Quais são hoje as principais necessidades das empresas de base industrial no País e como é que o portefólio do Novo Banco se posiciona para lhes responder?
Mário Gouveia (M.G.) – Convém começar por referir que as empresas industriais são das que mais tiveram de se adaptar nos últimos anos para sobreviver à tendência de deslocalização, que todos conhecemos, para geografias mais periféricas e com fatores de produção mais baratos. Tiveram de colocar a inovação constante no topo das suas prioridades e encurtar os seus time to market, para poderem competir a nível global com os melhores. De uma maneira geral, as empresas de base industrial exigem dois grandes tipos de soluções, como sejam a vertente de gestão de tesouraria e otimização de margens e o apoio sustentado ao investimento, em sentido lato.
Em boa verdade, na indústria, ciclos produtivos exigentes em necessidades de fundo de maneio obrigam a um bom planeamento financeiro e soluções financeiras de curto prazo, a que o Novo Banco procura responder quer com as tradicionais soluções de crédito conta corrente, factoring ou confirming, quer com inovações como o Express Bill (uma marca NB). Neste capítulo, destacaria ainda a mais valia do Banco nos produtos de negócio internacional Trade Finance, pois dispomos de um conjunto alargado de soluções de apoio ao comércio internacional. É algo extremamente importante, não só para quem dá os primeiros passos nos mercados externos, como também para quem simplesmente procurar consolidar ou alargar a sua base de mercados. A experiência do Novo Banco neste campo, alicerçada na nossa quota de mercado de 19% no Trade Finance, constitui-se uma mais valia para uma indústria crescentemente exportadora.
Acrescentar que esta constante competitividade nos mercados exige às organizações mais agilidade, numa era de interação entre o digital e o real, com investimentos em tecnologia de ponta, para conectar tudo e todos. O contínuo investimento nas mais diversas vertentes (instalações, equipamentos produtivos, redes digitais. etc.) é assim incontornável. O Novo Banco consegue responder com soluções de médio longo prazo, que vão desde o leasing às diferentes linhas de crédito protocoladas onde temos tido um papel bastante ativo. Mas temos também consciência que as necessidades e expectativas das empresas de cariz industrial junto da banca vão hoje para além da satisfação destas necessidades creditícias. Exigem da banca processos mais digitais, simples, intuitivos e eficientes, com equipas mais preparadas e competentes, capazes de entender os diferentes modelos de negócio em cada setor / cliente. Como resposta a estes desafios, o reconhecimento das nossas plataformas tecnológicas com capacidades de self-service de referência, relacionamentos omnicanal inteligentes e integrados, que permitem uma experiência de cliente inovadora e distintiva nos vários pontos de contacto com o banco. Aqui, com soluções personalizadas, simples, cómodas e geradoras de valor, não podendo deixar de salientar que o Novo Banco foi distinguido, pelo segundo ano consecutivo, como Best Integrated Corporate Banking Site in Western Europe, no âmbito dos prémios “2020 World’s Best Digital Bank Awards”, pela prestigiada revista Global Finance.
Os nossos clientes exigem uma banca mais capaz de apresentar propostas de valor ao seu negócio e que resultem da combinação de duas realidades: a presencial, de proximidade e conhecimento do cliente, e a da comodidade com processos digitais eficazes. O Novo Banco corresponde neste sentido com uma rede muito alargada de gestores presentes nos balcões, com formação bastante especializada e contínua, que desempenham um papel de parceria efetiva e com valor acrescentado reconhecido pelos nossos clientes empresa.
Que importância pode ter a estratégia de reindustrialização da Europa e as prioridades do plano de recuperação de Portugal na próxima década para os negócios das empresas da Indústria no País?
Miguel Ferreira (M.F.) – O fenómeno da deslocalização da indústria europeia para outras geografias gerou alertas que estiveram agora na base da estratégia atual de reindustrialização da Europa, pela necessidade de trazer de volta a produção industrial para dentro da Europa.
O surgimento da pandemia da Covid-19 veio, adicionalmente, chamar também à atenção para a necessidade imperiosa de, face a situações de crise (de que esta pandemia é apenas um exemplo, entre outros que devem ser tidos em conta), se ter a capacidade para produzir produtos essenciais, de forma rápida, segura e geograficamente próxima.
Assim, a estratégia da reindustrialização da Europa, e mesmo a atual situação pandémica, deve ser considerada uma oportunidade de crescimento da indústria nacional, desenvolvendo, não só os produtos onde tradicionalmente já atuamos e somos competitivos, mas também clusters que são atualmente deficitários na realidade europeia, apostando inclusive em novos produtos, sem esquecer a importância que a Indústria 4.0 e a digitalização podem trazer para dentro das nossas empresas e aumentar a sua competitividade.
Isto, aliás, é algo que vem sendo defendido por vários economistas e que António Costa e Silva teve também em conta, na elaboração da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação 2020/2030”, ao incluir a reconversão digital e a reindustrialização do país nos dez eixos estratégicos do documento.
Como estão as empresas portuguesas a adotar a agenda da Indústria 4.0 e como é que isso já se reflete na sua competitividade internacional?
M.G. – A sustentabilidade das empresas a competir nos mercados internacionais só será possível se não ficarem de parte desta quarta revolução industrial.
Ao contrário das revoluções industriais anteriores, que se focavam principalmente nos processos produtivos, a 4.0 tem a capacidade de influenciar todo o ecossistema da empresa, com implicações com todos os seus stakeholders.
Temos confirmado que diferentes empresas de setores distintos estão já a trabalhar uma agenda para a Indústria 4.0 (desde comércio e serviços, passando pela indústria e também pelo setor primário). De forma geral tem-se assistido a um intensificar de projetos de investimento no domínio do alcance deste conceito. Investimentos que em regra têm o padrão de visar o reforço da competitividade do negócio, sejam pela via de uma maior eficiência (redução de custos e falhas nos processos) com recurso a equipamentos mais capazes e automatizados, seja com o propósito de dar mais escala ao negócio (mais mercado, melhor mercado, maior globalidade), ou também do aumento de qualificações do capital humano.
Temos assistido a investimentos em formação de equipas vocacionados para as TICs (ferramentas/software), na aquisição de competências no marketing digital, no desenvolvimento de soluções de inteligência artificial, na aquisição de máquinas e equipamentos mais inteligentes, que privilegiam a conectividade, com incorporação da chamada ”internet das coisas”. Aposta-se em novos canais de distribuição online (criação de soluções e-commerce por vezes em complemento a uma rede física de distribuição) o que no atual contexto pandémico se viu reforçado. Investe-se em maior capacidade de computação, de gestão e armazenamento de informação/dados, de estudo e previsão de comportamentos de consumos.
Em suma, a Indústria 4.0 vem sem dúvida valorizar e potenciar os negócios das empresas. Traduz um caminho de processos mais digitais, de maior conetividade e interatividade, uma maior ligação do digital com o real. Num contexto globalizado como aquele em que vivemos, é determinante. Ainda verificamos assimetrias quer na velocidade, quer na volumetria dos investimentos mas naturalmente que as empresas que têm tido uma postura mais “agressiva”, não raramente as melhores capitalizadas, estarão mais próximas de terem sucesso na implementação das suas estratégias, retorno de rentabilidade e na adaptação a mercados cada vez mais voláteis. Num País periférico como o nosso, esta é uma excelente oportunidade de encurtar distâncias. As nossas empresas e empresários estão a ganhar competitividade internacional, visível na evolução e crescimento que as exportações nacionais tiveram nos últimos anos, dando provas que sabem aproveitar, para as suas organizações, os diversos instrumentos que a Indústria 4.0 veio colocar à disposição do mercado e que, com a nossa tradicional capacidade de adaptação, estão a conseguir capitalizar em diversas frentes do referido ecossistema.
A pandemia e a emergência das alterações climáticas impuseram novos desafios a este setor, em particular na adaptação para cumprimento com regras e metas ambientais. Isso materializa-se de alguma forma no tipo de investimentos que estas empresas industriais têm vindo a fazer nos últimos anos ou podem vir a fazer? Pode dar exemplos?
M.F. – Nos últimos anos, para as empresas nacionais atuarem nos mercados internacionais, já lhes eram exigidos diversos níveis de certificação internacional que as obrigaram a desenvolver sistemas cada vez mais eficientes e seguros para a produção e consequente comercialização dos seus produtos.
As metas ambientais apenas vieram introduzir novas necessidades de adaptação, não causando resistência por parte dos empresários, uma vez que em Portugal muito deste caminho já vinha sendo feito, nomeadamente, e por exemplo, na indústria agroalimentar, em que os produtos nacionais são reconhecidos pela qualidade da sua matéria prima (sabor genuíno) e por processos produtivos “tradicionais” que privilegiam baixas utilizações de produtos de conservação artificial.
Mesmo estando Portugal com bons desempenhos nalgumas áreas da temática ambiental, mais ligadas à produção industrial ou energia, onde as empresas já têm investido nos últimos anos, isso não nos deve impedir de ambicionar fazer mais pois acho que, em termos de perceção de valor por parte dos consumidores, vai ter impacto positivo na procura por esses produtos e fornecedores a médio e longo prazo.
Por outro lado, do ponto de vista de novas oportunidades de investimento, a reciclagem é um exemplo que pode e deve ser visto também como uma oportunidade de negócio, que tem ainda uma grande margem de progressão, a dois níveis: no envolvimento das famílias neste processo, mas simultaneamente como sendo parte de todo um processo que “recria” valor para a sociedade, materializado e concretizado economicamente por empresas especializadas neste negócio.
Entre as empresas clientes do Novo Banco nesta área da indústria, a preponderância de empresas PME Líder corresponde à relevância que o setor tem para a economia? Se não, o que pode ser feito para o reforçar?
M.G. – Sim, claramente. Entre as empresas clientes do Novo Banco esta preponderância reflete-se também nas PME Líder.
Tomando por base apenas as empresas que obtiveram, no ano transato, o estatuto PME Líder através do Novo Banco, 27% pertenciam ao sector da indústria, só ultrapassado pelo comércio, com 35%.
Mas se olharmos para a totalidade das empresas que foram PME Líder, considerando todos os bancos, através dos quais as candidaturas foram submetidas, registamos um peso da indústria semelhante. Ou seja, a indústria é de facto um setor de extrema importância para o tecido empresarial nacional, não só em termos de número de empresas, mas, acima de tudo, no valor acrescentado para a economia.
Se em vez de olharmos apenas para o número de empresas PME Líder industriais, que já vimos ser relevante, nos focarmos no seu volume de negócios, verificamos também que esta preponderância se mantém, representando cerca de 34% do total do volume de negócios de todas as empresas que foram PME Líder por nós, aproximando-se muito do valor do comércio (37%).
Como está a comportar-se este setor face aos constrangimentos de procura e quebra de cadeias de produção e distribuição trazidos pela atual crise pandémica? Nota-se, em alguns segmentos de atividade ou mercados em particular, sinais de recuperação? Quais?
M.F. – A indústria, como um todo, é um setor muito abrangente e composto por muitos subsetores que, em termos de consequências da pandemia, tiveram diferentes comportamentos.
Tivemos subsetores industriais que foram afetados de forma muito residual e nalguns casos até conseguiram aumentar as suas vendas. Falo sobretudo da indústria alimentar que – por ser uma atividade fundamental nas cadeias de fornecimentos alimentares – nunca parou. Por um lado, tinha de conseguir fornecer os seus clientes e os consumidores e, por outro, também teve de garantir a utilização dos produtos frescos, a transformar por parte dos seus fornecedores que, atuando na agricultura, não puderam interromper os ciclos de colheita previstos para cada cultura.
Estas empresas da indústria alimentar tiveram um papel fundamental pois foram verdadeiras âncoras do lado da procura, pelos consumidores, mas também, a montante, importantíssimas para a sobrevivência e sustentabilidade das empresas agrícolas.
As maiores preocupações a nível industrial centraram-se nas indústrias de bens transacionáveis que não eram (como a alimentação ou a saúde) bens essenciais e que tiveram a dificuldade adicional de estarem dependentes de clientes ou fornecedores internacionais com os quais não conseguiam concretizar as trocas comerciais. Aqui sim, tivemos algumas situações mais preocupantes mas que, felizmente estão maioritariamente controladas pois o Estado e a banca foram céleres em dotar a economia com linhas de crédito e moratórias de crédito que permitiram estabilizar as tesourarias das empresas.
Nestes subsetores mais afetados noto, no meu dia a dia com os nossos gestores de clientes, já claros sinais de recuperação, quer por via da abertura, ainda que de forma tímida e ponderada das economias mundiais ao exterior, quer por alguns exemplos de empresas que se conseguiram reinventar, produzindo produtos com mais procura nesta conjuntura. Exemplos clássicos e admiráveis, do ponto de vista da rapidez com que foram feitas as adaptações e colocado o produto no mercado, foram as áreas do têxtil, com a produção de máscaras certificadas e a área dos moldes, com a produção de viseiras.