A maioria das marcas de luxo foram lentas na sua entrada no mundo digital. Demoraram a tomar decisões e a definir estratégias, dada a incerteza em relação ao seu ativo mais valioso, a marca. Estamos a falar de marcas centenárias, cujo valor assenta na tradição e na exclusividade. Mas quando se vendem relógios de 100.000€ através do Instagram, é sinal de que o mundo – e sobretudo o cliente – mudou. E como diria Darwin, para sobreviver é preciso adaptar.
O impacto do modelo “Luxo 4.0” é muito visível na relação das marcas com o cliente, tanto na distribuição como na comunicação. As vendas online de “personal luxury goods” ainda são uma fatia pequena de um negócio avaliado em mais de 270 mil milhões de euros. Mas estima-se que em 2025, uma em cada cinco vendas passe a ser online, e cada vez mais mobile.
Este foi sem dúvida um dos maiores desafios do retalho, assegurar esta estratégia omnicanal. E quando falamos de luxo, todos os detalhes são construídos para criar uma experiência de compra que envolve o cliente no ADN da marca. Como incorporar esta qualidade de serviço num canal online? Como integrar a oferta online com as lojas físicas?
Estes desafios são enormes oportunidades de negócio para novos players, com novos modelos de negócio baseados na tecnologia. Plataformas multimarcas, como a Mr. Porter e Outnet do Grupo Yoox Net-a-Porter, estão em clara expansão. O marketplace para moda de luxo online Farfetch, fundada pelo Português José Neves, está a preparar o IPO que avalia a empresa em $5-6 mil milhões. Também a LVMH, o maior grupo de Luxo do mundo, com vendas superiores a 42 mil milhões de euros, lançou a sua plataforma digital 24 Sèvres, com oferta online de algumas das suas 70 marcas (Louis Vuitton, Marc Jacobs, Dior, entre outras). Criou a figura do Chief Digital Officer, e recrutou Ian Rogers da Apple, antigo responsável da iTunes, para o lugar. É sinal da importância do digital no Luxo, e da incorporação desta mudança na estratégia do grupo.
Num mundo onde o lifestyle é cada vez mais digital, e onde os consumidores vivem conectados – uns aos outros e às marcas que os inspiram – qual é o papel da loja física nesta nova equação? Os clientes já não compram produtos, compram a emoção associada à marca. Daí que as lojas físicas passam a ser locais de experiências, de convívio com as marcas. Incorporam atividades de lazer com compras, como podemos ver em projetos como o recentemente renovado Freeport Lisboa Fashion Outlet. Estamos na época do reverse omnichannel, onde é a loja física que tem que reinventar a experiência do cliente e superar a expectativa da experiência online. Vivemos tempos exigentes, com clientes habituados à satisfação imediata das suas vontades – desde Uber Eats ao Spotify – num mercado cada vez mais on-demand. A reação do luxo é elevar (ainda mais!) o nível de serviço. A Net-a-porter criou o serviço “you try we wait” que permite aos clientes VIP provarem as peças que encomendaram enquanto o estafeta espera para garantir que está tudo bem. Uma aposta nos melhores clientes, confirmada pelo Federico Marchetti na recente Condé Nast International Luxury Conference, onde referiu que 50% das vendas são feitas por apenas 2% dos clientes. O segredo, diz ele, está em conhecer os clientes. E surpreende-los.
O impacto do digital vai muito além dos canais de vendas e de comunicação. No mundo do luxo, onde o Instagram é a nova montra, os consumidores assumem também um papel de embaixadores, sobretudo os millennials. A Chanel é mencionada (#chanel) cerca de 50 milhões de vezes pelos seus fãs, comparado com 700 posts oficiais da marca! Os clientes são o novo canal de marketing das marcas, extremamente ativos nas redes sociais. Esta realidade implica uma mudança nas estratégias de marketing, já visível em muitas marcas de luxo, que aumentaram o investimento no digital e nos eventos (em detrimento do papel). Mas estas alterações têm sido incrementais na maioria das marcas, que pode não chegar para a rapidez de mudança do mercado.
Nos primórdios do luxo, as marcas tinham uma relação pessoal com todos os seus clientes. O próprio Louis Vuitton enviava cartas personalizadas com sugestões de malas para as próximas viagens. Hoje, com o poder da tecnologia de análise de dados, é possível criar estas relações de intimidade com os clientes. Através do marketing contextual, as marcas conseguem comunicar e dirigir a oferta de produtos/serviços de forma totalmente personalizada, com o mesmo efeito das cartas do Sr. Vuitton. Fazer o cliente sentir-se especial.
São as marcas que alavancam a transformação digital no seu negócio, e incorporam uma atitude millennial que vão vingar neste admirável mundo novo do “Luxo 4.0”.