Há quase três décadas, desde a guerra do Golfo em 1991, que o preço do petróleo não registava uma queda tão forte num início de sessão nos mercados. Em poucas horas, o valor do barril chegou a tombar 31%, para valores próximos dos 30 dólares em Londres, o preço mais baixo desde fevereiro de 2016 segundo a Reuters.
A provocar esta derrocada está o anúncio feito pela Arábia Saudita de corte de preços e aumento da produção no próximo mês, em colisão frontal com a Rússia, país que recentemente se tinha oposto a medidas para estabilizar os preços do barril de petróleo.
Segundo o The Wall Street Journal, a decisão da Saudi Aramco (a gigante petrolífera saudita) de cortar nos preços e aumentar a produção diária em mais de 10 milhões de barris por dia faz parte de uma estratégia agressiva para ganhar quota de mercado aos russos, segundo maior produtor mundial. E surge depois de diferenças de opinião entre os dois gigantes: enquanto a Arábia Saudita defendia cortes de produção, a Rússia propunha baixar ainda mais os preços para condicionar a operação dos produtores norte americanos, que nos últimos anos têm “inundado” o mercado com petróleo de xisto.
O confronto aberto entre Riade e Moscovo põe aparentemente fim a três anos em que o grupo de produtores reunidos na OPEP e outros países entre os quais a Rússia (o denominado OPEP+) procurou concertar entre si estratégias para sustentar os preços.
O efeito pode não ficar por aqui, uma vez que o principal consumidor desta matéria-prima, a China, continua a lidar com o impacto do novo coronavírus na economia. Nas últimas horas, o banco Goldman Sachs chegou a prever que o preço do petróleo possa ainda cair mais nos próximos tempos, aproximando-se dos 20 dólares por barril, queda que teria um forte impacto nos países cujas economias apresentam maior dependência do petróleo.
“Um acontecimento desta natureza pode ter maiores repercussões do que uma guerra comercial entre China e Estados Unidos, pois o petróleo afeta muitos domínios da economia mundial,” afirmou à Bloomberg Rohitesh Dhawan, do Eurasia Group.
Bolsas afundam ainda mais
A forte descida dos preços do petróleo nos mercados internacionais está também a fazer estragos nas bolsas, já de si penalizadas nas últimas semanas pelas incertezas sobre o impacto do novo coronavírus na economia mundial. Com os títulos ligados a empresas energéticas a afundar à boleia da descida do preço do barril, as praças europeias arrancaram a negociação desta segunda-feira em forte queda.
O índice europeu de ações Stoxx 600 afundava 6% na abertura das negociações, puxado para baixo pelos papéis das empresas energéticas e entrando em bear market (queda de 20% em relação aos recentes máximos registados, comportamento desencadeado por pessimismo e sentimento negativo dos investidores). Em Londres, cujo índice começou o dia a cair perto de 9%, as ações da petrolífera BP derrocavam mais de 20% na abertura, enquanto em Amesterdão a Shell caía quase 22%. A italiana Eni recuava 20,75%.
O efeito estendeu-se a Lisboa, onde o português PSI-20 iniciou a sessão a cair cerca de 5%, mas viu a tendência agravar-se entretanto, passando a perder 8% pelas 8:45. Nessa altura, a maior queda, de quase 25%, cabia aos títulos da petrolífera Galp Energia.
“Este dia vai ser lembrado como Segunda-feira Negra. Se pensávamos que não podia ser pior do que a última quinzena, é melhor pensar melhor… está a ser uma carnificina total,” afirmou Neil Wilson, chief market analyst no Markets.com. No meio do tumulto dos mercados acionistas, os investidores refugiam-se em títulos de dívida soberana.
A madrugada já tinha sido marcada pelo sinal vermelho nas praças asiáticas e o efeito deve voltar a fazer-se sentir ao início da tarde em Nova Iorque, quando abrirem as negociações das bolsas esta segunda-feira. Às 9:30 os futuros indiciavam que os índices norte-americanos poderiam arrancar com perdas na ordem dos 5%.