DII: Quando o corpo é o inimigo


DAS TRIPAS CORAÇÃO é um projeto patrocinado pela Janssen, companhia farmacêutica do Grupo Johnson & Johnson, que tem a APDI, a ACCP e a SPG como parceiros. 

Neste canal serão apresentados conteúdos sobre a Doença Inflamatória do Intestino (DII), dando a conhecer múltiplos aspetos: prevalência, sintomas e tratamento, estigma e discriminação, inovação, qualidade de vida e comorbilidades. O objetivo é compreender melhor a doença e ajudar a identificá-la. Há 6 mil pessoas, em Portugal, que ainda não têm a doença controlada e devem ter a ajuda de que precisam. Com acesso a informação.

O que fazer quando o corpo falha?

Este sentimento angustiante e assustador é partilhado por muitas pessoas com Doença Inflamatória do Intestino. Diarreia, perda de apetite, dor abdominal, dor nas articulações, problemas de pele, problemas oftalmológicos, fadiga, perda de peso, descontrolo intestinal, sangue nas fezes, urgência em ir à casa de banho, ansiedade, depressão… Estes são alguns dos sintomas experienciados por pessoas com DII e apontam para uma diversidade de diagnósticos.

Em Portugal há 24 mil pessoas com DII, e os doentes perdem, em média, 25% da sua qualidade de vida. A má notícia é que a DII não tem cura. A boa, é que com medicação e acompanhamento médico é possível manter os sintomas controlados e recuperar alguma qualidade de vida

Sobre a DII

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Ricardo Veloso


Médico
Gastrenterologista

Samuel Fernandes


Médico
Gastrenterologista

Maria João Moreira


Médica
Gastrenterologista

Doença Inflamatória Intestinal é uma designação genérica que engloba várias patologias, sendo as mais comuns a Doença de Crohn e a Colite Ulcerosa. São patologias inflamatórias crónicas do intestino (podendo, contudo, ter manifestações extraintestinais), com etiologia ainda incompletamente conhecida, complexa e multifatorial, com localização e características clínicas muito variáveis e com um padrão típico de evolução com surtos/agudizações e remissões.  Como em qualquer doença, há formas muito ligeiras da mesma e formas muito graves a necessitar de múltiplos fármacos e mesmo intervenções cirúrgicas, causando um grande impacto na qualidade de vida das pessoas.
O seu reconhecimento e tratamento atempado são de extrema importância e, por isso, na presença de sintomas sugestivos de poder ter uma Doença Inflamatória Intestinal deve sempre falar com o seu médico/a de família ou mesmo contactar um Gastrenterologista.

Dr. Ricardo Veloso

As DII são, a nível global, doenças muito mais comuns do que a população perceciona e são patologias de frequência crescente, mas com uma ampla variabilidade geográfica em que a percentagem de casos mais elevada se encontra nos países desenvolvidos e as mais baixas em países em desenvolvimento. Regiões com clima mais frio e de ambiente urbano têm igualmente uma maior incidência de doentes do que as regiões rurais ou de climas mais quentes.
A prevalência das DII tem vindo a crescer de forma significativa todos os anos sendo a prevalência destas doenças a nível mundial de 396 casos por 100.000 pessoas/ano. Apesar dos poucos estudos reportados sobre a prevalência das DII em Portugal, estima-se que estas tenham uma prevalência de cerca de 160 doentes por 100.000 pessoas/ano distribuídas de forma idêntica entre a Doença de Crohn e a Colite Ulcerosa, com um discreto predomínio do sexo feminino.

Dr. Ricardo Veloso

Infelizmente, à luz da Ciência atual não existe cura para as Doenças Inflamatórias Intestinais. Há cada vez mais fármacos para as tratar, cada vez compreendemos melhor os mecanismos da doença e todas as vias de inflamação, mas estamos ainda muito longe de descobrir uma cura para estas doenças. Contudo, estamos cada vez mais a conseguir tratar melhor, mais cedo e com fármacos com menos efeitos laterais e que conseguem devolver qualidade de vida às pessoas afetadas por esta doença.

Dr. Ricardo Veloso

As duas principais formas das DII são a Colite Ulcerosa e a Doença de Crohn. Há outros grupos mais raros destas doenças como as colites microscópicas (estas também cada vez mais reconhecidas) e as doenças eosinofílicas do tubo digestivo que também podem ser incluídas no grupo das DII uma vez que são igualmente doenças de inflamação do tubo digestivo, crónicas, recidivantes provocadas por mecanismos ainda incompletamente reconhecidos.

Dr. Ricardo Veloso

Qualquer uma destas doenças pode apresentar de forma sub-reptícia, praticamente silenciosa durante muitos anos o que pode atrasar e dificultar o diagnóstico das mesmas. De uma forma genérica os sintomas mais frequentes das DII são:

  • Diarreia persistente/crónica
  • Dor abdominal
  • Diarreia com sangue/presença de sangue nas fezes
  • Perda de peso
  • Astenia/fadiga crónica

Dr. Ricardo Veloso

Apesar de partilharem várias características e dos sintomas poderem ser muito similares entre estas duas doenças, há alguns aspetos que as diferenciam:

  • A Colite Ulcerosa afeta apenas o cólon e reto (intestino grosso) e apenas em casos muito raros pode atingir uma pequena parte do intestino delgado. Já a Doença de Crohn pode atingir qualquer parte do tubo digestivo, desde a boca até ao ânus.
  • Na Doença de Crohn pode haver áreas de intestino saudável intercaladas por áreas de intestino com doença. Já na colite ulcerosa o atingimento é contínuo a partir do reto atingindo uma extensão variável de intestino grosso.
  • Tipicamente a colite ulcerosa afeta apenas a camada mais superficial do intestino (podendo atingir mais profundamente se a inflamação for muito severa) sendo que a Doença de Crohn pode atingir todas as camadas do tubo digestivo.

    Apesar de todas estas diferenças há cerca de 10% dos casos em que não somos capazes de distinguir uma doença da outra uma vez que apresentam características comuns a ambas.

Dr. Ricardo Veloso

Não há um único exame que nos consiga dar um diagnóstico imediato e de certeza nestes casos, apesar do exame mais útil nestas doenças ser, tipicamente, a colonoscopia com realização de biopsias. O diagnóstico pode ser complexo, demorado e envolve um conjunto de características endoscópicas, histológicas (referentes às biopsias), analíticas (alterações inflamatórias nas análises, anemia, etc.), imagiológicas (especialmente importantes na Doença de Crohn) e, finalmente, clínicas. É da conjugação de todos estes fatores que podemos estabelecer um diagnóstico de DII o que, por vezes, não é linear.
É também importante referir que é um diagnóstico que não deve ser aplicado de forma leviana ou despreocupada uma vez que estes diagnósticos acarretam um sério impacto na qualidade de vida das pessoas e necessitam de avaliação e exames periódicos.

Dr. Ricardo Veloso

Tipicamente o passo mais importante no diagnóstico das DII é a realização de uma (íleo)colonoscopia com realização de biopsias. Este exame permite-nos ver diretamente se há sinais de inflamação no cólon e na parte final do intestino delgado, qual a extensão, qual o aspeto endoscópico (permitindo uma ideia mais clara do diagnóstico) e a realização de biopsias para avaliação histológica (ao microscópio) das alterações presentes na camada mais superficial do intestino.
Há múltiplos outros exames que podemos utilizar para o diagnóstico:

  • Análises clínicas para avaliar anemia, inflamação, alteração de outros parâmetros ou órgãos que possam estar alterados
  • Exames de Imagiologia como a enterografia por TC ou por RMN que nos permitem uma avaliação do intestino delgado por um método não invasivo
  • Endoscopia Digestiva Alta para pesquisar atingimento do tubo digestivo superior na Doença de Crohn
  • Enteroscopia Assistida por Cápsula que nos permite filmar o intestino delgado para pesquisar alterações sugestivas de Doença de Crohn não diretamente acessível pela colonoscopia
  • Enteroscopia Assistida por Balão que é um tipo de endoscopia desenhado para se conseguir extensões variáveis do intestino delgado que pode ser importante tanto para confirmação de diagnóstico/recolha de biopsias, mas também pode ter um papel terapêutico no caso de estenoses (apertos) do intestino delgado que podem ocorrer nas DII.

Dr. Ricardo Veloso

O termo colonoscopia já fará parte do léxico da grande maioria dos portugueses e os programas de rastreio do cancro colorretal têm conseguido mobilizar muitos doentes a fazer este exame.
De uma forma muito simplista, uma colonoscopia é um exame endoscópico em que um tubo longo e flexível (colonoscópio) que tem o diâmetro aproximado dum dedo é introduzido pelo ânus e é capaz de percorrer o intestino grosso. O colonoscópio tem uma câmara que emite uma imagem para um monitor o que permite que o Gastrenterologista veja, em tempo real, eventuais alterações da mucosa (camada superficial do intestino) permitindo igualmente a realização de biopsias, polipectomia (remoção de pólipos) ou de outras terapêuticas que sejam necessárias.
É um exame quase sempre efetuado em ambulatório sendo raras as situações em que é necessário o internamento antes ou após o exame. Regra geral as colonoscopias devem ser efetuadas sob alguma forma de sedação uma vez que são exames potencialmente dolorosos. Contrariamente ao que é comumente referido, o fato de a pessoa estar sedada não aumenta o risco de perfuração do cólon, conferindo conforto ao doente e qualidade ao trabalho do Gastrenterologista.
A colonoscopia é, globalmente, um exame seguro. Ao ser um exame invasivo não é um exame isento de riscos, mas quando corretamente efetuado em situações clínicas que o justifiquem, os benefícios são largamente superiores aos eventuais riscos. O risco de perfuração em exames de rotina/diagnóstico é extremamente baixo, ocorrendo cerca de 1 caso a cada 8.000 exames.
Como em qualquer exame médico, deve discutir com o seu médico os riscos e os benefícios do exame de forma a poder dar o seu consentimento para a realização do exame da forma mais informada possível.

Dr. Ricardo Veloso

À semelhança da colonoscopia, uma endoscopia digestiva alta é um exame endoscópico efetuado com um tubo flexível com uma câmara que permite a visualização em tempo real num monitor da parte superior do nosso tubo digestivo: o esófago, o estômago e a primeira metade do duodeno. À semelhança da colonoscopia, a endoscopia digestiva alta permite diagnosticar e, por vezes, tratar alterações que atinjam a parte superior do tubo digestivo através dum canal presente no endoscópio que permite a passagem de vários utensílios com diferentes funções permitindo efetuar vários tratamentos nomeadamente estancar hemorragias, resolver obstruções ou remover pólipos.
Tal como a colonoscopia, a endoscopia digestiva alta pode ser realizada com ou sem sedação. Nos exames sem sedação a parte inicial do exame consiste na aplicação de um spray anestésico na boca para minimizar os sintomas. Esse spray (idêntico à anestesia dos dentistas) vai fazer com que a garganta pareça “encortiçada” por estar anestesiada. Esse efeito dura, tipicamente, cerca de 15-20 minutos e depois desaparece.
Depois de a garganta ser anestesiada é colocado um bucal para estabilização do aparelho e para proteção da pessoa. Depois o/a Gastrenterologista, com o auxílio de um enfermeiro/a, vai iniciar o exame, introduzindo o endoscópio pela boca e guiando-o pelo tubo digestivo superior através de comandos existentes no endoscópio.
A Endoscopia Digestiva Alta não é um exame doloroso. Inicialmente pode sentir uma ligeira sensação de engasgamento (durante a passagem do endoscópio para o esófago), mas nunca ficará sem ar, uma vez que a traqueia estará sempre desimpedida. Para uma correta visualização do tubo digestivo superior é necessária a insuflação de ar através do endoscópio, pelo que é natural que sinta uma sensação de inchaço que desaparece após o exame.
Se o exame for realizado sob sedação (anestesia), necessitará de ser admitido a um recobro antes e após a endoscopia. Durante o exame, será administrado um medicamento sedativo por um anestesista, para que se sinta mais confortável.
A endoscopia digestiva alta é, globalmente, um exame rápido que tipicamente não excede os 5-10 minutos. No entanto, pode demorar mais se for necessário realizar algum tratamento e/ou ato terapêutico.
As complicações da endoscopia digestiva alta são extremamente infrequentes, sendo um exame seguro. Mesmo quando existem complicações, habitualmente são pouco graves e passageiras. A percentagem global de complicações nas endoscopias digestivas altas apenas diagnósticas é de 0,0002% e de cerca de 0,15% naquelas em que é necessário efetuar alguma terapêutica.

Dr. Ricardo Veloso

A enteroscopia por cápsula (ou como é mais comumente denominada, cápsula endoscópica), é um exame que permite a visualização do intestino delgado que é inacessível à visualização direta pela endoscopia digestiva alta e pela colonoscopia.
Consiste na ingestão de uma cápsula sensivelmente do tamanho dum comprimido de paracetamol de 1000 mg que contém uma bateria e uma câmara acoplada que vai tirando fotografias do intestino delgado que são captadas por um registador externo e depois passadas para formato de vídeo para posterior visualização.
Apesar de parecer um procedimento muito complexo para o doente, na realidade é bastante simples! Consiste na aplicação dum cinto próprio na região abdominal do doente que permite o envio das imagens para um gravador que habitualmente fica acoplado à cintura do doente. Logo que o sistema esteja operacional o doente deglute a cápsula como se de um comprimido se tratasse. A passagem da cápsula endoscópica não é percetível pelo doente e o mesmo pode ter, regra geral, um dia normal, podendo mesmo trabalhar sem limitações. No final do tempo de gravação (tipicamente 8-10 horas), o doente volta ao hospital/clínica de forma que lhe seja retirado o cinto/gravador externo e a cápsula é então naturalmente eliminada pelo nosso corpo, não sendo habitualmente notada a sua eliminação uma vez que pode estar envolta nas fezes aquando da sua expulsão.

Dr. Ricardo Veloso

A perspetiva histórica do tratamento das DII focava mais na resolução dos sintomas, mas hoje sabemos que existe uma clara discrepância entre os sintomas reportados pelos doentes e a presença de inflamação intestinal o que faz com que este objetivo, apesar de importante para melhorar a qualidade de vida das pessoas com DII, é insuficiente.
As DII são doenças heterogéneas com manifestações e gravidade diferentes em doentes diferentes e a nossa habilidade para predizer a resposta a um determinado tratamento é escassa.
Vários estudos incidiram recentemente numa estratégia mais proativa de forma a poder mudar a história natural destas doenças. As atuais estratégias de tratamento incidem para além da simples resolução dos sintomas, mas tentam também alcançar a cicatrização do intestino e a normalização dos parâmetros da inflamação, numa abordagem mais holística para o tratamento destas doenças.
O acompanhamento e monitorização regular destas doenças é, desta forma, de enorme importância porque permite ao Gastrenterologista uma melhor adaptação dos tratamentos disponíveis ao doente com DII. Este acompanhamento também nos permite avaliar se um determinado tratamento não está a funcionar apesar da melhoria dos sintomas, conferindo uma oportunidade para alterar a abordagem terapêutica antes do agravamento dos sintomas.
Não existe, contudo, um consenso generalizado sobre a forma deste mesmo acompanhamento e este deve ser adaptado ao doente e à gravidade da sua doença. Apesar de, compreensivelmente, os doentes não gostarem de fazer exames auxiliares de diagnóstico frequentemente ou ter de se deslocar ao Hospital amiúde, este acompanhamento pode ser a chave para mitigar o efeito deletério das DII na qualidade de vida das pessoas.

Dr. Ricardo Veloso

Não existe uma única causa para o aparecimento das DII. Ainda temos muito para aprender sobre as causas/etiologia das DII, mas sabemos hoje que as mesmas ocorrem da interdependência de 3 fatores:

  • Predisposição genética
  • Desregulação da resposta imune
  • Desregulação da microbiota intestinal

Convém, contudo, referir que a inflamação intestinal é um processo fisiológico e mesmo necessário uma vez que faz parte das defesas do nosso organismos. O que parece acontecer nestas doenças é uma desregulação destes mecanismos de inflamação em que fatores genéticos (já com vários genes identificados), fatores ambientais (possivelmente a poluição atmosférica e a dieta ocidental) e outros fatores como gastroenterites e utilização de antibióticos na infância/adolescência podem todos contribuir para o aparecimento das DII. Apesar do desenvolvimento no conhecimento destas doenças, continuamos longe de saber qual é o fator (ou fatores) chave para o aparecimento das mesmas num doente em particular.
Quanto ao tabagismo a sua relação com as DII é peculiar uma vez que é um fator típico de agravamento da Doença de Crohn e parece ser um fator de risco para o seu desenvolvimento, mas o tabagismo atual tem um efeito protetor para a colite ulcerosa. Contudo, os malefícios do tabagismo são sempre superiores a qualquer eventual diminuto benefício na colite ulcerosa.
Quanto à dieta também existe alguma controvérsia. Apesar de haver estudos que referem que uma dieta mediterrânica pode ter um fator protetor para o aparecimento das DII, a verdade é que os estudos de base alimentar são complexos e difíceis de interpretar. Contudo, como para qualquer doença, uma dieta equilibrada e saudável é sempre importante por vários motivos que não se esgotam nas DII.

Dr. Ricardo Veloso

Não, as DII não se transmitem diretamente de pais para filhos.
Verifica-se, contudo, um risco superior de desenvolver estas doenças caso tenha um ou mais familiares afetados, sobretudo em 1º grau (pais, irmãos, filhos). Estima-se que até 10% dos doentes com DII apresente um familiar em 1º ou 2º grau com uma das formas da doença.

Dr. Samuel Fernandes

As DII não apresentam cura. Neste sentido, os tratamentos disponíveis, médicos e cirúrgicos, tem por objetivo controlar os sintomas, prevenir recaídas e atrasar a progressão da doença.
Embora alguns tratamentos sejam comuns à colite ulcerosa e Doença de Crohn, existem diferenças significativas na sua abordagem. O tratamento escolhido dependerá da localização, extensão e gravidade da doença. Relativamente ao tratamento farmacológico existem formulações rectais (supositórios/enemas), orais, subcutâneas e endovenosas.
Contudo, os tratamentos não são eficazes para todos os doentes. Importa discutir com o seu médico assistente as melhores opções para o seu tipo de doença.

Dr. Samuel Fernandes

Salvo para as formas ligeiras a moderadas de colite ulcerosa, em que estão disponíveis medicamentos não imunossupressores (5-aminossalicilatos), os restantes tratamentos para as DII envolvem a utilização de medicamentos imunossupressores.
Dentro do grupo anterior existem vários fármacos, não específicos para as DII e que são utilizados há vários anos para o tratamento de outras doenças autoimunes, hemato-oncológicas e da área do transplante. Salientamos os corticosteróides que embora rápidos e eficazes no controlo dos sintomas, se associam a vários efeitos secundários devendo, portanto, ser utilizados de forma adequada e ponderada.
A grande evolução no tratamento médico das DII deriva do aparecimento dos fármacos biológicos e novos imunomodeladores (inibidores da JAK). Estes fármacos são mais específicos e eficazes para o tratamento da doença, com um perfil de segurança muito satisfatório.
Vários estudos demonstram que estes medicamentos são eficazes em controlar a doença numa percentagem substancial de doentes traduzindo-se em melhorias significativas na qualidade de vida.

Dr. Samuel Fernandes

Cada grupo de fármacos tem o seu leque de efeitos secundários potenciais, extensamente conhecidos pelos especialistas. É importante que sejam dados a conhecer aos doentes antes do início de qualquer tratamento.

A maior parte dos medicamentos imunossupressores associa-se a um aumento do risco de infeções, sobretudo respiratórias, a maioria ligeira e tratável. Estes riscos não se verificam com alguns dos biológicos mais recentes.
Os corticosteróides, sobretudo quando utilizados de forma inadequada, associam-se a vários efeitos secundários (hipertensão, hiperglicemia, aumento peso, osteoporose, infeções, cataratas, etc).

Dr. Samuel Fernandes

Os medicamentos são de prescrição obrigatória por um médico especialista.
Alguns destes fármacos podem ser obtidos em farmácias comunitárias existindo um despacho próprio que reduz substancialmente o seu custo.
Os biológicos e imunossupressores mais recentes são dispensados apenas em farmácias hospitalares sendo comparticipados na totalidade.

Dr. Samuel Fernandes

Na colite ulcerosa a cirurgia é habitualmente reservada para o tratamento das formas mais graves e complicadas da doença. No caso da Doença de Crohn a cirurgia poderá ser necessária quer para o controlo da doença intestinal, quer para o manejo da doença perianal (fístulas e/ou abcessos perianais)

Dr. Samuel Fernandes

Na colite ulcerosa a cirurgia envolve a remoção de todo o cólon (intestino grosso) e recto. Habitualmente, será tentada a criação de um novo reservatório a partir de um segmento de intestino delgado (bolsa ileoanal) de forma a manter a continuidade entre o intestino delgado e o anús. Em casos muito selecionados, poderá ser removido apenas o cólon ficando o intestino delgado ligado ao recto. Do ponto de vista funcional, ao ser removido o cólon, perde-se o órgão onde se processa grande parte da absorção de água das fezes. Como tal, a diarreia é uma das principais complicações. Estes sintomas poderão ser controlados parcialmente com dieta e medicamentos adequados.
Na Doença de Crohn, a cirurgia envolve a receção de um ou mais segmentos de intestino delgado ou cólon afetados pela doença. As consequências dependerão do local e extensão dos segmentos removidos e poderão incluir diarreia, dor abdominal e défice de absorção de algumas vitaminas. Refira-se que os casos de mal absorção grave após cirurgia são infrequentes.
No caso de envolvimento perianal, poderá ser necessária a drenagem de abcessos e colocação de setons nas fístulas perianais (fio que é passado ao longo do trajeto da fistula para evitar a acumulação de pús).

Dr. Samuel Fernandes

A cirurgia deverá sempre ser considerada quando se verifica a falência do tratamento médico ou caso exista um risco substancial para a saúde do doente. Contudo, em situações em que exista um compromisso estrutural irreversível de algum segmento intestinal, a cirurgia poderá ser colocada como opção antes do tratamento médico.
Nos casos de Doença de Crohn em que se verifica envolvimento perianal, o tratamento médico e cirúrgico são necessários para se obterem os melhores resultados clínicos.

Dr. Samuel Fernandes

No caso da colite ulcerosa, uma vez que é removido todo o cólon e recto, esta situação não se verifica.
No caso da Doença de Crohn, é frequente a recorrência da doença no local da cirurgia (anastomose). Este risco é sobretudo elevado em doentes fumadores.
De modo a evitar o reaparecimento da doença e a necessidade de nova cirurgia, é habitual uma avaliação da anastomose por colonoscopia alguns meses após a operação. Atualmente dispomos de medicamentos eficazes em diminuir a recorrência da doença numa percentagem significativa de doentes.

Dr. Samuel Fernandes

Infelizmente, desconhecemos as razões que levam ao aparecimento destas doenças e por isso não temos como evitar o seu aparecimento.
O conhecimento científico atual sugere que os fatores responsáveis serão múltiplos, incluindo não apenas a nossa genética como a exposição a vários fatores externos (alimentação, infeções, antibióticos, poluição, etc) com um contributo ainda não esclarecido do nosso próprio microbioma (isto é, as bactérias que fazem parte do nosso intestino).

Dr. Samuel Fernandes

Não.

Dr. Samuel Fernandes

A relação entre o stress e as DII é ainda controversa.
O stress poderá levar ao agravamento dos sintomas referidos pelo doente através da redução do limiar para a dor (hipersensibilidade visceral) ou através de alterações na motilidade intestinal, mecanismos semelhantes aos ocorridos noutras patologias gastrointestinais como a gastrite funcional e a síndrome do intestino irritável.
Em contraste, alguns estudos recentes sugerem que o stress, a ansiedade e as perturbações do humor poderão ter um efeito modelador no sistema imunitário, eventualmente podendo influenciar diretamente a atividade da doença.

Dr. Samuel Fernandes

É importante manter um estilo de vida ativo e saudável. A prática regular de exercício físico adaptada às necessidades de cada pessoa tem efeitos benéficos no sistema imunitário e poderá reduzir o risco de recidiva nestas doenças. Por outro lado, o sedentarismo e a obesidade, produzem o efeito contrário, aumentando os níveis de ansiedade, stress, depressão e podendo agravar o risco de recorrência da doença. De facto, a resposta a alguns biológicos poderá ser menor em doentes com excesso de peso e obesidade.

Dr. Samuel Fernandes

As DII não são causadas nem podem ser curadas através de dietas. Como tal, um esquema alimentar específico não deverá substituir o tratamento médico.
Encontram a decorrer vários estudos clínicos que visam estudar o papel de dietas específicas no tratamento da Doença de Crohn e colite ulcerosa. Até que estejam disponíveis estes resultados, sugere-se que seja mantida uma dieta saudável, variada e balanceada, sem restrições alimentares (salvo se justificável por outros motivos clínicos). Realça-se que dietas restritivas poderão resultar em défices nutricionais significativos com efeitos negativos para a saúde do doente.

Dr. Samuel Fernandes

Nas DII, particularmente na doença de Crohn, é frequente o défice de alguns micronutrientes tais como o ferro, a vitamina D, a vitamina B12, o cálcio, o zinco e o ácido fólico. Estes défices podem estar associados à menor ingestão de alimentos pela falta de apetite, à perda e à má absorção pelo intestino causadas pela diarreia, ou a efeitos secundários de alguns medicamentos.
O seu médico, através de análises sanguíneas, fará uma vigilância regular dos níveis destas vitaminas e minerais e, em caso de deficiência, irá recomendar a suplementação mais adequada. Antes de iniciar qualquer suplemento deverá falar com o seu médico.

Drª. Maria João Moreira

Nas mulheres com DII controlada, sem sinais de atividade, a probabilidade de interferência com a fertilidade é muito baixa. Nos casos das mulheres com doença ativa, especialmente na doença de Crohn, pode existir uma ligeira diminuição da capacidade de engravidar. Nas doentes com Colite Ulcerosa grave em que foi necessária cirurgia para a remoção do intestino grosso a fertilidade pode estar comprometida. A maioria das medicações utilizadas nas DII não afetam a fertilidade, com a exceção da sulfasalazina, que diminui a fertilidade nos homens, mas cujo efeito é habitualmente revertido com a sua suspensão. O metotrexato também pode diminuir a fertilidade masculina e não deve ser tomado por doentes de ambos os sexos no período da pré-conceção e pelas mulheres durante a gravidez, pois aumenta o risco de malformações fetais.

Drª. Maria João Moreira

O fator mais impactante da DII na gravidez é a presença de atividade inflamatória, isto é, se existem sintomas ou alterações dos exames, nomeadamente das análises que indiciam inflamação. Nestes casos, existe um maior risco de partos pré-termo (prematuros), baixo peso do recém-nascido e, mais raramente, de abortamento espontâneo. Os riscos de complicações nas mulheres com a DII controlada são sobreponíveis às das mulheres saudáveis. Assim, idealmente, a gravidez deve ser planeada, após aconselhamento médico no que se refere ao timing mais adequado. A maior parte das medicações utilizadas para o tratamento da DII podem ser mantidas durante a gravidez, sendo o mais importante que a doença se mantenha controlada.

Drª. Maria João Moreira

Se a DII estiver inativa ou com atividade ligeira quando a doente engravida é menos provável que exista um agravamento/agudização ao longo da gravidez. Pelo contrário, se a doença estiver com sinais de atividade severa o mais provável é que a doença se mantenha ativa durante a gravidez.

Drª. Maria João Moreira

A amamentação é possível e desejável com a maioria das medicações utilizadas para o tratamento da DII, pois ou não passam ou passam em quantidades mínimas para o leite materno.  Contudo, existem tratamentos, sobretudo alguns mais recentes, em que se desaconselha a amamentação, devido à falta de estudos que comprovem a sua segurança neste contexto. Estas questões devem ser discutidas e planificadas com o seu médico.

Drª. Maria João Moreira

Mais uma vez, depende do tipo de medicação: apenas os tratamentos biológicos como o infliximab e o adalimumab podem condicionar riscos.  Os filhos de mulheres expostas a estes tratamentos no terceiro trimestre de gravidez não devem fazer vacinas vivas durante os primeiros 6 meses de vida. Em Portugal, as únicas vacinas vivas incluídas no Plano Nacional de Vacinação a serem administrada antes dos 6 meses de vida e apenas em grupos de risco são a vacina contra o Rotavírus e a BCG (tuberculose). Deve informar o Médico de Família ou Pediatra se fez tratamento biológico durante a gravidez.

Drª. Maria João Moreira

Sim, a grande maioria dos doentes com DII tem uma vida normal, quer a nível laboral ou académico, quer a nível social e familiar. Podem existir constrangimentos pontuais relacionados com a necessidade de consultas, a realização de exames médicos e de tratamentos hospitalares que façam diminuir o tempo disponível para outras atividades. Em alguns doentes com formas de doença mais grave pode ser necessário internamento hospitalar para intensificar o tratamento ou para uma intervenção cirúrgica o que, durante um período limitado de tempo vai condicionar óbvias limitações à vida normal. Num pequeno subgrupo de doentes, sobretudo naqueles que foram submetidos a intervenções cirúrgicas mais extensas, podem existir limitações que motivem incapacidade permanente. No entanto, com a crescente utilização precoce de determinados medicamentos, nomeadamente os biológicos, a tendência será a de que estes casos mais graves sejam residuais.

Drª. Maria João Moreira

Os efeitos diários da doença variam de acordo com o tipo e gravidade da mesma, assim como com o impacto psicológico que possa ter no doente. Será desejável que o doente mantenha uma relação de confiança e de proximidade com a Equipa que lhe presta cuidados Médicos. Deve esclarecer todas as dúvidas acerca do estilo de vida, de eventuais restrições aconselhadas e sobre a forma de agir na presença de alguns sintomas mais intensos. Deve, em conjunto com o seu médico, encontrar a melhor opção de tratamento para controlo da doença, para debelar os sintomas e impedir o seu agravamento. Em alguns casos pode ser necessário o apoio específico em consulta de Psicologia.

Drª. Maria João Moreira

Existem associações nacionais e internacionais de doentes com DII que disponibilizam informação online útil e fidedigna adequada a crianças e jovens com DII: Pediatric IBD Foundation; Crohn’s and Colitis Foundation of America (CCFA); Associação Portugues de Doença Inflamatória Intestinal (APDI); Doença de Crohn/Colite de Portugal.

Drª. Maria João Moreira

O risco de cancro colo-rectal está aumentado em alguns subtipos de DII: na colite ulcerosa que atinge maiores segmentos do intestino grosso, isto é, que não está limitada ao reto (a parte final do intestino grosso), na Colite Ulcerosa associada a uma doença do fígado e vias biliares, a Colangite Esclerosante Primária, e na doença de Crohn que envolve uma porção extensa de intestino grosso (mais de metade). O risco também aumenta com o número de anos de evolução de doença, habitualmente de forma mais significativa, a partir dos 10 anos de doença, com a gravidade da inflamação, sobretudo nos casos de difícil de controlo e também quando existe história familiar de cancro colo-retal. No entanto, atualmente devido à existência de tratamentos mais eficazes e de uma vigilância por colonoscopia mais regular, o risco é menor comparativamente a algumas décadas atrás.

Drª. Maria João Moreira

As fístulas são uma complicação comum da doença de Crohn. São pequenos “túneis” atípicos que se formam nas paredes do intestino, nas zonas mais inflamadas com úlceras profundas, e que se unem a outras partes do intestino ou a outros órgãos como a bexiga ou mesmo à pele. As fistulas anais (à volta do ânus) são as mais comuns. Podem manifestar-se com dor e inchaço à volta do ânus e com a saída pús. O tratamento de grande parte das fístulas requer uma combinação de tratamento médico (antibióticos e biológicos) e tratamento cirúrgico.

Drª. Maria João Moreira

As estenoses são mais frequentes na doença de Crohn do que na Colite Ulcerosa. Correspondem a um aperto do intestino delgado ou do intestino grosso, que faz com exista uma dificuldade na passagem dos alimentos ou fezes e que pode levar a sintomas de dor e inchaço acentuado na barriga, a ruídos muito acentuados e por vezes a vómitos. Formam-se nas zonas do intestino onde existe ou existiu mais inflamação. Podem ser tratadas com medicamentos que controlam a inflamação como os corticóides e os biológicos, podem ser dilatadas através de colonoscopia e finalmente podem motivar uma intervenção cirúrgica para remover o segmento de intestino apertado.

Drª. Maria João Moreira

Sim, a DII pode causar subnutrição. Ocorre mais frequentemente nas formas mais graves de DII que motivam internamento hospitalar. Também é mais comum na doença de Crohn por poder atingir o intestino delgado onde se dá a absorção dos nutrientes. Para além da má absorção, a perda de apetite associada à doença grave e as diarreias intensas contribuem parra a desnutrição dos pacientes.
A falta de alguns nutrientes, igualmente mais comuns da doença de Cronh, são frequentes, mesmo na doença moderada, e nestes casos relacionada com vários fatores, como a má absorção e a perda pelas fezes. Os défices mais comuns já referidos são de ferro, ácido fólico, vitamina B12, vitamina D, zinco e cálcio.

Drª. Maria João Moreira