Luxo, luxo é uma pessoa poder ganhar a vida a fazer perguntas. Esta necessidade de questionar, de querer saber do outro, de onde vem, como chegou até ali, as histórias e caminhos que constroem cada um de nós, acompanha-me a todo o lado. E é mesmo difícil evitá-lo. Quando abuso, socorro-me do vício profissional, como defesa. Mas a verdade, verdadinha é que a profissão não é para aqui chamada. Sempre fui assim. E se há situações em que a mania de perguntar me criou constrangimentos, também me proporcionou momentos de puro deleite e até fez nascer algumas amizades.
Pus-me a pensar nisso depois de mais uma destas situações felizes. No fim de semana fiquei alojada na Quinta da Comenda, em São Pedro do Sul. Durante o pequeno-almoço, Ângelo, o anfitrião, veio trazer leite de cabra, acabado de ordenhar, descreveu os frutos presentes no sumo natural e explicou as propriedades dos vinhos brancos, DOP Lafões, nascidos ali mesmo, daquela vinha. Também referiu que se tinha mudado para a quinta, com a mulher, há cinco anos, depois dos filhos se terem autonomizado. Neste momento, não resisti a perguntar como é que alguém que se tinha mudado ‘para o campo’ há apenas uma mão cheia de anos já estava tão confortável em tarefas agrícolas como ordenhar cabras, produzir vinho, manter um pomar e moer farinha para o pão do pequeno-almoço. “Sempre estivemos ligados à agricultura. Antes vivíamos em Sintra e tínhamos uma exploração de produtos biológicos”, contou. Aí comecei a percorrer mentalmente a base de dados de contactos e plim, deu match! Ângelo, agricultura biológica, só pode ser o Ângelo Rocha da Biocoop e da Miosótis. Já o tinha entrevistado há tempos e subitamente até a voz me pareceu familiar. Depois deste reencontro, tive direito a visita guiada pela quinta e ao relato de muitas histórias vividas naquele antigo castelo, comprado pelo pai de Ângelo, um cirurgião pediátrico que para salvar um cipreste (que ainda lá está, frondoso, ao lado da capela) comprou a propriedade inteira.
Foi uma manhã perfeita, a percorrer o caminho até ao riacho, a visitar o moinho recuperado e a estudar o seu mecanismo, a pôr as mãos na água fresca, sempre acompanhada das histórias de vida do Ângelo e da Manuela. No regresso a casa, vim a pensar na sorte que é não ter vergonha de perguntar. No campo da política ficarão para a história as perguntas incisivas e diretas da deputada Mariana Mortágua, que nas Comissões de Inquérito ao caso GES nunca se deteve perante os donos disto tudo. “É um bocadinho ingénuo ter ganho os prémios de melhor CEO da Europa e arredores e não saber que 90% da tesouraria [da Portugal Telecom] estava investida no mesmo grupo [GES]?”, atirou a Zeinal Bava, num momento que se tornou viral. E o tanto que devemos às mentes inquietas que na busca de respostas às questões primordiais – de onde vimos, para onde vamos, o que fazemos aqui – nos trouxeram saúde, qualidade e quantidade de vida, naves espaciais e Internet.