Diz o mito que, após várias jogadas de bastidores entre os deuses, porque também as tinham, Prometeu decidiu roubar o fogo do Olimpo, entregando-o aos Homens que aprenderam a dominá-lo, conseguindo com isso uma vantagem sobre os animais. Talvez por acreditar em mitos e consumir em demasia filmes de muito duvidosa credibilidade científica, nos quais os Homens vencem a adversidade do clima, a procuradora Ana Simões avançou, em 2018, com uma acusação contra mais de uma dezena de pessoas, imputando-lhes a morte, ainda que por negligência, de 66 pessoas nos incêndios de Pedrógão Grande, em 2017.
Só que os mitos não passam disso mesmo, mitos ou lendas, como preferirem. E tal como Prometeu não nos entregou nada, também o homem não consegue dominar o fogo quando este toma proporções inéditas a reboque de fenómenos climatéricos únicos, como o “downburst” que se verificou em Pedrógão. À cabeça da acusação, convém recordar, estava o comandante dos bombeiros, António Arnaut. Acusar alguém, cuja missão é salvar vidas, da morte de 66 pessoas requeria prova forte, sustentada, mas o que a procuradora colocou em cima da mesa foram meros “acho que”, fechando os olhos (talvez por alguma razão mitológica) à negligência verificada nas estruturuas de comando nacionais, tal como, finalmente, o Tribunal de Leira apontou.