O holandês Frans van Houten, presidente mundial da Philips, está à frente de uma das maiores mudanças do mercado de tecnologia. Durante mais de 60 anos a Philips foi um dos maiores fabricantes mundiais de equipamentos eletrónicos, como televisores e aparelhos de som. Até que, em 2011, Van Houten tornou-se presidente da empresa e decidiu terceirizar a fabricação desses produtos para parceiros asiáticos. A Philips passou a concentrar-se em pesquisar e produzir equipamentos médicos de ponta, lâmpadas mais eficientes e aparelhos eletroportáteis. Consumidores, acionistas e funcionários assustaram -se. Metade dos 200 principais executivos foi trocada nos últimos dois anos. Como é que uma empresa que fatura o equivalente a 70 mil milhões de reais (22 milhões de euros) abandonava assim o seu mercado mais tradicional? Passados dois anos, os resultados estão a seu favor. As ações subiram 50% desde 2011 e as vendas cresceram 10%. Van Houten falou à EXAME da estratégia de mudança da Philips, que irá prolongar-se por mais cinco anos.
Porque razão abandonou a produção de televisores e aparelhos de som?
Quando me tornei presidente, já tinha a convicção de que os produtos eletrónicos tradicionais não eram atrativos para o futuro da Philips. Fabricar esses produtos tornou-se um negócio de baixa margem, em que a diferenciação já não é possível. Além disso, o consumidor está a migrar para a Internet, e os aparelhos tornam-se menos importantes. Decidimos transferir esses negócios para parceiros. Queremos concentrar-nos apenas em áreas nas quais a inovação realmente importa, como os equipamentos médicos, a iluminação eficiente e os aparelhos eletroportáteis, como escovas de dentes elétricas.
Como foi recebida essa decisão?
Claro que é um choque quando se toma uma decisão como esta. Estávamos no ramo há mais de 60 anos. Eu digo sempre que devemos ter orgulho na história da empresa, mas não ser sentimentais. É preciso usar a nossa capacidade de inovação e habilidade em engenharia para responder aos desafios que o mundo enfrenta, como a necessidade de economizar energia e tornar os serviços de saúde acessíveis.
Que tipo de resistência sofreu?
A primeira reação é sempre de rejeição, de dizer que é impossível fazer o que é necessário. Esse é o meu papel como líder: tentar inspirar as pessoas. Mas se elas não se mexem, não têm hipótese. Nós trocámos metade dos 200 executivos mais graduados. Os investidores também estavam muito céticos. Basicamente, ninguém acreditava no nosso plano. Hoje estão entusiasmados com o resultado. O preço das nossas ações subiu 50% nos últimos dois anos. Estamos mais lucrativos atuando nessas áreas – o retorno do segmento de equipamentos médicos, por exemplo, é de 14% ao ano, enquanto a produção de televisores dava prejuízo.
O que falta mudar na empresa?
Essa jornada de transformação da Philips vai levar mais uns cinco anos. Temos um grande programa de incentivo ao empreendedorismo dentro da empresa. A maior parte das inovações virá daí. As oportunidades de crescimento nessas áreas prioritárias são muito grandes. Queremos que a companhia duplique de tamanho até 2025 e seja líder na área da saúde. Atualmente, os nossos produtos atingem 1,7 mil milhões de consumidores no mundo. Queremos chegar a três mil milhões.
Produtos caros, como equipamentos médicos, combinam com mercados emergentes, como, por exemplo, o Brasil?
Estamos a adaptar equipamentos vendidos em versões sofisticadas para os mercados emergentes. As lâmpadas de LED são caras, mas reduzem as contas de energia até 60%. Acabámos de ganhar uma concorrência para substituir 90 mil lâmpadas na cidade de Buenos Aires, apesar do mau momento da economia argentina. É aí que entra a inovação: fazer produtos de alta tecnologia mais baratos e acessíveis.
Esta artigo é parte integrante da Revista EXAME de maio