A delegação de Portugal assinou no Conselho da União Europeia um conjunto de propostas de emendas à futura diretiva dos Direitos de Autor, que prevê a aplicação de sistemas de identificação e bloqueio dos conteúdos piratas que sejam descarregados pelos internautas para redes sociais, portais de partilha de vídeo e ficheiros, caixas de comentários dos jornais eletrónicos, plataformas de produção de blogues ou de partilha de linhas de código, ou ainda sites especializados na venda de produtos. Além da delegação portuguesa, a proposta que foi entregue no dia 2 de outubro conta com as assinaturas dos representantes das delegações francesa e espanhola.
Caso estas emendas sejam adotadas, Facebook, Youtube, Twitter, Instagram, Dropbox, Google Drive, One Drive da Microsoft, WordPress, Blogger, qualquer jornal diário com caixas de comentários, eBay e OLX, Github – e qualquer outra plataforma que se distinga por permitir que o público faça upload de conteúdos poderá ser obrigada a criar as condições para que possam ser usadas ferramentas de identificação de conteúdos e filtros que inviabilizam, mesmo sem qualquer denúncia e eventualmente de forma automatizada, a distribuição de músicas, filmes, fotos ou animações sem as devidas autorizações legais.
As três delegações apresentaram quatro propostas de emenda ao texto da diretiva. Três das propostas de emendas incidem em pontos relacionados com o âmbito da diretiva; mas há ainda uma quarta proposta de emenda que tem em vista a substituição do 13º artigo – e que atribui aos sites, portais e plataformas que se distinguem pelo upload a responsabilidade de tomar as medidas necessárias para detetar e identificar conteúdos piratas ou aplicar medidas que impedem, previamente e pela via tecnológica, a disseminação de cópias ilegais dos mais variados conteúdos.
«Os estados membros devem assegurar que todos os serviços da sociedade de informação que armazenam e dão acesso a quantidades significativas de obras protegidas pelos direitos de autor ou conteúdos descarregados pelos respetivos utilizadores, mediante solicitações vindas dos titulares dos direitos de autor e dependente da disponibilização da informação necessária para permitir a identificação dos conteúdos pelas empresas que prestam esses serviços, tomem medidas para impedir a disponibilização, nos respetivos serviços, das obras ou outros conteúdos que tenham sido identificados pelos titulares de direitos», refere a proposta de emenda que os delegados português, espanhol e francês apresentaram no Conselho da União Europeia.
O texto proposto pela Comissão Europeia para a futura Diretiva dos Direitos de Autor coloca o ênfase no estabelecimento de acordos entre plataformas que disponibilizam conteúdos na Internet e a indústria dos conteúdos – e é no âmbito destes acordos que a proposta de diretiva prevê que a remoção dos conteúdos piratas possa ser feita sem obrigar as plataformas que operam na Internet que terão de se munir das ferramentas necessárias e sem especificar se será um juiz ou apenas uma decisão administrativa, como hoje vigora em Portugal ao abrigo do Memorando Antipirataria, a decidir o bloqueio de conteúdos que não respeitam os direitos de autor.
As propostas de emendas subscritas pela delegação portuguesa também instam as plataformas que operam na Internet a assinarem contratos ou acordos com a indústria dos conteúdos, a fim de garantirem a legalidade da distribuição das diferentes obras. Neste ponto, a proposta de emenda está em consonância com as reivindicações que a indústria dos conteúdos apresentou no ano passado, com vista à renegociação dos direitos de reprodução de obras através de portais como o YouTube.
Nas propostas de emenda, há ainda a intenção de responsabilizar sites, plataformas e redes sociais pelos conteúdos que os internautas disponibilizam – o que contraria a legislação do comércio eletrónico atualmente em vigor na UE, que isenta os fornecedores das ferramentas da responsabilidade legal perante a disseminação de conteúdos piratas.
Em comunicado conjunto, a Associação D3 – Defesa dos Direitos Digitais, a Associação Ensino Livre (AEL) e Associação Nacional para o Software Livre (ANSOL) insurgem-se contra o que consideram um «movimento pela censura na Internet» e não hesitam em pôr em causa «o novo Conselheiro Técnico na Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia» pelo facto de «ter sido diretor geral da Motion Picture Association Latin America». Atualmente, o cargo de Conselheiro Técnico na Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia é desempenhado por Ricardo Castanheira Jorge, antigo deputado do PS.
Segundo as três associações, as plataformas e os sites que operam na Internet «não têm competência nem legitimidade para decidir, e muito menos têm qualquer incentivo para decidir de forma imparcial. Colocadas perante a possibilidade de serem responsabilizadas pelos conteúdos que os utilizadores enviam, irão agir de forma preventiva e conservadora, censurando primeiro, e perguntando depois. Em caso de mínima dúvida, as empresas colocar-se-ão sempre do lado dos detentores de direitos, não do lado da liberdade de expressão dos cidadãos, dada a assimetria de poder existente. Tal já é manifesto no regime atual (ver exemplos acima)».
AEL, D3 e ANSOL consideram ainda que as alterações propostas por Portugal, Espanha e França limitam o potencial de sucesso de startups que pretendam avançar com serviços baseados na lógica do upload. E deixam uma última comparação: «Conteúdos de pedofilia ou de terrorismo devem ser removidos quando detectados. Não há qualquer razão para que os conteúdos protegidos por direitos de autor não devam seguir a mesma regra».