Já se sabe: 2020 é um género de “ano 0” da eletrificação automóvel em consequência das novas regras impostas pelo CAFE – ver aqui a explicação em vídeo via Facebook Live – que condiciona seriamente as emissões de dióxido de carbono dos automóveis. O grupo PSA, dono das marcas Peugeot, DS, Citroen e Opel, está entre os fabricantes mais apostados em eletrificar a frota. Fomos até Barcelona conhecer um pouco melhor as diferentes propostas da Peugeot: o compacto e-208, o SUV e-2008, o 508 Hybrid e o 3008 Hybrid4. Os dois primeiros são 100% elétricos e os restantes são híbridos plug-in já com uma autonomia em modo elétrico muito razoável.
e-208 e e-2008: dois carros, a mesma base elétrica
O e-208 é um dos 100% elétricos mais compactos do mercado. A plataforma multienergias desenvolvida pela PSA, que também é utilizada nas versões elétricas dos novos Corsa e DS 3, permite aproveitar todos os milímetros disponíveis. O que é mais visível no e-208, um carro compacto e bem mais baixo do que estamos habituados a ver em elétricos. Sobretudo naqueles que, como é o caso, partilham a plataforma com as versões com motor a combustão.
Esta reduzida altura reforça ainda mais o efeito de baixo centro de gravidade a que estamos habituados nos elétricos. Resultado, o e-208 é um carro bem agarrado à estrada, que transmite confiança mesmo numa condução mais agressiva. O que somos convidados a fazer graças ao forte binário e ao design da versão GT que testámos. Não se pode dizer que o e-208 tenha uma aceleração tão “explosiva” quanto outros elétricos, mas é, sem dúvida, um carro que envolve o condutor.
Quanto à autonomia, não nos parece difícil que chegue aos 340 km indicados pelo WLTP em condução mista em ritmo de passeio. Até porque acabámos o teste com uma média um pouco acima dos 14 kWh/100 km, apesar de alguns abusos. Se fizermos as contas, para um consumo de 14 kWh/100 km e 47,5 kWh de capacidade útil da (total de 50 kWh), o resultado é, precisamente, 339 km. A velocidades de autoestrada prevemos uma autonomia algures entre os 250 e os 300 km.
Quanto ao carregamento, os elétricos da Peugeot utilizam a ficha padrão europeia CCS, que tanto pode ser usada para carregamentos em corrente alternada (lentos e normais), porque inclui a componente Tipo 2, como para carregamento rápido. A velocidade de carregamento varia entre 12 km/h a usar uma tomada doméstica comum (10 amperes) até aos 440 km/h a usar um Posto de Carregamento Rápido de 100 kW (por enquanto, os Postos de Carregamento Rápido da rede Mobi.E estão limitadas a 50 kW). Em casa e em carregadores ditos normais (corrente alternada), o carregador interno standard suporta potências até 7,2 kW (38 km/h), mas é possível optar por um carregador interno de 11 KW (até 56 km/h). Esta última opção é especialmente útil para a nova geração de postos de carregamento normal que têm sido instalados em Portugal. Para quem prevê carregar muitas vezes neste tipo de carregadores, os €300 pedidos por este opcional são inteiramente justificados.
Para quem não está muito por dentro das variações dos carregamentos de veículos elétricos, basicamente podemos dizer que estes carros são capazes de carregar em qualquer posto da rede pública portuguesa.
Ainda no que concerne ao sistema elétrico, a refrigeração líquida dá garantias extra em termos de longevidade da bateria porque deverá permitir reduzir a degradação da autonomia, mais ainda em utilização mais intensiva (carregamentos rápidos e condução mais desportiva).
O tempo que tivemos para conduzir o e-2008 foi muito menor e o carro usado estava numa fase de desenvolvimento menos avançada, o que era visível na falta de informações credíveis sobre o consumo no computador de bordo. O que significa que não temos dados suficientes para analisar a autonomia. Ainda assim, considerando que este SUV utiliza a mesma bateria e o mesmo motor do e-208, é fácil antecipar consumos um pouco mais elevados já que se trata de um carro maior e mais pesado. Neste aspeto, é importante referir que estávamos à espera de que o 2008 fosse bem mais pequeno por dentro do que é. Em termos de habitabilidade, não é muito diferente do irmão mais crescido 3008. A maior diferença está na mala, essa sim significativamente mais pequena no 2008 do que no 3008.
Quanto ao desempenho, e ressalvando que os responsáveis da Peugeot indicaram que o carro ainda pode sofrer algumas evoluções, há semelhanças óbvias com o e-208, embora, naturalmente, o e-2008 seja menos ágil e um pouco menos rápido nas acelerações. Ainda assim, é um carro divertido de conduzir.
Conectados
A envolvência em termos de condução já referida também é visível na tecnologia a bordo e na disposição dos comandos. O cockpit digital “3D” já conhecido de outros modelos inclui um ecrã central tátil ligeiramente virado para o condutor e um painel de instrumentos digital. Este último utiliza um sistema de dois ecrãs sobrepostos que criam um efeito 3D estilo holograma. Consideramos mais vistoso que eficiente, já que não nos pareceu trazer mais-valias reais em termos de informação ao condutor. Pela positiva, é muito configurável e podemos, por exemplo, ver os mapas ou controlar o rádio através deste ecrã, libertando o ecrã central para outras funcionalidades. Neste há algumas apps, capacidade de partilha do Wi-Fi a bordo e suporte para Apple CarPlay e Android Auto. Há ainda um sistema de navegação de origem TomTom com trânsito em tempo real. Atenção que estes elétricos são carros conectados, com ligação à Internet, funcionalidade que também pode ser usada pela app para smartphones para acesso remoto a informação do carro, controlo da climatização e carregamento e até planeamento de navegação considerando os postos de carregamento disponíveis ao longo da viagem.
Podemos planear a viagem em casa e depois enviar a rota para o sistema do carro. A interface é relativamente simples, mas o grafismo não é especialmente apelativo e a resolução do ecrã é apenas satisfatória.
A Peugeot salienta que estas versões elétricas não fazem concessões relativamente às versões com motores térmicos. Ou seja, têm o mesmo espaço a bordo. Não é exatamente assim, já que a parte inferior da mala é um pouco mais pequena (não há o espaço para o pneu suplente disponível nas versões com motor térmico) e nota-se um pouco menos de altura para arrumar os pés dos passageiros de trás por baixo dos bancos da frente. E também podemos analisar esta opção de plataforma única de outra forma: por não terem sido criados para serem exclusivamente elétricos, estes carros não aproveitam ao máximo as potencialidades que esta tecnologia traz em termos de arquitetura. Por exemplo, o espaço interior poderia ser maior se a frente do carro não tivesse sido desenhada também para albergar motores a gasolina ou gasóleo.
O preço base do e-208 é de €32.150 para a versão Active (€37.650 para a versão mais cara, a GT). Um valor elevado para o segmento dos carros compactos, mas em linha do que seria de esperar de um elétrico com bateria de 50 kWh – preço muito próximo do Renault ZOE com bateria idêntica. É importante salientar que devemos fazer as contas ao custo total de propriedade e não, apenas, ao custo de aquisição. E para muitos utilizadores, este e-208 acaba por ficar mais económico que o 208 com motor de combustão equivalente ao fim de alguns anos de utilização. Além das poupanças em combustível, há que considerar os custos de manutenção muito mais baixos e a isenção/redução de algumas taxas, como o imposto de circulação e estacionamentos em algumas cidades. O que muitos portugueses parecem estar a perceber já que, segundo a Peugeot, 18% das encomendas nacionais do novo 208 são para o e-208.
Quanto ao e-2008, o acréscimo de preço é de cerca de €4000, começando nos €36.600 para a versão Active (a versão mais cara é a GT, com um preço €43.450).
O mais eficiente dos 508
O 508 híbrido plug-in está disponível tanto na versão berlina como na versão carrinha (SW). Em temos de design, o 508 já é bem conhecido. Uma proposta que dá prioridade ao estilo relativamente à funcionalidade. De um outro modo, este carro está longe de ser o mais espaçoso da classe, mas tem conquistado muitos condutores com as linhas desportivas. A boa notícia é que a versão híbrida não afetou o espaço disponível, mais uma demonstração que os engenheiros da Peugeot fizeram um bom trabalho no desenvolvimento das novas plataformas que permitem diferentes tipos de motorizações.
No interior, o mesmo cockpit 3D, com o tal painel de instrumentos digital personalizável e rico em informação. E com o tal ecrã central tátil que não é o melhor exemplo em termos de interface – muitas vezes temos de dar muitos toques para chegar a funções comuns e não há assim tanto para fazer neste sistema de infoentretenimento como aparenta à primeira vista. Os botões tipo piano funcionam como atalho para as funções mais importantes, mas não há grande hierarquia na forma como são disponibilizados. Um destes botões leva-nos para um ecrã específico desta versão híbrida, onde temos acesso a muitas informações sobre o funcionamento do sistema híbrido, incluindo gráficos sobre consumos de energia elétrica e combustível.
Há diferentes modos de condução, incluindo um 100% elétrico e um modo de maior potência que aproveita ao máximo os dois motores (elétrico e gasolina). Este último modo torna o carro divertido de conduzir, embora os consumos passam a ser pouco condizentes com a filosofia dos híbridos. Em modo elétrico, a autonomia pode ultrapassar um pouco os 50 km se conduzirmos de modo eficiente. O suficiente para muitas viagens diárias sem gasolina e para manter o consumo médio em valores abaixo dos ou 2 ou 3 litros aos 100 km quando a bateria é carregada diariamente e só se faz viagens muito longas apenas algumas vezes por mês.
O preço base de cerca de €46500 (cerca de €48000 para a versão SW) não é, propriamente, baixo. Mas as vantagens fiscais e o baixo consumo tornam o custo total de propriedade mais competitivo do que aparenta à primeira vista. Mais ainda para as empresas, o que torna o 508 Hybrid uma proposta tentadora para frotas e um concorrente para, por exemplo, o VW Passat GTE.
O 3008 mais poderoso… e poupado
O Hybrid4 é o mais potente 3008 e o que acelera mais rapidamente: 5,9 segundos dos 0 aos 100 km/h. São 300 cavalos graças à conjugação de três motores: gasolina e dois elétricos (um para o eixo da frente e outro para o eixo de trás). O que significa que este carro tem tração às quatro. Ficámos verdadeiramente bem impressionados com o comportamento dinâmico deste SUV. Tivemos a oportunidade de experimentá-lo em condições difíceis, incluindo em percursos fora de estrada com obstáculos difíceis para um SUV “domesticado” e em diferentes tipos de piso. O controlo de tração e dois eixos mostrou-se muito apurado. O que se notou, por exemplo, quando andámos em ritmos pouco recomendáveis em estradas com gravilha e outras com zonas onde as rodas de um lado passavam por terra batida e as rodas do outro lado estavam sobre o alcatrão. A forma “transparente para o utilizador” como o sistema divide o binário e potências pelos eixos pareceu-nos muito eficiente e transmite muita segurança ao conduzir.
Numa primeira apreciação global, o 3008 convence muito na dinâmica e mostrou ter capacidades fora de estrada muito acima do que estamos habituados neste tipo de carro.
Gostámos também do consumo. Mesmo abusando muito do modo desportivo, o que entrega mais potência, acabámos os cerca de 100 km de testes com uma média inferior aos 4 l/100 km e ainda alguma bateria para usar. Segundo dados da marca, numa condução normal é possível fazer mais de 50 km em modo 100% elétrico o que faz baixar o consumo médio para apenas 1,2 l/100 km ao que equivale emissões de CO2 de 28 gramas/km. A bateria de 13,2 kWh de capacidade pode ser totalmente carregada em menos de duas horas quando a usar um carregador opcional de 7,4 kW. Numa tomada normal, o carregamento completo demora cerca de 6 horas.
No campo da tecnologia, neste 3008 podemos encontrar, essencialmente, o mesmo cockpit digital 3D já mencionado para os outros modelos, incluindo suporte para Apple CarPlay e Android Auto, bem como possibilidade de acesso remoto via app.
Relativamente aos 3008 com motor de combustão, repete-se o que dissemos relativamente à versão elétrica do 208: a mala perde um pouco de espaço de arrumação no “andar” que fica por baixo do tapete. O Hybrid4 é o mais caro da gama, até porque só vai estar disponível nas versões GT Line e GT. O preço de entrada é um pouco acima dos 52 mil euros. No entanto, lá mais para meados do ano vão surgir versões híbridas do 3008 mais acessíveis, com preço base de cerca de 45 mil euros e com duas grandes diferenças: apenas tração frontal e menos potência (225 cavalos).