Foi uma das cimeiras europeias mais longas de sempre. Mas ao fim de quatro dias, os líderes do Velho Continente lá chegaram a acordo sobre o valor e a forma como se financiará a recuperação da economia dos estados-membros. O pacote total para ajudar a sarar as marcas profundas da crise provocada pelo coronavírus será de 1,8 biliões (milhões de milhões) de euros. O Fundo de Recuperação terá um poder de fogo de 750 mil milhões de euros (390 mil milhões a fundo perdido e 360 mil milhões em empréstimos) Além desse montante, chegarão aos países da UE mais quase 1,08 biliões de euros do quadro financeiro plurianual.
O valor destinado a cada Estado ainda não está fechado. Os cálculos finais terão em linha de conta as trajetórias do PIB e do desemprego. Mas Portugal deverá receber até 45 mil milhões de euros a fundo perdido nos próximos dez anos, indicou António Costa. O orçamento europeu destinará 30 mil milhões e o fundo de recuperação atribuirá mais cerca de 15 mil milhões de euros. Além destes valores a fundo perdido, o País pode ir buscar 10,8 mil milhões ao fundo de recuperação através de empréstimos com condições favoráveis.
António Costa prevê que Portugal disponha de 57 mil milhões de fundos europeus até 2030, incluindo ainda valores do Portugal 2020.
Além deste dinheiro, Portugal tem ainda para executar 12 mil milhões de euros do atual Portugal 2020. Contas feitas, o País dispõe de mais de 57 mil milhões de euros para regenerar a economia e para assegurar as bases de um crescimento sustentável nas próximas décadas. “É uma oportunidade que o País não pode desperdiçar”, referiu António Costa.
E agora? O que fazer ao dinheiro?
Após as respostas de emergência e de curto prazo à crise provocada pela pandemia agora é, um pouco por toda a Europa, o momento de pensar como se irá recuperar a economia. Em Portugal, o primeiro guião para essa regeneração ficou a cargo de António Costa Silva, o gestor da petrolífera Partex. Essa visão estratégica foi apresentada esta terça-feira e incluiu também ideias vindas de membros do Governo.
O documento de 142 páginas assenta em dez eixos estratégicos. O primeiro passa pela conclusão de uma rede de infraestruturas indispensáveis com foco especial na ferrovia, portos, transportes públicos e na construção de um aeroporto para a grande Área Metropolitana de Lisboa. Outros dos pilares do plano são “a qualificação da população, a aceleração da transição digital, as infraestruturas digitais, a ciência e tecnologia”; o “reforço do setor da saúde e a capitalização da resposta à crise”; o papel do Estado Social, através de apoios para a habitação, ao emprego e à ampliação e requalificação da rede de cuidados a idosos.
A visão estratégica para a próxima década deve, segundo o plano, assentar também na “reindustrialização do país com os clusters dos recursos minerais estratégicos, energias renováveis, hidrogénio, bioeconomia sustentável e o cluster do mar”. Também a “reconversão industrial com a reorientação das cadeias logísticas e de abastecimento, a fabricação de máquinas e equipamentos e a economia circular” entra num dos eixos apresentados por António Costa Silva.
Entre as prioridades para os investimentos nos próximos anos deverão estar ainda “a transição energética e a eletrificação da economia”; “a coesão do território, com a inclusão do interior na economia nacional, a dinamização da agricultura e da floresta e a transformação da paisagem”; “um novo paradigma para as cidades e a mobilidade sustentável” e programas de apoio à cultura, serviços, turismo e comércio.
Programa para Europa aprovar
A visão estratégica de António Costa Silva é o primeiro passo para o plano que Portugal terá de apresentar e negociar com Bruxelas para aceder aos 45 mil milhões de euros de fundos europeus na próxima década. O programa apresentado pelo gestor da Partex não inclui calendários nem previsões de investimentos. Mas o Governo conta agora com contributos para poder aprimorar a estratégia. António Costa convidou “todos os portugueses, as instituições, os agentes económicos, a regiões autónomas, as autarquias, os parceiros sociais, a envolverem-se neste debate, para termos uma visão estratégica comum”. Os contributos podem chegar até 21 de agosto para um endereço de email (plano.recuperacao@pm.gov.pt).
Em outubro o Governo terá já de ter um plano detalhado que sirva como base de negociação com Bruxelas. O objetivo é que o programa tenha o aval da Comissão Europeia e entre em vigor logo no início de 2021, ano em que começarão a chegar os primeiros desembolsos vindos da UE. O Fundo de Recuperação deverá distribuir 70% do valor destinado aos estados-membros em 2021 e 2022. Os outros 30% apenas deverão chegar em 2023.
No entanto, os analistas da Capital Economics não descartam, numa nota a investidores, que ainda se possa levar mais tempo até que o dinheiro chegue ao terreno. E avisam que num cenário ideal, os governos deveriam ter capacidade de aceder a esses fundos de forma mais rápida de forma a poderem financiar no imediato os seus programas de recuperação.
Do lado das empresas, António Saraiva, presidente da CIP, considera que o acordo entre os países europeus “afirma a ambição da União Europeia de ultrapassar, de forma conjunta, este desafio sem precedentes, constituindo um marco no retomar do projeto europeu”. Mas realça, num comunicado, que “e necessário, agora, assegurar que estes fundos são disponibilizados de forma atempada e aplicados eficazmente, em áreas relevantes e investimentos produtivos, de forma a que saíamos deste período de crise reforçados”.