A economia portuguesa evoluiu aos solavancos nas últimas três décadas, registando “altos e baixos constantes”. “Todas as décadas tiveram a sua crise”, disse o economista e professor catedrático do ISEG, João Duque, durante a conferência anual da revista Exame, que hoje decorre em Lisboa.
Em jeito de “passeio” pelos últimos 30 anos da economia portuguesa, tantos quanto os que a revista Exame tem de existência, João Duque segmentou aquele período em três momentos: 1989-1998, 1999-2008 e 2009-2018. De acordo com a sua classificação, a primeira década foi a da “convergência”, a segunda foi a da crença de que “bastava estar dentro do euro para tudo correr bem”, e a terceira foi a da perceção de que “a coisa não é assim”. Por isso, “não vale a pena encostarmo-nos ao euro para garantir o futuro”, sintetizou.
Passando em revista os acontecimentos, o economista recordou que, nos anos 90, o PIB contraiu cerca de 1% em 1993, em consequência de uma crise “importada” que agravou o défice orçamental. Cerca de dez anos depois, entre 2002 e 2003, gerou-se “uma crise interna, agravada com uma redução do crédito às empresas não financeiras”, igualmente com efeitos sobre o défice. E, em 2009, veio a crise financeira, acompanhada de uma forte contração do consumo público e do investimento, que levou ao aumento do desemprego e das taxas de juro de longo prazo. “Nunca estamos suficientemente robustos para aguentar as crises”, concluiu.
Analisando a evolução de algumas variáveis macroeconómicas, João Duque destacou a “queda constante” do ritmo de crescimento do PIB nestes 30 anos, mas também as mudanças na sua composição. Embora o peso do consumo privado se tenha mantido estável, em torno dos 60%, o consumo público perdeu terreno com a chegada da crise, regressando aos níveis anteriores, de cerca de 7%, assim como o investimento, que registou um forte recuo para cerca de metade do valor. A nota positiva foi para a forte aceleração das exportações, que subiram de cerca de 29% do PIB em 1989 para mais de 43% do produto, no espaço de apenas cinco anos. “Preservámos o consumo mas diminuímos o investimento, apesar das exportações em alta”, sintetizou.
De seguida, João Duque realçou a queda “preocupante” da taxa de poupança, para os atuais valores de 4,5% do rendimento, a saída de capitais para o exterior através dos juros, dos lucros das empresas e agora das rendas do imobiliário, assim como a acumulação de défices comerciais e a acumulação de dívida pública, que ainda nos dará dores de cabeça quando os juros voltarem a subir.
E, passados 30 anos, que Portugal temos hoje?
Segundo o economista, temos “um País acomodado, com crescimentos baixos, endividado, envelhecido, sem acesso a matérias primas e sem energia barata”. E a necessitar de ”choques” para criar mais riqueza e, de futuro , poder garantir mais do que a “distribuição de raspas”. O que parece ser uma tarefa difícil, já que “não temos capital. Vendemos tudo e não temos capital nacional”. Qual é então a solução? “Aumentar a dependência das exportações”, para termos riqueza para distribuir, já que “o euro vai obrigar-nos a importar os choques”.
O docente do ISEG alertou ainda para as projeções demográficas que indicam que, se nada for feito – isto é, se não acolhermos mais imigrantes -, haverá menos 300 mil pessoas a trabalhar em 2060. Num cenário extremo, sem imigração, o número subirá para menos de 800 mil pessoas a trabalhar, o que conduzirá a uma pressão enorme sobre as contas da Segurança Social. “A atitude com a imigração tem que mudar. Não é só atrair turistas e residentes estrangeiros”, aconselhou.
Além da demografia, referiu ainda as mudanças causadas pela evolução da tecnologia, ao nível da economia da partilha e da sustentabilidade, assim como as novas “crenças” – descarbonizar, descentralizar, digitalizar – que vão ditar a evolução da economia nos próximos 30 anos.