A pandemia veio confirmar o que já se sabia ser uma necessidade. Se até então o progresso era lento, a Covid-19 fez acelerar o investimento em saúde digital, para uma dimensão sem precedentes, o que levanta questões como: que sistema de saúde queremos para o futuro? Ou como será a relação médico-paciente no pós-pandemia?
A digitalização de alguns serviços de saúde públicos já começou a permitir escoar o fluxo de utentes que, muitas vezes, acaba por assoberbar unidades de saúde (hospitais centrais, centros de saúde) e reduzir a qualidade dos serviços prestados. A título de exemplo, a marcação de consultas através de plataformas ou aplicativos desenvolvidos para o efeito, através do smartphone ou computador, permite às centrais de atendimento de marcações – muitas vezes, às próprias receções – focarem-se noutro tipo de tarefas administrativas, como o processamento de faturas e acompanhamento de exames. Já o próprio Sistema Nacional de Saúde, com a criação e implementação do SNS24, veio adaptar-se a uma nova realidade e a criar soluções eficazes para as triagens iniciais, normalmente realizadas em unidades hospitalares.
No entanto, ainda há um caminho a percorrer. As consultas à distância, realizadas por videochamada e através de canais seguros, deverão passar a fazer parte da rotina. Estas permitem dar vazão a aglomerados em espaços comuns das unidades de saúde e, consequentemente, melhorar a gestão das agendas dos profissionais devido aos atrasos menores dos pacientes. Com a pandemia e o confinamento obrigatório, grandes grupos hospitalares, privados e públicos, trouxeram para cima da mesa soluções neste sentido e, naturalmente, mantiveram a oferta, devido à procura favorável por parte dos utentes.
De acordo com Jennifer A. Mallow, professora associada de Enfermagem na Universidade de West Virginia, ao falarmos de soluções digitais no setor da saúde, há também que considerar o custo de oportunidade para os utentes. Se para observações pouco ou nada invasivas, não necessitamos de nos deslocar a um centro hospitalar, então ficamos a ganhar em algo cada vez mais importante no nosso dia a dia: tempo. Tempo que não é perdido em deslocações, em filas e salas de espera ou fora do trabalho.
Além destas soluções, outras opções têm vindo a surgir, o que, no pós-pandemia, poderão modificar o sistema de saúde como o conhecemos: monitorização de pacientes à distância, através de aparelhos próprios ligados a aplicações e dispositivos, através dos quais os médicos conseguem avaliar, em tempo real, alterações na saúde do paciente; consultas em casa, agendadas, via internet, e realizadas no mesmo dia; e até mesmo sistemas de inteligência artificial que permitam melhorar e aperfeiçoar processos.
Neste sentido, não só se observará uma mudança no espaço em que decorre o ato médico (consultório para o domicílio), como também se normaliza o tema da distância física entre médico e paciente. De facto, estudos demonstram que a telemedicina, em muitos casos, é tão eficaz no tratamento de pacientes como a medicina tradicionalmente aplicada, com observações em pessoa.
Portanto, se, por um lado, estas inovações têm vindo a demonstrar resultados relevantes e de grande peso na evolução da medicina em Portugal e no mundo, por outro, há que educar a população e os próprios profissionais neste sentido. Processos extremamente enraizados terão de ser moldados a esta nova realidade em que dois fatores se cruzam: i) uma geração cada vez mais apegada às novas tecnologias; e ii) um pós-pandemia, no qual o contacto físico é limitado e pouco recomendado. O paciente entra assim como uma peça essencial para o jogo, através da coresponsabilidade pela sua saúde e pelas terapêuticas aplicadas em momentos de observação em todo o período subsequente.
Em suma, o futuro avizinha-se otimista no que toca ao desenvolvimento de tecnologias no setor da saúde. A procura tem sido positivamente responsiva e a oferta, tanto no setor privado como no público, tem procurado responder a um público cada vez mais exigente. É possível concluir que estamos no caminho certo, falta somente tornar estes avanços uma realidade acessível a todos os portugueses.