As técnicas experimentais desenvolvidas nas últimas duas décadas em torno da investigação no terreno de questões ligadas à pobreza, que permitiram uma abordagem segmentada aplicável a domínios como a educação, a saúde ou a produtividade, valeram o prémio Nobel de Ciências Económicas aos três galardoados deste ano: o indiano Abhijit Banerjee, a francesa Esther Duflo e o norte-americano Michael Kremer.
Segundo a Real Academia Sueca das Ciências, o prémio do Sveriges Riksbank Prize em Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel distingue a forma como a abordagem inovadora destes três cientistas – estudando questões específicas em grupos mais pequenos e desenvolvendo experiências adequadas caso a caso – ajudou a transformar o campo de investigação da economia do desenvolvimento.
As experiências realizadas pelos laureados, em países como a Índia ou o Quénia, por exemplo, permitiram, nos vários grupos analisados, estudar as decisões dos participantes no terreno e em contexto real. Desta forma, os premiados puderam não só testar se uma determinada solução funcionava, mas também porque é que funcionava. Os trabalhos que levaram aos Nobel da economia de 2016 e 2017 (Teoria do Contratos e Economia Comportamental) foram usadas para estudar as razões que motivaram as decisões dos participantes nestas experiências, refere a Real Academia Sueca das Ciências.
Por outro lado, desenvolveram ainda novos métodos que permitem que as conclusões tiradas para os grupos estudados possam ser generalizadas e aplicadas a um universo maior, ligando-as à teoria económica. A investigação abriu a porta a aplicações destes avanços em áreas como a educação, saúde e microcrédito, com efeito direto e indireto nas políticas de combate à pobreza e na forma de trabalhar das organizações que se dedicam a estas tarefas.
Trabalhos no terreno
Uma das conclusões demonstradas pelos estudos dos Nobel da Economia de 2019 é que as razões para as diferenças de produtividade entre países pobres e ricos estão muitas vezes dentro dos países mais pobres, na medida em que dependem do nível de sofisticação e modernização dos meios de produção utilizados pelas pessoas, empresas ou grupos nesses países.
Na área da educação, sobre a qual também se debruçaram com trabalhos de campo no Quénia, envolvendo ONG, procuraram perceber quais os fatores mais determinantes para o sucesso escolar dos alunos. Também aqui abordaram o problema, segmentando as escolas. Pegando em grupos de escolas com necessidades consideráveis e que recebiam apoios como livros de estudo ou refeições grátis, os investigadores dividiram-nas aleatoriamente em vários grupos e puderam concluir, da análise, que estes dois recursos, por si só, não tinham impacto positivo no rendimento da generalidade dos alunos.
Ao contrário do que se poderia presumir, a falta de recursos não era, assim, o principal problema em muitos dos países mais pobres (a disponibilidade de mais livros, por exemplo, só tinha um resultado positivo naqueles que já fossem melhores alunos). O ensino é que não estava adaptado às necessidades específicas de cada aluno, como ficou demonstrado em experiências em duas escolas na Índia.
“Devido ao seu trabalho, os trabalhos de campo tornaram-se o método padrão para os economistas do desenvolvimento na investigação de medidas para mitigar a pobreza,” refere a Real Academia. Em 2018, numa entrevista, Banerjee referia que a abordagem diferenciada adotada nas técnicas experimentais permitiu identificar “exatamente qual é o problema” em cada um dos casos e quais as soluções que melhor resultavam em cada caso.
Abhijit V. Banerjee e Esther Duflo (que, com 46 anos, é a mais jovem premiada nesta categoria) são casados e têm vários livros em conjunto, como A Economia dos Pobres, editado em Portugal pelo Círculo de Leitores em 2012 e onde se alega que o falhanço das políticas contra a pobreza resulta da má compreensão deste fenómeno.
A obra mais recente, Good Economics for Hard Times, tem lançamento previsto para o próximo dia 12 de novembro e aborda possíveis soluções económicas para alguns dos principais problemas do mundo atual: imigração, desigualdade, globalização, disrupção tecnológica, crescimento lento e alterações climáticas. Na descrição, a editora refere que o livro “defende, de forma convincente, um intervencionismo inteligente e uma sociedade construída com compaixão e respeito”.