O acesso transversal a dispositivos móveis e a possibilidade de gestão de praticamente tudo a partir de um smartphone ou um tablet não são novidade. O recente surto pandémico e a necessidade de confinamento acrescentaram novas evidências ao que era já uma tendência e, entretanto, ganhou expressão. Trata-se, na maior parte dos setores de atividade, de uma questão de volume – aumentaram exponencialmente as compras online nos setores do retalho e bens de consumo; os serviços de entregas ao domicílio e call center/apoio ao consumidor foram o rosto e voz da maioria das marcas durante a crise sanitária; mesmo nos serviços públicos, os serviços prestados remotamente constituíram a esmagadora maioria dos contactos estabelecidos com os cidadãos.
No setor da saúde, dadas as circunstâncias, não foi bem assim. Não se registou apenas o aumento do número de atividades desenvolvidas remotamente. Tornou-se imperativo alargar essa abordagem a serviços e áreas do setor em que o contacto remoto era, em termos absolutos, inexpressivo: o recurso a teleconsultas; a integração digital, em tempo real, de dados epidemiológicos regionais; a interoperabilidade entre os setores público e privado.
Assistimos, enquanto sociedade, a reflexos muito tangíveis do potencial do que se tem vindo a designar por big data: na informação das autoridades, na capacitação dos corpos clínicos, na sensibilização da população, no mapeamento e monitorização da situação e preparação da melhor abordagem de cuidados de saúde.
A par da monitorização da pandemia e respetiva evolução, a captação, partilha e sincronização de dados, necessariamente interoperáveis entre vários interlocutores com intervenção na gestão da crise, ganharam, neste setor, uma centralidade nunca antes tão premente.
Num artigo recente, a McKinsey & Company destacava, no atual contexto, a importância das bases de dados, de plataformas agregadoras de informação cuja análise permitirá interpretar sinais, com base nos quais se tomarão decisões de forma ágil e sustentada.
Foi sobre a importância dessas plataformas e da qualidade dos dados no setor da saúde que incidiu o Health Data Forum, uma cimeira online que juntou recentemente cerca de 42 especialistas das áreas da saúde e tecnologia, bem como representantes de entidades públicas nacionais e internacionais. Principal conclusão a destacar: a importância da colaboração e partilha de dados no setor da saúde.
Da conclusão fundamental deste evento, de que a GS1 Portugal foi parceira, decorre a relevância de uma gestão de qualidade dos dados e da informação no setor, impõe-se uma análise das oportunidades que essa gestão oferece, em termos de ganhos em eficiência.
Os benefícios potenciais de uma efetiva integração da cadeia de valor da saúde no nosso país, pela via da adoção de uma codificação única, compatível com standards globais, também não constituem novidade. Foram estudados pela consultora Augusto Mateus & Associados, em 2014, e demonstrados no Hospital Dr. José de Almeida, do Grupo Lusíadas Saúde, de Cascais. Nesta unidade Hospitalar, em 2016, foi implementado o sistema integrado do medicamento, assente na codificação, em parceria com a GS1 Portugal. Este sistema permitiu concluir que a adoção de codificadores únicos no circuito do medicamento, em contexto hospitalar, permite uma redução de 28% no tempo médio gasto na administração de medicamentos pela equipa de enfermagem, por utente. O que permitiu que cada enfermeiro, por turno de oito horas, passasse a dispor de mais 22 minutos e meio para a prestação de cuidados assistenciais e para o relacionamento com o doente, libertando-se de procedimentos administrativos.
Ora, daqui se conclui, mais uma vez, que os benefícios de uma gestão qualitativa de dados no setor da saúde, não é novidade. Novidade são as múltiplas declinações deste exemplo que a crise pandémica evidenciou, empiricamente, em áreas da saúde inesperadas e visíveis, aos olhos de todos, em diretos diários televisivos, em mapas interativos da pandemia, em projeções de evolução futura.
No que a McKinsey & Company designou por “o próximo normal” seria determinante dotar os dados da centralidade de que dispuseram no recente período de crise, na expectativa de que, desta revolução digital na saúde, em estado de emergência, calamidade e confinamento, resultassem os pilares de uma ponte definitiva entre os mundos físico e digital, assente numa gestão qualitativa dos dados. No momento em que se assinalam os 15 anos de intervenção da GS1, a nível global, no setor da saúde, estamos disponíveis, como sempre, para apoiar a colocação da primeira pedra.
Artigo originalmente publicado na Exame Informática Semanal 153