Isabel dos Santos construiu, desde 2005, um império em Portugal que está agora a desmoronar-se rapidamente após as revelações do Luanda Leaks, no passado fim de semana. A filha do antigo presidente angolano já colocou alguns ativos à venda devido à pressão, mas ainda conserva os investimentos mais avultados em Portugal: as participações na Galp e na NOS. No entanto, a sua influência nestas empresas é cada vez mais reduzida.
De saída do EuroBic
As revelações feitas pelo consórcio internacional de jornalistas apontaram o EuroBic como o banco que facilitaria os esquemas financeiros de Isabel dos Santos. Entre as alegações estão a de que foi feita uma transferência de 57,3 milhões de euros da conta da Sonangol para uma empresa no Dubai que seria detida por pessoas de confiança da filha do antigo presidente de Angola, horas depois de Isabel dos Santos ter sido exonerada da liderança daquela petrolífera estatal.
Logo no dia seguinte a estas revelações, o Banco de Portugal fez um comunicado a pedir mais informações ao banco liderado por Teixeira dos Santos sobre a forma como cumpriu com as regras em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo. O supervisor assegurou que estas informações seriam tidas em conta na avaliação da idoneidade de acionistas e administradores.
Depois disso, o EuroBic emitiu um comunicado a indicar que “a Eng.ª Isabel dos Santos tomou a decisão de saída da estrutura acionista do EuroBic”. A empresária detém 42,5% desse banco. O outro grande acionista é Fernando Teles, com 37,5%. O banco viria semanas mais tarde a chegar a acordo com o espanhol Abanca para a venda de 95% do seu capital.
O EuroBic tinha iniciado atividade em Portugal em 2008, três anos depois da fundação do BIC Angola que se constituiu com uma participação de 25% de Isabel dos Santos. A empresária reforçou a posição na instituição em 2014, comprando parte da posição de Américo Amorim.
Venda da posição na Efacec
Foi um dos investimentos mais emblemáticos de Isabel dos Santos em Portugal, mas também neste caso a filha de José Eduardo Santos está de saída. “A Engª Isabel dos Santos informou o Conselho de Administração que decidiu sair da estrutura acionista da Efacec Power Solutions, com efeitos definitivos”, informou esta sexta-feira em comunicado a empresa liderada por Ângelo Ramalho. Na sequência dessa decisão, Mário Leite da Silva e Jorge Brito Pereira, que representavam Isabel dos Santos na empresa na presidência do conselho de administração e da assembleia geral também renunciaram ao cargo.
Isabel dos Santos tinha entrado em 2015 no capital da empresa portuguesa por 200 milhões de euros. Detém 67,2% da empresa, tendo comprado parte das posições do Grupo Mello e da Têxtil Manuel Gonçalves na empresa.
Sem representação na NOS
Isabel dos Santos tem também uma presença relevante no setor português de telecomunicações. Detém, a meias com a Sonaecom, a Zopt, uma entidade que é dona de 52,14% da NOS. Os administradores de confiança da empresária apresentaram a sua demissão após o conselho de administração os ter chamado, segundo o Jornal de Negócios, para serem ouvidos pelas comissão de governance e ética. A operadora comunicou na passada quinta-feira que o “Dr. Jorge de Brito Pereira, Dr. Mário Filipe Moreira Leite da Silva e Dra. Paula Cristina Neves Oliveira apresentaram hoje, ao Conselho Fiscal, as respetivas renúncias aos cargos de membros não executivos do Conselho de Administração desta sociedade”.
Apesar dessas saídas e da venda das participações noutras empresas, até ao momento não se sabe o destino que terá a participação de Isabel dos Santos na Zopt. A Sonae afirmou estar a acompanhar “com atenção e preocupação” as notícias referentes ao designado “Luanda Leaks”. E os analistas do CaixaBank/BPI afirmaram, citados pelo Jornal de Negócios, que a Sonae poderá “vir a repensar a sua parceria com Isabel dos Santos na Zopt, o que pode levar a algumas alterações na gestão da empresa”.
A empresária começou a construir posição na operadora em 2009: comprou ações à Caixa Geral de Depósitos e à Cinveste com recurso a um empréstimo de 125 milhões de euros concedido pelo banco público, segundo informação veiculada pelo Correio da Manhã no passado mês de maio. Na reação, Isabel dos Santos disse que 60% do empréstimo tinha sido amortizado e que não havia prestações em atraso, e que as ações que tem na NOS estão dadas como garantia.
Após este apoio do banco público, a empresária beneficiou de empréstimos da Unitel para reforçar a posição em 2012, tendo em vista a fusão da então Zon com a Optimus, avançava o Público no final de 2017. No total, o investimento na NOS terá rondado os 310 milhões de euros, de acordo com estimativas da VISÃO com base nos valores médios das cotações da empresa nessa fase. O valor desse investimento mais do que duplicou, ao qual se juntam mais 190 milhões de euros recebidos em dividendos.
Saída da Sonangol tirou influência na Galp
Outra das jóias da coroa de Isabel dos Santos em Portugal é a Galp. A empresária é dona de 40% da Esperaza Holding, entidade que detém 45% da Amorim Energia que, por sua vez, é dona de 33,34% da petrolífera portuguesa. Simplificando, a filha do antigo presidente tem uma participação indireta de cerca de 6% na cotada portuguesa. Mas o poder da empresária angolana na Galp já foi maior. Perdeu influência após ser exonerada da Sonangol no final de 2017. A petrolífera estatal angolana (que detém os outros 60% da Esperaza) aliou-se com a família Amorim para definirem a estratégia do grupo e retirarem poder de decisão a Isabel dos Santos.
As suspeitas sobre a forma como Isabel dos Santos foi financiada pela Sonangol para a constituição da Esperaza para o investimento na Galp em 2005 foi um dos motivos que originaram o arresto de bens da empresária em Angola. As alegações são de que tenha beneficiado de um empréstimo da petrolífera que não foi devolvido nos termos acordados.
Os 40% de Isabel dos Santos na Esperaza valem, aos preços de mercado recentes, mais de 780 milhões e deram direito a dividendos de 240 milhões de euros. Tendo em conta as avaliações comunicadas aquando da entrada da Amorim Energia no capital da Galp, a Esperaza terá investido 710 milhões para ter uma participação indireta na petrolífera portuguesa. O quinhão que seria da responsabilidade de Isabel dos Santos seria de quase 285 milhões de euros. Entre dividendos e valorização das ações, esse dinheiro mais do que triplicou.
Artigo atualizado a 11 de fevereiro com informação sobre acordo de compra de 95% do EuroBic pelo Abanca.