Foi com alegria e orgulho genuinamente lusos que li na imprensa o grande sucesso do Pastel de Nata. Longe vão os tempos em que o doce português adoçava apenas o palato dos nativos do nosso jardim à beira-mar plantado. Com a chegada massiva dos turistas desde 2014, a bela iguaria ganhou centenas de milhares de adeptos e a sua popularidade disparou. Ao contrário do famoso Pastel de Belém e da clássica Queijada de Sintra que só se vendem no bairro de origem e nos arredores da citada vila, o Pastel de Nata pode encontrar-se em todas as pastelarias do país e cai sempre bem para acompanhar a imprescindível bica. Eu que o diga, que com a idade fiquei mais doceira, fenómeno que julgava impossível de ocorrer, apesar de ser descendente de uma avó literalmente louca por bolos, com quem dizem na família ser bastante parecida, pois também era loira, também gostava de trapos e também tinha um fraquinho por homens bonitos, embora fosse casada com um senhor de baixa estatura, a quem um dia se referiu de forma carinhosa e distraída como uma tampa de açucareiro.
Voltemos à temática do Pastel de Nata, para uma analogia que me passou pela cabeça de escritora irrequieta. À partida não tenho nada contra os Pastéis de Nata e agrada-me que se vendam já em vários pontos do nosso planeta azul. São muito populares no Japão – onde nunca os provei – e maravilhosos no Rio de Janeiro – onde como sempre que lá vou – no Talho Capixaba, a pastelaria mais fina do Leblon. O proprietário, o Senhor António, emigrante português, mandou vir um forno especial para a cozedura dos ditos. O resultado é brilhante: quer em tamanho standart, quer em miniatura, são de lamber os dedos e chorar por mais.
O problema reside na mentalidade de pastel de nata que os homens portugueses têm vindo a revelar nos últimos anos. Passo a explicar: um Homem Pastel de Nata é um homem para que é sempre tudo muito denso e opaco, como a massa do supracitado. É um homem indeciso por natureza e medroso por defeito. Ou seja, na dúvida, ele não avança, ou com medo de levar uma tampa e de não aguentar o embate, ou com medo que tudo corra tão bem, que também corre o risco de não aguentar o embate.
O Homem Pastel de Nata hesita sempre em tudo. Primeiro, em decidir se vai ou não comer um Pastel de Nata, dividido entre o desejo de satisfazer a gula e o complexo de culpa. Se finalmente optar por cometer tal loucura, ele não sabe se quer mais ou menos queimado, com açúcar, com canela, só com açúcar ou só com canela, ou sem nada. E ainda pode hesitar entre aquecido ou à temperatura ambiente. Ou seja, aquilo que à partida parece um ato de grande simplicidade, transforma-se num imbróglio de escolhas que de o deixa confuso, assustado e perplexo perante o ato.
Os pastéis de nata estão para as mulheres portuguesas como os homens estão para as relações amorosas: há sempre imensas dúvidas, muito medos e alguma preguiça. Eu acho-lhe piada mas ela não pode gostar de um tipo como eu, ou estou maluco com ela, mas acho que me vai trazer problemas, ela é tão perfeita que não pode ser verdade, ou ainda, ela já me deu todos os sinais para eu avançar, mas há ali qualquer coisa que me faz hesitar. Caro amigo, o que o faz hesitar não está fora de si, está dentro da sua cabeça cheia de massa de pastel de nata que o impede de avançar com segurança e leveza.
Os homens têm medo das mulheres. Sempre tiveram e sempre terão. E isso não é necessariamente mau. Desde pequenos que os habituamos a sentir segurança através de ordens maternais. Vai lavar as mãos, come a sopa até ao fim, atira a roupa suja para o cesto, ajuda a tua irmã com a mochila, põe a loiça na máquina, não te esqueças de lavar os dentes antes de dormir, já fizeste os trabalhos de matemática, não chegues tarde, manda mensagem se não vieres domir a casa, etc, etc. Os rapazes crescem a ouvir recomendações, críticas, sugestões, raspanetes, mensagens castigadoras ou motivadoras. É o cão de Pavlov. E tal prática acaba por condicionar a mente masculina.
Para piorar ainda mais o panorama, em Portugal, à semelhança de outros países latinos, o menino sai quase sempre debaixo da asa da mãezinha para a asa da mulherzinha. Isto faz com que espere desta o mesmo modelo de comportamento. E as mulheres que perpetuam o papel de mãezinhas são as principais culpadas pelo não-crescimento destes eternos meninos da mamã, que uma vez lançados ao mundo, começam a esbracejar no pastel de nata assim que são obrigados a tomar decisões.
Disse-me um dia um candidato a namorado que, depois de três meses de charme consistente, desistiu do objetivo desaparecendo sem rasto: os homens são muito sonhadores e muito medrosos, pensam que querem tudo, mas depois não querem nada. Porquê, perguntei. Porque entre desistir antes ou falhar depois, um tipo prefere não arriscar.
Tanto dilema e tanto drama, quando afinal tudo se resume a olhar, dar uma trinca, saborear e repetir, caso seja tão bom que valha a pena. Sem medos nem constrangimentos, sem culpa nem pesos. Rapaziada, saiam do lodo e façam-se à pista, porque a fila anda e alguém acabará por deitar a mão à mulher que tanto desejam. Se for um tipo da Mossad, podem ter a certeza que a última coisa que lhe vai passar pela cabeça é ter medo de algo que pode ser o melhor do mundo.