Quando se chega à Charneca do Lumiar, só temos a certeza de que estamos no local certo porque o portão ostenta uma placa a dizer “Pato Rico”. Depois de insistirmos com o taxista que estávamos mesmo no sítio certo – “menina, eu não a vou deixar aqui sozinha!” –, lá conseguimos dizer “olá” a Beatriz Serrano, CEO da Pato Rico, idealista dos blusões Duffy, cujas insígnias nos recebem logo no corredor. “Hoje estamos numa posição que nunca esperei. Creio que somos líderes de mercado na hotelaria em Portugal”, diz-nos a responsável com uma energia contagiante, referindo-se às almofadas e edredões que dali saem para as camas dos turistas. “Concorro em qualidade e serviço pós-venda”, continua, depois de explicar que também faz enchimentos para várias marcas internacionais como a Dunhill, a Ralph Lauren ou a Moncler.
Foi assim que Beatriz Serrano fez a Pato Rico sobreviver nos últimos 20 anos, depois de a viragem do século ter acabado com as lojas de desporto e, consequentemente, terem dizimado as vendas dos famosos blusões Duffy, que nos anos 1980 eram tão desejados como umas calças Levi’s ou umas sapatilhas Converse (e Sanjo, claro!). Na altura, eram os casacos estilo “Michelin” que garantiam a maior parte da faturação da empresa, com dezenas de milhares de exemplares a serem vendidos em Portugal. O mercado global não era uma realidade, mas os tecidos vinham de Itália – porque em Portugal não havia uns que funcionassem com o enchimento de penas – e Beatriz vendia um produto de qualidade. Que ganhou também, claro, com o nome estrangeiro. “As pessoas acharam, durante anos, que a marca não era portuguesa. O que até dava jeito porque temos muito isso de achar que o que vem de fora é melhor”, diz, divertida.
Estamos a conversar no showroom da Pato Rico, entre roupa de cama, sofás, almofadas e, claro, blusões que vão desde os clássicos azul e verde-escuro até às mais recentes apostas: amarelo, cor de rosa, prateado, com padrões florais…
Em 2021, Beatriz Serrano sentiu – garante que toma muitas decisões por intuição – que era hora de fazer regressar os blusões que deram início à Pato Rico e pôs mãos à obra.
O desejo vinha de trás, mas nunca estavam reunidas as condições ideais para o fazer. Agora regressam com outros tecidos, outros modelos e outras cores, mas com a mesma garantia de qualidade, as mesmas penas portuguesas no enchimento e, claro, o mesmo pato de asas abertas, no peito ou na manga.
O logótipo foi mais estilizado para acompanhar a mudança dos tempos, mas “era impossível fazê-lo desaparecer”. Faz parte da marca, como algumas pessoas que ainda hoje trabalham na fábrica e assistem a este regresso com muita alegria. É o caso de Francisco, que desde 1979 acompanha a responsável da empresa nesta empreitada. O responsável pelas penas fala-nos de sorriso aberto entre o barulho da máquina que prepara as penas que acabaram de chegar: são cerca de 80 toneladas de pena por ano que a Pato Rico recebe, lava, trata, separa e utiliza para a sua produção.
Também Paula recorda o ano de 1992, quando chegou à fábrica. “É o meu braço-direito aqui”, ri Beatriz. As mãos rápidas das costureiras vão confirmando costuras, defeitos, tirando linhas e empilhando edredões, almofadas ou etiquetando produtos. É aqui que está o negócio. Os Duffy renascem mais por carinho e teimosia, assume Beatriz. A responsável garante que se conseguir vender 800 blusões este ano já ficará feliz, mas não nega que gostaria de ver os seus casacos a conquistar mercados dentro e fora de portas. Tem feito algumas parcerias com estilistas – como é o caso da designer e influenciadora Maria Guedes – e também com equipas desportivas como o Sporting Clube de Portugal, mas é nos modelos clássicos que os seus olhos param e sorriem mais.
Com a ajuda da designer Sandra Simões, que entrou na empresa em 2020, têm reinventado os Duffy para que se tornem mais apelativos no design e nos padrões sem perderem o conforto. “Não são casacos baratos, eu sei, mas duram uma vida inteira”, anui, “E é nesse segmento que eu quero estar.” Além de que qualquer consumidor pode sempre falar com a Pato Rico se precisar de alguma manutenção no seu Duffy, seja um fecho, parte do enchimento que se tenha perdido ou punhos que precisem de ser trocados. “E, por norma, este serviço de pós-venda é todo gratuito”, lembra. “Gostava de ver as pessoas com uma peça divertida, confortável e não fico triste se abranger apenas o mercado nacional”, garante. “Mas todos os nossos produtos vão estar posicionados num segmento médio-alto, porque mais vale vender pouco bem vendido do que vender muito mal vendido”, resume.
Por isso, vai continuar também a apostar em penas e tecidos de elevada qualidade e numa produção exigente e exclusiva que não pode deixar dúvida aos clientes: é para voltar. A trabalhar com vários mercados europeus, Beatriz Serrano garante que continua a divertir-se muitíssimo com o que faz, e que só por isso pode continuar à frente de uma empresa que já vai a caminho dos 50 anos de existência. É certo que já começa a preparar a passagem de testemunho, mas enquanto tiver saúde e energia, seguirá ao leme deste barco, que atualmente conta com 31 pessoas – 18 das quais são costureiras – e que promete continuar a fazer voar mais alto os patos deste País.