Agora que se inicia mais um período de campanha eleitoral, no meu mundo encantado apeteceu-me inventar um novo partido político. A brincadeira sugeriu num almoço de amigos, por causa de um palhaço que estava sentado noutra mesa do mesmo estabelecimento de restauração. Não envergava uma cabeleira cor de laranja aos caracóis nem tinha pendurada ao pescoço uma gravata gigante, mas o seu comportamento não o livrara do rótulo, já que palhaço é daquelas palavras que ganharam asas semânticas, com o peso de um adjetivo. E é aí que as coisas se complicam.
Um palhaço é, por definição, um ator cómico cuja intenção é divertir o público, principalmente no circo. Também é uma pessoa que diz ou faz disparates ou coisas engraçadas, ou que não costuma ser levado a sério. E porquê? Porque, no sentido pejorativo, um palhaço é uma pessoa que muda constantemente de opinião e que não merece consideração. Para os mais curiosos, também é interessante saber que palhaço pode ser um isco, com a forma de um peixe ou crustáceo, preso ao anzol para na pesca dos peixes predadores.
Como não é a primeira vez que escrevo sobre o tema, faço aqui a minha salvaguarda sincera e genuína para as pessoas que honram o mundo com tal profissão, malta do Chapitô e afins, porque não é a esses que me refiro, muito menos à maravilhosa e adorável equipa que trabalha na Operação Nariz Vermelho e que tem, ao longo de quase duas décadas, levado alegria e momentos de magia aos hospitais e de Portugal. Os palhaços que incomodam as mulheres são certos tipos que nem sequer têm os pés grandes nem se apresentam de nariz postiço, mas que se portam como verdadeiros palermas com o sexo oposto.
A saber: tipos que não respeitam, que fazem piadas machistas, que têm comportamentos, misóginos, que são arrogantes e mal educados, que acreditam que somos o sexo fraco, que não respondem às mensagens, que deixam as mulheres penduradas, que se metem com a amiga da namorada ou com a meia irmã da mulher, que desaparecem sem aviso, que acham que podem pisar o risco e esticar a corda porque existe sempre uma otária que os vai perdoar. Foi para esses que imaginei um partido político, a Frente Nacional Anti Palhaço.
O primeiro nome que me surgiu foi Frente Feminina Anti Palhaço, mas logo desisti, porque ser feminista e ser sexista não são nem nunca podem ser a mesma coisa. Seria injusto e nada democrático delimitar a adesão a um partido por questões de género e, além disso, o mundo também está cheio de homens que respeitam as mulheres e que são muito mais feministas do que muitas mulheres, inshalá, inshalá.
No meu mundo encantado, o FNAP seria um partido político de forte cariz social, situado naquela terra de ninguém que se tornou a social-democracia em Portugal, já que o PS continua a fazer malabarismos cada vez mais à direita, o PSD anda fraquinho e o CDS lá vai fazendo o caminho das pedras o melhor que sabe. Recentemente, o surgimento da Frente Liberal, uma espécie de versão otimizada do PSD com particular incidência de betos, acrescentou ao teatro político um certo glamour, embora não conste que se ganhem eleições com fatos de corte italiano, gravatas Hermès e sapatos feitos à medida em Londres. Nada contra esta injeção de sangue renovado na vida política do nosso jardim à beira-mar plantado, Portugal precisa de se renovar em quase tudo para se fazer um País mais forte, já que a recessão mundial paira pelo mundo e não nos safamos de levar outra vez um grande embate, mas continuo a acreditar que a formação do caráter começa em casa, na família, que é a base de toda e qualquer estrutura social.
Há dias assisti a uma entrevista brilhante da Joni Mitchel na CBS News dada em sua casa ao músico, escritor e radialista Jian Ghomeshi e apanhei uma frase iconográfica que definia a sociedade americana do tempo dos baby-boomers: se as donas de casa não estão na cozinha a cantar, uma nação inteira está doente. Ela discorre de forma iluminada sobre o envenenado reino dos subúrbios, onde os homens dão pouca atenção às mulheres. Quem já assistiu à série Mad Men sabe a que me refiro, quem não assistiu, ainda vai a tempo.
No meu mundo encantado, o FNAP – Frente Nacional Anti-Palhaço – teria um efeito pedagógico aplicado à mais variada e extensa lista de comportamentos dos homens em relação ao eterno feminino que revelem discriminação, condescendência, falta de respeito e de educação, prepotência, preguiça doméstica, descortesias, ausência de cumprimento de pagamento de colégios, pensões de alimentos e afins, todo esse vasto universo que engloba atitudes sexistas, machistas e misóginas. A minha imaginação incontrolável de escritora já está a imaginar slogans como Vota Fnap, também tu podes ser livre, Vota Fnap e liberta-te das amarras que te prendem há anos, FNAP For Ever.
Rapaziada, não me levem a mal, mas quem não quer ser lobo, não lhe vista a pele. Sabemos que nem todos tiveram mães e pais que vos ensinaram a respeitar as mulheres, mas não contem com o nosso bom coração para vos acertar o passo. Ou se comportam como uns senhores, ou se portam como uns palhaços, e neste caso, não há virtude no centro.
Pick one side and stay there. As mulheres do mundo agradecem.