O crescimento económico, a transição digital e a importância da Zona Franca da Madeira para atriar investimento direto estrangeiro foram os temas do debate do Fórum PME Global, realizado no Funchal
Apesar das polémicas recentes, a Zona Franca da Madeira acabou por se tornar um dos principais temas de conversa da última edição do Fórum PME Global, uma conferência organizada pela AGEAS Seguros em parceria com a Ordem dos Economistas.
Rogério Gouveia, secretário regional das Finanças da Madeira, defendeu que a região “tem sentido na pele” a instabilidade gerada por todos os problemas e contingências por que tem passado a Zona Franca da Madeira.
“A mim como titular da pasta das Finanças não me interessa apenas a receita fiscal gerada. O Centro Internacional de Negócios é um instrumento fundamental para a diversificação do nosso tecido económico. Tem um mecanismo que valoriza não só a Madeira, como todo o País. E tem um peso muito significativo na captação de empresas de setores muito específicos. Porque se não houvesse este regime especial, muitas delas não olhariam sequer para a Madeira, nem para Portugal”, defendeu o governante regional.
O titular da pasta das Finanças esclareceu que se criou uma imagem de que “todas as práticas neste centro são censuráveis, o que não corresponde à verdade”, justificando que “o escrutínio por que passam todas as entidades que estão licenciados na Zona Franca é superior ao de qualquer empresa que esteja no regime geral. Quer seja tributário, regulatório ou de licenciamento. Mas, infelizmente, o populismo tem prevalecido sobre a informação correta”.
O interregno de seis meses durante os quais não foi possível atribuir novas licenças foi, para Rogério Gouveia, “uma machadada significativa não só pelos efeitos imediatos que produziu devido às empresas que saíram, como o desafio enorme que temos pela frente para recuperar tudo o perdemos durante este período”.
Já para Jorge Veiga França, presidente da Associação Comercial e Industrial do Funchal, a Zona Franca “é uma arma fundamental para captar investimento estrangeiro, do qual o País precisa como pão para a boca. E 12% da totalidade do investimento direto estrangeiro em Portugal fez-se via este centro”.
O dirigente associativo realça ainda o facto de, com a transição digital e os novos métodos de teletrabalho, o centro é visto, por muitas das novas empresas, como um local para se fixarem em Portugal e, partir dali, fazerem o seu ponto de entrada para o resto da Europa.
Para Jorge Veiga França este é um tema fundamental pois, a transição digital e o cada vez maior recurso ao teletrabalho têm vindo a “reduzir a ultraperiferia da região”, um processo que já estava em curso mas que acabou por ser acelerado com a pandemia.
Mas este é um problema mais grave e que não se esgota apenas nos serviços tecnológicos. Segundo um estudo recente, em 2050 a Madeira deverá ter apenas 150 mil habitantes, o que agrava ainda mais os problemas de mão-de-obra já existentes. “Precisamos de pessoas com grande valia para poder acrescentar valor aos nossos produtos, defende Humberto Jardim, proprietário da empresa de vinhos Henriques & Henriques, que exporta cerca de 80% da sua produção. Para tal, o Governo regional está a desenvolver um projeto de atração de jovens casais para se radicarem na Madeira, de forma a contrariar a redução demográfica.
“Vivemos uma nova realidade que resulta da digitalização e também da pandemia. Apercebemo-nos que o trabalho remoto é possível. E, desta forma, podemos ir buscar talento a qualquer lado”, afirmou João Batalha, partner sales lead da Microsoft.
E reconhece que este fenómeno pode ter duas perspetivas interessantes para a região pois, por um lado, as empresas podem deslocar-se para a Madeira mantendo os mesmos recursos humanos e, por outro, as empresas madeirenses podem ir buscar talento fora da região sem a necessidade de eles estarem fisicamente na ilha.
Ainda em matéria de trasição digital, João Batalha aproveitou a sessão para alertar para a importância do processamento do que apelidou de “dados colossais que são gerados” todos os dias pelas empresas. “A questão que se coloca é que o que fazer com esses dados. Como é que os transformamos em conhecimento”, diz João Batalha.
Para o gestor, através da informação conseguida com a interpretação destes dados, “conseguimos chegar a resultados que não imaginavamos antes. O que nos permite ter uma nova visão sobre a realidade. Para as empresas, a análise de dados é não só um fator de inovação como também de diferenciação, fundamental para o seu crescimento e para acrescentar valor”.
Crescer nas dificuldades
A sessão começou com uma apresentação da conjuntura internacional por parte do bastonário da Ordem dos Economistas, António Mendonça, que traçou um quadro negro sobre o futuro da economia mundial. “As médias de crescimento económico são muito baixas e as revisões sobre a evolução da economia são cada vez mais negativas”, começou por dizer.
E, na sua opinião, o agravamento da situação internacional, pode trazer consequências ainda mais sérias. Para o economista, os bancos centrais enfrentam um grande dilema de “saber se a subida das taxas de juro para combater a inflação não irá gerar dinâmicas que mergulham a economia numa recessão”. E, na sua opinião, os bancos centrais deverão ter uma maior flexibilidade nas decisões, ou seja, acompanhar a evolução e tomar decisões em função da situação. “Por exemplo, o BCE já está a fazer isso, quando de uma semana para a outra corrige orientações que tinha dado na semana anterior”. Na sua opinião, as taxas de juro poderão ter subidas muito elevadas e os países que têm divídas elevadas, como é o caso de Portugal, terão de preparar mecanismos para evitar o que aconteceu em 2010, com a chamada crise das dívidas soberanas.
Apesar da conjuntura internacional e das incertezas que se avizinham, o secretário regional das Finanças diz que a retoma da atividade económica “tem vindo a acontecer, em particular para o turismo, mas também para outros setores de atividade. O governante disse ainda que “são vários os indicadores” que, neste momento, “estão acima do que tinhamos perspectivado no cenário macroeconómico que fizemos na altura do orçamento”.
Ricardo Gouveia salientou que a região está a atingir vários recordes históricos a nível do turismo, tendo em setembro do ano passado conseguido a maior rentabilidade média por quarto e “nos primeiros meses deste ano estamos com receitas superiores aos que tínhamos no período pré-pandemia”.
O encerramento da sessão coube a José Gomes, membro da Comissão Executiva da AGEAS, que se focou na necessidade que as empresas têm de se reinventar. Deu o exemplo da própria AGEAS, que, apesar de ter a base “nos seguros e na proteção” está a focar-se cada vez mais “na gestão do risco, das empresas e dos indivíduos”, o que implica uma transformação do posicionamento da empresa no mercado.
O programa começou há três anos e, atualmente, a AGEAS tem já cerca de mil empresas onde presta serviços de gestão de risco, o que etem servido para promover uma cultura de comportamento seguro no tecido empresarial português.
A versão integral da conferência pode ser vista aqui.