Há que lhe chame cenários catastróficos e quem prefira dizer que são apenas cenários realistas. Mas, a continuar estes ciclos de crescimento e de desperdício (de matérias primas, de alimentos…) o planeta não aguentará. E foram vários os exemplos dados durante a 3ª edição do National Geographic Summit, desta vez realizado no Porto. E foram centenas os jovens que ouviram atentamente os oradores que passaram pelo palco da Casa da Musica.
O encerramento esteve a cargo de Claire Sancelot, mãe de três filhos, que tentou exemplificar como uma família pode adaptar-se ao movimento de desperdício zero. Ela, que nasceu numa sociedade de consumo, acabou por fazer uma grande mudança na sua vida ao adaptar-se à filosofia dos R’s: reduzir, recusar o que não precisa, reutilizar, reciclar e até fazer a compostagem dos seus próprios resíduos orgânicos.
Por vezes, basam algumas medidas simples. Em vez de continuar a comprar produtos de higiene e beleza, passou a fabricá-los. A sobra da comida passou a ser guardada em embalagens de vidro transparente para que não fique esquecida no frigorifico. A carne passou a ser praticamente eliminada das refeições para ser substituída por vegetais e produtos locais. O armário de roupa passou a contar apenas com o estritamente necessário. Na sua bolsa há sempre um frasco para comprar a granel, uma garrafa para encher de água e um termos de café. E, com coisas que considera assim tão simples, há realidades que se transformam, como a dela. Acabou a abrir a primeira loja de desperdício zero na Malásia, onde agora vive.
“É preciso comer menos e melhor. Perguntar sempre de onde vem o produto que compramos. Parar de comprar o papel de cozinha e recipientes de plástico. Desperdício zero é um novo objetivo que pode mudar a forma como vivemos”, defendeu ao longo da sua intervenção. “Só é complicado nos primeiros tempos”, prometeu.
Antes dela, já Paula Sobral, bióloga e investigadora do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, tinha deixado bem claro como os oceanos estão superlotados de microplásticos. E Jamie Butterworth, que defende a introdução crescente da economia circular no quotidiano das Pequenas e Medias Empresas (PME), tinha defendido que os empresários ganham tanto mais quanto mais forem capazes de reduzir o desperdício. Mas não havia muitos empresários presentes na sala. A exceção coube a Paulo Azevedo, Chairman da Sonae, que o ouviu atentamente na segunda fila e que recentemente assumiu o compromisso de pôr fim à maioria do plástico nos produtos de supermercado.
Vejamos o ciclo produtivo atual: “matéria prima-fabrico do produto-venda/compra-deitar fora”. “Onde? Já pensou seriamente onde vai parar este lixo?”. Na opinião de Jamie, cerca de 20% do que se deita fora pode ser recuperado. E até quando nos livramos de uma tshirt de que não gostamos, devíamos pensar, por exemplo, na “muita quantidade de água gasta para a produzir”.
E é então que surgem números assustadores que definem a economia linear: um terço da comida produzida é desperdiçada; as construções crescem incessantemente; há 78 milhões de toneladas de plástico por ano (em 2050 serão 318 milhões) a andar por aí e só 10% poderá ser reciclado com a mesma qualidade. “No futuro, haverá mais plástico nos oceanos do que peixe”, vaticinou.
É então que desfila as medidas de urgência de passagem da economia linear para a circular. A regra número um é ter a consciência de que já é “demasiado tarde para limpar”. Logo de seguida, a responsabilidade é atribuída ao consumidor, que pode fazer o produtor pagar tudo o que é mal concebido: por exemplo, a União Europeia já vai avançar com taxas sobre alguns produtos de plástico, como os cotonetes; o consumidor pode simplesmente recusar comprar.
No entanto, o plástico não é para erradicar, até porque há plásticos bem concebidos, sobretudo na área da saúde: as seringas, por exemplo. Regra número 3 é, portanto, ter noção de que “os plásticos não são todos iguais”, precisam é de “ser usados no contexto certo”.
Outro mandamento para alterarmos o “sistema de pensamento” da sociedade é perguntar sempre se aquilo que estamos a consumir vem de uma fonte sustentável. E, se procurarmos produtos alternativos, estaremos a financiar a inovação. Como limpar a água que bebemos, os mares ou o ar que respiramos “custa muito dinheiro”, melhor será que comecemos “a interiorizar o custo dos maus componentes” de uma vez por todas.
Por último, “é necessário identificar as oportunidades que possam ser escaladas e captar /desviar o capital para estes sistemas alternativos”.
É difícil convencer as empresas a mudar? “Acredito que em alguns casos é difícil. Mas se compreenderem acabam por aceitar, pois ficam a ganhar se pouparem no desperdício”, responde Jammie, especialista em capacitar as PME para investimentos que favoreçam a economia circular e ex-CEO da Fundação Ellen MacArthur que promoveu a plataforma Circular Economy 100
Agora, é só cada um fazer um pouco para assumir o compromisso.