Rolf Halden, diretor de um centro especializado na Universidade do Arizona, defende que é possível “testar centenas de milhares de pessoas com uma única amostra” de águas de esgoto. Este cientista tem trabalhado há anos na análise das águas residuais provenientes e detetado padrões de consumo de substâncias como cafeína e opióides e explica que “obtemos informações que não podem ser produzidas de outra forma”. O especialista sublinha que estas análises permitem detetar o novo coronavírus mesmo nas suas fases iniciais, quando os pacientes estão ainda assintomáticos, fase em que o vírus é mais contagioso. O estudo das águas provenientes das casas e outras instalações permite ganhar tempo, ao oferecer resultados mesmo antes de se manifestarem sintomas.
“Podemos tirar uma amosta na estação de tratamento, trazê-la para o laboratório e ter os resultados em média em 24 horas. Seremos capazes de fazer testes mais rapidamente e colocar os nossos recursos exatamente onde são necessários”, detalha o especialista ouvido pela Popular Science.
A prática já está em curso, por parte da equipa de Halden, há anos e já serviu para detetar vestígios de medicamentos ou hormonas, que permitem extrapolar que a população possa estar doente ou ansiosa, e até pesticidas ou outros químicos nocivos que podem levar a outras doenças. Agora com a Covid-19, esta equipa pretende ajudar a detetar focos de infeção, dependendo do local onde for feita a colheita, e ganhar tempo na deteção precoce da doença, de forma a canalizar meios de apoio e sistemas de prevenção, como medidas de confinamento mais restritas, se for necessário, como forma de conter a doença. Depois de ter sido restrito geograficamente o foco, os especialistas de saúde podem dirigir os testes à Covid-19 naquele local e monitorizar os contactos das pessoas.
A abordagem já está a ser aplicada na região de Tempe, perto da Universidade onde trabalha esta equipa, mas também noutros estados dos EUA, na Holanda, na Austrália e em França. Os cientistas procuram detetar fragmentos de RNA do vírus e concluem que, quanto mais material genético do vírus aparece nas amostras, mais pessoas da região estão infetadas.
Os peritos têm em consideração a temperatura e outras condições atmosféricas para perceber como estas poderão ter impacto nas amostras e nas suas extrapolações. Em condições teóricas, é possível detetar o novo coronavírus mesmo que este esteja presente nos excrementos de apenas uma pessoa no meio dos de 100 a dois milhões de outras pessoas.
Nos EUA, analisar diariamente, durante alguns dias, os dados fecais das 15 mil estações de tratamento iria cobrir cerca de 70% da população e custaria, no total, 225 mil dólares. Em contraste, fazer testes personalizados à Covid-19 a 330 milhões de americanos custaria 3,5 mil milhões de dólares.
O objetivo não é usar esta abordagem para substituir por completo os testes individuais, mas sim tirar partido da capacidade de amostragem e alcance alargado que esta permite e focar os esforços dos profissionais de saúde.