Um acidente traçou-lhe o destino. Nascido no Togo, em 1941, Tété-Michel Kpomassie tinha 16 anos quando foi mordido por uma serpente ao subir a um coqueiro. A tragédia alarmou a aldeia inteira, mas a sua recuperação foi ainda mais saudada. O pai quis oferecer o filho ao culto da sacerdotisa da floresta, pois estava convencido que fora ela que o salvara. Mas Tété-Michel tinha outras ideias. Durante a recuperação, passara por uma livraria e comprara Os Esquimós – Da Gronelândia ao Alasca, de Robert Gessain. E essa leitura mudou a sua vida. Ficou fascinado pela hospitalidade desse povo aí descrita e secretamente congeminou um plano: fugir, libertar-se do destino que escolheram por ele e cruzar meio mundo para chegar à terra dos esquimós, dos caçadores de focas, dos iglus.
Viveu, pelo caminho, aventuras extraordinárias e mais ainda já na Gronelândia, subindo cada vez mais para norte. Mas, a certa altura, percebeu que o seu destino era apenas o início de uma viagem ainda maior. A de divulgar tudo o que aprendeu junto das gerações mais novas do seu país e da África em geral. Desde então – partiu em 1961, regressou oito anos depois – tem viajado um pouco por todo o mundo. O livro que escreveu e que foi publicado em França, em 1981, converteu-se rapidamente numa obra de culto. Além de ser o relato do primeiro africano a pisar a Gronelândia, tem a força de um estudo antropológico, que tanto fixa o que é observado, como quem observa. O Africano na Gronelândia, que a Tinta-da-china acaba de publicar entre nós, é o testamento de quem defende que “o encontro com o Outro não precisa de ser um confronto, pode ser um maravilhamento”. Aquele que ele próprio protagonizou e que, em conversa com a VISÃO, agora recorda.