Na conferência anual da EXAME, dedicada ao tema “A economia na encruzilhada”, Luís Marques Mendes diz que é a política nacional que está na “encruzilhada”. O advogado, ex-líder do PSD e atual Conselheiro de Estado, destaca as virtudes das maiorias absolutas mas afirma que “esta veio no tempo errado” – “neste momento o Primeiro Ministro está farto do Governo e farto do país e os portugueses estão fartos do Primeiro Ministro”. Considera que António Costa “gostava de estar a preparar a saída para Bruxelas e está aqui amarrado a algo para o qual já não tem paciência”. Faz o paralelismo com o fim do Cavaquismo, “em que já ninguém tinha paciência para o Primeiro Ministro e o Primeiro Ministro já não tinha paciência para nenhum de nós”, o que, tal como hoje, gera uma situação ingovernável e conducente a “várias encruzilhadas”. Mas, num momento em que a solução governativa parece esgotada, falta “uma alternativa sólida e consistente”, o que o leva a descartar a possibilidade de eleições antecipadas.
Francisco Assis e Luís Marques Mendes apontaram esta quinta-feira críticas à direita e à esquerda. Para o Presidente do Conselho Económico e Social (CES) a vida política nacional polarizou-se excessivamente na última década e não imputa responsabilidades exclusivamente aos partidos dos extremos: “Estou a falar do PS e PSD”. Francisco Assis afirma que PS e PSD perderam a capacidade de falarem um com o outro sobre temas estruturantes para o país, com responsabilidades que, diz, são repartidas. “Acho até que, em relação a alguns temas, fazem um esforço para estarem em divergência, porque naturalmente estariam em convergência, o modelo de organização económica e social não é substancialmente diferente”.
Algo que o advogado classifica de taticismo político, em relação ao qual a vida política estará hoje subjugada. “Eu estive 13 anos dentro de Governos. E hoje uma das grandes diferenças face ao passado é que tudo se lê de forma tática, e para nada há um mínimo de responsabilidade e de visão estratégica”. Dá o exemplo da lei dos metadados, “que está a causar perturbações brutais e em que um destes dias, com a libertação de presos por causa dessa matéria, temos o populismo à direita ou à esquerda a fazer disso um caso”. E questiona: “Porque é que não se sentam 24 horas? PS e PSD pensam rigorosamente a mesma coisa sobre aquela matéria. É mudar uma alínea numa revisão constitucional. Não há coragem de afirmar a moderação no sentido da responsabilidade”.
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O painel, intitulado “Clube dos Moderados”, discutiu também a necessidade de moderação e de uma negociação construtiva, em detrimento do entricheiramento que se tem afirmado na vida pública.
Para Luís Marques Mendes não falta apenas coragem, falta competência na vida política nacional. “Hoje, a competência na vida política, seja do lado do poder, seja do lado da oposição, baixou brutalmente. Muita gente identifica isto como corrupção. Não é corrupção. A maioria dos dirigentes e responsáveis políticos não são corruptos. Mas uma parte grande são incompetentes”. E adianta: “Enquanto os partidos não se convencerem de que têm de introduzir critérios mais exigentes de qualificação dos seus dirigentes e políticos, isto é um drama”.

Competitividade, produtividade e falta de ambição
Num momento em que o discurso político-económico gira em torno do PRR, ambos os especialistas destacam que o cumprimento de prazos é importante, mas que sem eficiência estratégica na aplicação do dinheiro comunitário – e a discussão de temas estruturantes para o país – Portugal corre o risco de não sair da cauda da Europa. Até porque, lembram, “os outros países também têm PRR”. Francisco Assis alerta para o risco de “aquele dinheiro servir apenas como uma espécie de complemento do Orçamento do Estado”, sem que venha a introduzir mudanças estruturais na economia portuguesa, desde logo no interface entre o Estado e a iniciativa privada. “É um equilíbrio difícil e também por isso seria interessante se pelo menos os dois maiores partidos políticos portugueses fossem capazes de falar, como falaram algumas vezes. Já houve momentos na nossa democracia em que se fez a demonstração que era possível chegar a alguns entendimentos sem que os partidos perdessem a sua identidade e deixassem de se constituir em partidos alternativos” – dá o exemplo das revisões constitucionais de 1989 e 1992.
O mesmo responsável destaca ainda a necessidade de uma política de imigração em larga escala – essencial para acomodar os graves problemas demográficos do país – e alerta para a questão da produtividade, que diz ser um dos grandes enigmas do país. O país está hoje mais qualificado, com o aumento substancial de pessoas com grau de ensino superior, o que o leva a questionar: “Então como é que continuamos a manter um nível de produtividade que é 70% da média comunitária e cresce ao mesmo ritmo dos países mais ricos da Europa?”. Para o Presidente do CES, Portugal tem um problema ao nível da gestão e da organização, no Estado e no privado. “Há um problema sério ao nível de qualificações de gestão em Portugal”.
Um problema que a direita não quer discutir, diz Luís Marques Mendes, assim como a esquerda não quer olhar para o problema da competitividade fiscal. “Acho que ninguém vai querer discutir estes temas, que são estruturantes para a competitividade da nossa economia”. E termina com um repto: “Temos de ter ambição. E discutir os temas que são realmente importantes, e não apenas urgentes. Precisamos de acreditar mais em nós”.