Quando Inês Lynce entrou no Técnico, em 1993, para a licenciatura em Engenharia Informática, havia uma rapariga para cada cinco rapazes. Passados mais de vinte anos a taxa mantém-se nos vinte por cento. “Nada mudou!”, observa a especialista em Inteligência Artificial que assumiu hoje a co-direção do Programa Carnegie Mellon Portugal, sendo a primeira mulher no cargo, desde o lançamento da parceria em 2006.
A disparidade de género em áreas como a Informática, a programação, IA é um problema conhecido, reconhecido e assinalado há já vários anos, quer pela academia, quer pela indústria, com direito a entrada na Wikipedia e tudo. Várias iniciativas têm tentado combatê-la, atraindo raparigas para estas disciplinas em que claramente a diversidade traz vantagens objetivas e mensuráveis. Sem grande sucesso até agora, reconhece a professora no Instituto Superior Técnico. Uma realidade que Inês se esforça por mudar. “Pensamos que uma das razões que leva as estudantes a não escolher estas áreas é a falta de exemplos, de role models, que mostrem que este também pode ser um campo para elas. Espero que no momento da candidatura [à universidade] não se sintam inibidas pelo facto de haver poucas mulheres”, sublinha. Que estando indecisa entre Engenharia Biológica e Informática a escolha não recaia sobre a primeira por haver poucas raparigas na segunda, concretiza Inês Lynce. Curiosamente, a Carnegie Mellon University (CMU) foi uma das primeiras universidades do mundo a conseguir dar a volta à questão, tendo atingido atualmente a paridade nos cursos de Informática. “Neste momento, há 50% de raparigas, mas isto é uma exceção”, admite Inês que partilha a direção do programa com Nuno Nunes, também do Técnico. Estudos feitos pela CMU mostram que o Cabo das Tormentas se passa até ser atingida a quota dos trinta por cento. A partir daí, o recrutamento de alunas decorre naturalmente, sem esforço.
“É muito comum participar em reuniões em que sou a única mulher, o que pode ter uma influência negativa. Não é uma questão de as mulheres fazerem melhor, mas fazem, certamente, diferente e isto as empresas já perceberam há muito tempo, estando à frente da academia no esforço de combater a disparidade.” E o que acaba por acontecer é que as poucas mulheres do setor acabam por ficar sobrecarregadas. “Gostava de ter menos funções de gestão”, admite a professora que tem estado à frente do Inesc-ID.
Neste momento, o programa CMU Portugal envolve 15 empresas, ditas afiliadas, que vão da Altice e da NOS à Feedzai ou Tekever. Em 15 anos de atividade, envolveu onze departamentos da Universidade Carnegie Mellon, mobilizou mais de 900 estudantes, 400 investigadores e docentes dos dois lados do Atlântico, quase 150 empresas parceiras, apoiou 74 projetos colaborativos de investigação, atraiu dezenas de milhões de euros de cofinanciamento privado. “É uma boa solução para os alunos que querem ter uma experiência internacional mas não querem abandonar completamente o País”, nota.
Inês Lynce regozija-se também com a valorização da formação avançada no mercado de trabalho. “Atualmente, um aluno doutorado já é considerado no momento da contratação como alguém com experiência. Há uns anos não era assim”, admite. “Nesta área, a inovação faz toda a diferença, é preciso surpreender constantemente.”