Durante os últimos dois anos, essencialmente fruto dos impactos da pandemia, assistimos a uma evolução tecnológica no setor segurador, para fazer face aos desafios deste novo contexto. Para dar resposta às necessidades que surgiram neste período, as seguradoras começaram a dar especial atenção à organização da informação sobre clientes e a repensar produtos, adaptando-os a uma nova realidade de vida e hábitos de consumo com efeitos disruptivos, principalmente nos canais de distribuição.
Por tudo isto, atualmente, já conseguimos identificar claras mudanças na forma como está organizada a cadeia de valor de seguros. A atividade passou de uma organização em silos para um modelo de plataforma aberta, focado na prevenção e em atividades de previsão, tendo agora mais capacidade de adaptação a um contexto imprevisível, volátil e incerto, que decorre do surgimento de novos comportamentos do consumidor, mas também de ciclos de inovação rápida dos competidores.
Esta alteração de paradigma impôs uma redefinição estratégica da cadeia de valor, na medida em que se observa hoje uma multiplicação dos pontos de contacto das seguradoras, o que levou ao aumento das interações com os clientes, por via da evolução dos canais de distribuição. Com tudo isto, as companhias têm agora mais capacidade para conhecer os clientes e adequar a sua oferta em função dos seus comportamentos, necessidades e preferências. Para que tal aconteça é necessário conjugar várias ações: alavancar a adoção tecnológica, promover o estabelecimento de alianças e parcerias, designadamente com insurtechs, que podem permitir às organizações tradicionais aumentar a eficiência, reduzir o time-to-market e melhorar substancialmente a experiência do cliente, ao longo da sua jornada de relação com a instituição.
Nas circunstâncias atuais, pode até considerar-se que a cadeia de valor se encontra fragmentada, na medida em que os processos tradicionais de product design, marketing, distribuição, subscrição, gestão de apólice e de gestão de sinistros terão de ser substituídos por processos mais interativos e circulares, liderados pelos dados dos clientes e pela verificação de comportamentos e necessidades.
Os processos interativos consistem fundamentalmente em criar mecanismos de comunicação permanente entre as seguradoras e os segurados, que permitam a ambas as partes adequar o mais possível as circunstâncias à relação em cada momento. Daí que estejam a surgir apostas das seguradoras nas áreas da promoção da saúde e bem-estar, nomeadamente, com a introdução de modelos preditivos, que permitem exatamente adequar os produtos e serviços à circunstância de cada cliente.
Também no marketing e distribuição se verificam novidades: para além da adoção de estratégias omnincanal e da simplificação de produtos, assiste-se igualmente à disponibilização de serviços, que vão além dos seguros (beyond insurance). Para dar alguns exemplos, posso citar insurtechs que, na subscrição e gestão de apólice, oferecem aos clientes modalidades de pagamento mediante utilização (pay-as-you-go insurance), o acesso a medicinas alternativas, ou plataformas conectadas a veículos para controlo do risco de condução, entre outras.
Em resumo, os últimos anos motivaram uma evolução do setor segurador e, por isso, as organizações têm de se adaptar para poderem acompanhar o atual contexto. Para além da aposta em novos modelos de relação com os clientes, devem estar atentas aos novos agentes do mercado, explorar parcerias ou até ponderar a entrada em negócios paralelos aos seguros, que lhes permitam aproximar-se ainda mais dos clientes, servindo-os de uma forma mais holística. Afinal, da pandemia emergiu uma nova cadeia de valor, que impõe uma reorganização dos serviços e das organizações seguradoras.