje, creio que a minha escolha é compreendida por todos, mas à data não havia muita gente a entender que o representante das imobiliárias defendesse tão afincadamente um mercado que, em termos de negócio, representava uma percentagem pouco relevante para as empresas de mediação.
Mas o paradigma mudou, e a crise económica que se fez sentir no País também teve impacto negativo no mercado de compra e venda, com o número de transações a cair consideravelmente e com a procura pelo mercado de arrendamento urbano a crescer, não por opção das famílias, mas por falta de alternativa.
Em Portugal, o arrendamento nunca foi uma escolha, mas, sim, uma solução para remediar. E tal prende-se não só com a questão cultural de querermos ter este sentimento de posse mas também com o facto de o arrendamento nunca ter sido um mercado competitivo, sobretudo quando comparamos o valor das rendas com o de uma prestação de crédito à habitação. Só que esta falta de competitividade tem vindo acentuar-se, com os valores das rendas a atingirem números que estão longe daquilo que a generalidade dos jovens e das famílias portuguesas podem pagar.
Num período em que a mentalidade das novas gerações é diferente das anteriores, e que a posse é cada vez menos valorizada, o arrendamento deveria estar a ganhar cada vez mais dinâmica, mas as grandes cidades oferecem poucas alternativas, e a falta de stock impulsiona a subida das rendas. Estas, por si só, já se apresentavam elevadas devido à fiscalidade que é aplicada sobre os proprietários que, por sua vez, tentam colmatar as despesas e ganhar qualquer coisa com o negócio.
Há pelo menos uma década que tenho defendido que a única forma de promover a dinamização do mercado de arrendamento é a diminuição da fiscalidade sobre quem nele opera. Só que os sucessivos governos fizeram ouvidos moucos a esta e a outras sugestões e preferiram empurrar com a barriga uma decisão que ninguém parecia entender como urgente.
Pelo caminho foram encontrados bodes expiatórios, como o alojamento local (AL), para o qual se apontaram todas as armas numa tentativa de destruir uma alternativa de negócio que muito ajudou o imobiliário a sair da crise, quer pelo incentivo à reabilitação urbana quer pelo emprego que gerou. Promoveu-se a ideia falaciosa de que os senhorios estavam a despejar famílias para apostarem no mercado de arrendamento, quando o AL progrediu principalmente através de ativos que estavam degradados ou devolutos. Mas, mesmo que assim não fosse, não poderíamos apontar o dedo aos proprietários que olham para o mercado como um negócio e que só arriscam se o considerarem rentável.
Até que chegámos à fase do “nem-nem”, com as famílias a não terem nem condições para comprar nem condições para arrendar. Foi preciso entrarmos numa verdadeira crise habitacional para que os alertas soassem a sérios e fossem, de uma vez por todas, tomadas decisões que tentam promover o aumento da oferta, em vez de atacarem do lado da procura.
Com a entrada em vigor, no início deste ano, de um pacote de medidas para o arrendamento, que engloba a introdução de benefícios fiscais a proprietários que coloquem as casas no mercado a preços acessíveis e durante um período de tempo mais diluído, o problema não se resolve, mas com certeza atenuar-se-á. E há que louvar o Governo por ter dado finalmente ouvidos ao mercado e aos cidadãos.
Talvez a cura para esta doença tenha aparecido tarde, mas, como diz o ditado popular, mais vale tarde do que nunca, e pelo menos deu-se finalmente um sinal positivo ao mercado e a quem nele aposta. Claro que, da parte de quem faz do arrendamento um negócio, a reconquista da confiança levará o seu tempo, e ainda há um caminho a percorrer, mas deu-se um passo em frente. E é para a frente que é o caminho.